Uma reportagem investigativa denunciou centenas de casos de abusos sexuais que teriam sido cometidos por pastores ligados à Convenção Batista do Sul, uma das principais denominações evangélicas dos Estados Unidos, com milhares de igrejas filiadas. Agora, a liderança da entidade veio a público repudiar o comportamento dos acusados.
Os jornais Houston Chronicle e San Antonio Express News noticiaram que aproximadamente 400 líderes evangélicos, incluindo pastores, estariam envolvidos em casos de abusos sexuais. Ao todo, seriam 700 vítimas ao longo de 20 anos.
Em geral, os envolvidos seriam pastores principais, pastores de jovens, professores da Escola Dominical, diáconos e voluntários das igrejas filiadas à Convenção Batista do Sul. Os casos relatados pelo Houston Chronicle foram aproximadamente 380 desde 1998, sendo que 250 destes ocorreram a partir de 2008.
A matéria fez uma coletânea de casos de pastores e/ou líderes “que foram condenados, acusados com credibilidade e processados com sucesso, e aqueles que confessaram ou renunciaram” ao longo dos anos, a partir de registros de tribunais civis e criminais.
Essa é uma diferença em relação aos escândalos envolvendo padres da Igreja Católica, já que foram tratados individualmente em cada comunidade, e não contaram com nenhuma iniciativa corporativista para abafá-los.
Um dos casos relatados aponta o triste desfecho de uma das vítimas, que foi abusada em 1994 e, 14 anos depois, morreu de overdose. A mãe culpa o abusador pelo trauma que teria levado sua filha à dependência química.
O presidente da Convenção Batista do Sul, pastor J. D. Greear, usou o Twitter para lamentar o ocorrido, afirmando estar “quebrado” com o que foi revelado: “Os abusos descritos neste artigo do Houston Chronicle são pura maldade [contra as vítimas]”, declarou o líder evangélico.
“Eu me uno a inúmeros outros que estão atualmente ‘chorando com os que choram’”, acrescentou o pastor, garantindo uma mobilização da Convenção para “deter predadores em nosso meio”.
“As vozes nesta reportagem devem ser ouvidas como um aviso enviado por Deus, chamando a Igreja a se arrepender. Como cristãos, somos chamados a expor tudo que é pecaminoso à luz. Os sobreviventes neste artigo fizeram isso – a um custo pessoal que poucos de nós podem imaginar”, ponderou Greear.
Por fim, o líder da Convenção Batista do Sul destacou que “não há ambiguidade sobre a responsabilidade da igreja em proteger os maltratados e ser um lugar seguro para os vulneráveis”, pois o foco na “segurança das vítimas é mais importante do que a reputação dos Batistas do Sul”.
Luz sobre o crime
August Boto, presidente interino do Comitê Executivo da Convenção, concedeu uma entrevista ao jornal Chronicle Houston e frisou que o veículo “não é o adversário da Convenção Batista do Sul”, uma vez que não há intenção de encobrir os casos. “Vocês estão nos ajudando [a fazer] brilhar a luz do dia sobre o crime”.
Outro a se manifestar foi o pastor Russell Moore, presidente da Comissão de Ética e Liberdade Religiosa da entidade. Ele pontuou que é hora de trazer luz aos escândalos: “Nenhuma igreja deve se frustrar com as reportagens do Houston Chronicle, mas agradecer a Deus por isso. O Tribunal de Cristo será muito menos reticente do que uma série de jornais para descobrir o que nunca deveria ter sido escondido”.
Moore lembrou ainda que desde 2018 o pastor Greear havia iniciado um Estudo Presidencial sobre Abuso Sexual para investigar todas as opções e rever o que outras denominações e grupos fizeram para acompanhar os abusos. Simultaneamente, a entidade vinha ouvindo
policiais, especialistas em psicologia e psiquiatria, vítimas e muitos outros.
Greear se aprofundou no assunto no Twitter e chamou atenção para o fato de que “como denominação, agora é um tempo para lamentar e se arrepender”, enquanto as medidas para corrigir tais erros tomam corpo: “Mudanças estão chegando. Elas devem [acontecer]. Não podemos apenas prometer ‘fazer melhor’ e esperar que seja o suficiente. Mas hoje, a mudança começa com o peso total do problema… É hora de uma mudança generalizada, Deus exige isso e os sobreviventes o merecem”.
“Nós – líderes da Convenção Batista do Sul – deveríamos ter escutado as advertências daqueles que tentaram chamar a atenção para isso. Estou comprometido em fazer todo o possível para garantir que nunca mais cometamos esses erros […] Temos de admitir que nossas falhas, como igreja, colocam esses sobreviventes em uma posição onde eles foram forçados a ficar sozinhos e falar, quando deveríamos estar lutando por eles. Sua coragem é exemplar e profética. Mas eu lamento que a coragem deles tenha sido necessária”, disse o pastor. Por fim, o presidente da entidade salientou que “a doutrina Batista de autonomia da igreja nunca deveria ser uma cobertura religiosa para a passividade em relação ao abuso. A autonomia da igreja é sobre libertar a igreja para fazer a coisa certa – obedecer a Cristo – em todas as situações. É um hediondo erro aplicar autonomia de uma forma que permita o abuso”.