Um casal cristão no Paquistão foi absolvido da sentença de pena de morte por blasfêmia contra o islamismo, após oito anos de prisão. Eles haviam sido presos em 2013 e condenados à pena capital em 2014.
Shaguftah Kausar é a mulher paquistanesa e mãe de quatro filhos que substituiu a cristã Asia Bibi em sua cela no corredor da morte. Depois de uma dúzia de atrasos desde abril de 2020 devido à pandemia, ela foi absolvida da pena de morte pelo Tribunal Superior de Lahore, junto com seu marido, Shafqat Emmanuel Masih.
Eles foram presos por blasfêmia, que é crime no país. Supostamente, o casal católico, teria enviado mensagens de texto contra clérigos islâmicos, apesar de serem analfabetos.
Os dois apelaram da pena de morte em 2016, mas o recurso foi continuamente adiado, o que na prática resultou numa longa prisão.
Sanções
Quando o então enviado especial da União Europeia para a Liberdade de Religião ou Crença, Jan Figel, visitou o Paquistão para discutir o caso de Asia Bibi em dezembro de 2017, ele disse às autoridades que a renovação de seus privilégios de exportação para a Europa dependia da libertação de Asia Bibi.
Somente após sua absolvição em outubro de 2018 (e liberdade final na primavera de 2019), que seu advogado Saif-ul Malook – sob o brilho da atenção da mídia internacional – disse que seu próximo caso seria o de Shaguftah. Esta foi a primeira vez que muitas pessoas ouviram falar do caso.
Após a visita de Figel, um conselho consultivo inter-religioso foi iniciado para examinar o uso indevido da lei da blasfêmia – frequentemente usada para ‘agarrar’ terras em disputa ou para resolver rancores pessoais, rivalidades comerciais e assim por diante.
Em abril de 2021, o Parlamento Europeu adotou uma proposta de resolução conjunta solicitando uma revisão do status comercial concedido ao Paquistão e buscando abordagens mais abrangentes para lidar com esses abusos da lei. A moção se referia especificamente ao caso deste casal.
Esta aparente ‘plantação’ de textos ou imagens falsas em telefones celulares de cristãos paquistaneses, muitas vezes analfabetos, foi relatada pelo World Watch Monitor nos últimos anos.
A acusação
Muhammad Hussein, o homem que acusou a mulher cristã, disse que estava orando depois de quebrar o jejum do Ramadã em 18 de julho de 2013, na mesquita Talabwali, Gojra, por volta das 22h00, quando seu telefone vibrou.
Ele afirmou que depois de terminar a oração, checou seu telefone e encontrou mensagens de texto blasfemas insultando tanto o profeta Maomé quanto o Corão.
O oficial da delegacia de polícia da cidade de Gojra, Muhammad Nisar, disse ao World Watch Monitor em 2013 que os dados das ligações de Hussein revelaram que as mensagens foram enviadas do número de telefone de Shaguftah.
No entanto, ela disse à polícia que o telefone estava perdido há um mês e ela não sabia quem poderia ter enviado as supostas mensagens. Mesmo assim, a Polícia Municipal de Gojra deteve o casal, junto com seus quatro filhos, e os pressionou a nomear alguém que poderia ter enviado as mensagens.
Nisar disse ao World Watch Monitor que um grande número de clérigos islâmicos ficou zangado ao ouvir essas mensagens de texto e que permaneceram na delegacia até que o Primeiro Relatório de Investigação (FIR) fosse apresentado. No que alguns disseram ser uma tentativa de mostrar que houve progresso, a polícia prendeu formalmente o casal em 20 de julho e os enviou para a Cadeia Distrital de Toba Tek Singh no dia seguinte.
“Shafqat admitiu à polícia que enviou as mensagens blasfemas e deu esta declaração ao magistrado judicial”, argumentou Nisar, conforme informações do Eternity News.
O advogado do casal na época, Riaz Anjum, disse que a polícia abriu o caso de acordo com as Seções 295-B e 295-C do Código Penal do Paquistão, que recomendam prisão perpétua e pena de morte, respectivamente, por blasfêmia.
Anjum disse que a polícia apressou o caso contra o casal ao registrar a confissão judicial de Shafqat Masih: “A investigação deveria ter sido feita pelo superintendente sênior antes de apresentar o caso, mas aqui a polícia extraiu uma confissão de Shafqat que é ilegal”, disse ele.
Drama familiar
A coluna vertebral de Shafqat Masih foi fraturada em um acidente em 2004. Desde então, ele ficou restrito a uma cadeira de rodas devido à paralisia da parte inferior do corpo, além de precisar usar um cateter. Na prisão, ele foi confinado à cama e quem o visitava relatava que ele estava ‘coberto de escaras’ e pensaram que ele morreria na prisão.
Após o acidente, sua esposa, Shaguftah Kausar se tornou a provedora da família, formada por quatro filhos: Ambrose (então com 13), Danish (10), Sarah (7) e Amir (5). Quando foi presa, terminou sofrendo de depressão.
Antes de Shafqat e Shaguftah, outros casos foram registrados contra cristãos no Paquistão, com base em mensagens de texto blasfemas.
Poucos dias antes de serem presos em julho de 2013, um tribunal havia condenado um homem cristão, Sajjad Masih (esse sobrenome é bastante comum entre cristãos do país e deriva de Messias) – da mesma cidade –, 25 anos de prisão, por enviar mensagens de texto blasfemas em um caso apresentado pela primeira vez em dezembro de 2011, apesar da ausência de provas novamente.