A socióloga e cientista política Jacqueline Pitanguy, feminista militante, declarou que a ascensão do conservadorismo é uma ameaça às ambições políticas de seu movimento. Em entrevista recente, classificou o momento como um “retrocesso” e disse não aceitar uma visão a partir da Bíblia Sagrada.
O discurso, característico dos movimentos de esquerda, sugere que o Brasil não vive uma democracia plena por conta da maior presença masculina entre os parlamentares eleitos: “Igualdade de gênero é fundamental. A ausência da mulher na política é uma forma de violência por termos menos parlamentares mulheres e consequentemente menos posições decisórias no Executivo e no Judiciário”, teorizou.
À revista Marie Claire, Pitanguy declarou que vê as políticas públicas do governo Bolsonaro em relação às mulheres com pessimismo: “Temos um congresso extremamente conservador. É muito preocupante a atual política brasileira colocar a religião como um fator a ser seguido. Vivemos num país laico, mas parece que as pessoas religiosas que colocam livros sagrados acima da nossa constituição se esquecem disso”, criticou.
“No momento em que grupos religiosos usam da religião como fator político, o Estado laico vai minando. Isso é muito perigoso”, acrescentou a socióloga feminista, antes de atacar a ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos Damares Alves: “O que me chama atenção é que a ocupante do cargo traz uma série de valores e crenças religiosas que não deveriam estar presentes no exercício de sua função”.
“A ministra já disse publicamente que a mulher deve obedecer o homem no casamento, sendo que umas de nossas principais vitórias foi estabelecer a igualdade de direitos e responsabilidades no matrimônio. Além de inconstitucional, isso é extremamente preocupante porque está comprovado uma estreita ligação entre subalternidade da mulher com a violência doméstica. É triste”, afirmou Jacqueline, repetindo a distorção feita pela mídia das palavras de Damares Alves e o próprio conceito pregado pela Bíblia.
O tom, agressivo, vai além: a líder feminista repudiou a postura de Damares Alves por ser contrária ao aborto: “No momento que você institui uma crença religiosa dando parâmetros de políticas públicas é bem complicado. Vai contra todo o princípio básico da democracia que é pluralismo”.
“Eu vejo com muita preocupação que uma dirigente de um órgão de direito da mulher se baseie em suas crenças religiosas. Isso poderá causar um possível retrocesso em leis seculares. Se uma mulher não quer fazer o aborto em nenhuma circunstância, ela tem todo o direito, se quer se submeter ao marido, é uma escolha dela. Mas não temos que criar estereótipos”, declarou Pitanguy.
Por fim, a socióloga expressa seu desprezo sobre as crenças e valores de um segmento da sociedade que, enquanto não se tornou numericamente relevante e organizado socialmente, era ignorado pelos grupos que formam a “elite intelectual” do país: “Tivemos um avanço tão importante que não podemos deixar nossa luta ir embora em nome da Bíblia, do evangélico, do Alcorão e de qualquer religião. Lutamos para que todas as mulheres possam seguir seu caminho e fazer o que quiserem”, encerrou.