A 3ª Câmara Cível do TJ-GO (Tribunal de Justiça de Goiás) garantiu a três membros da Igreja Adventista do Sétimo Dia o direito de não freqüentar as aulas dos seus cursos superiores às sextas-feiras à noite e aos sábados pela manhã.
A decisão, de acordo com informações do tribunal, se baseou na liberdade de crença religiosa e no acesso à educação, direitos norteadores do princípio da dignidade da pessoa humana, previstos na Constituição Federal. O relator, desembargador Felipe Batista Cordeiro, deixou claro, em seu voto, que a universidade deve aplicar atividades alternativas complementares para suprir a ausência dos alunos nesses dias.
Segundo informa o Tribunal de Justiça, Mirian das Graças da Silva, Adriene Trindade Alves e Daniel Santos são alunos dos cursos de Letras e Pedagogia da UEG (Universidade Estadual de Goiás) – Unidade de Pires do Rio – e vieram à Justiça após tentar um acordo frustrado com a instituição para que fossem disponibilizadas alternativas com relação as aulas ministradas nos referidos dias, inclusive com a possibilidade de cursar as disciplinas paralelamente.
No entanto, o juízo singular também negou o mandado de segurança impetrado pelos estudantes ao argumento de que os horários e dias das aulas estavam previstos no edital do processo seletivo, além de que a concessão da segurança configuraria tratamento discriminatório, em razão de religião, afrontando o regimento interno da universidade.
No recurso, os apelantes sustentaram que são membros da Igreja Adventista do Sétimo Dia e que, de acordo com os mandamentos bíblicos que seguem, tem de se dedicar exclusivamente às atividades espirituais durante o período que vai do pôr do sol das sextas-feiras ao dos sábados.
Relataram ainda que estão sofrendo prejuízos sérios em relação às disciplinas ministradas nos dias mencionados, uma vez que não podem comparecer às aulas.
Ao argumentar que possuem boas notas e são dedicados, sendo reprovados apenas pelo número de faltas, os estudantes ressaltaram a tentativa de resolver a questão administrativamente, por meios alternativos, para suprir suas faltas nesses períodos, mas não obtiveram êxito. As condutas da universidade de tentar impedi-los de fazer as últimas provas, frequentar as aulas e rejeitar formas paliativas de avaliação, de acordo com eles, fere seus direitos líquidos e certos garantidos constitucionalmente.
No entanto, ao rebater as alegações dos impetrantes, a UEG salientou que eles não tiveram a liberdade de crença religiosa violada e que a instituição sempre tratou todos os alunos igualmente, sem distinção de religião.
Segundo a universidade, o edital do processo seletivo, levado ao conhecimento dos impetrantes quando prestaram vestibular, estabelecia que haveria aula nas sextas-feiras à noite e nos sábados pela manhã. Explicou que adotar uma medida alternativa de substituição das aulas poderia acarretar-lhe grandes prejuízos, inclusive com danos à coletividade, pois não possui condições financeiras para tanto.
Decisão
Ao examinar os autos, o relator fez uma ampla exposição sobre a importância dos direitos fundamentais do ser humano, cujo caráter é universal. Ele lembrou que o princípio da dignidade da pessoa humana é pautado na viabilização de uma vida digna, na liberdade e na igualdade substancial entre os homens. “É na esteira desse caráter cada vez mais protetivo que o dogma de garantia e de amparo aos direitos fundamentais vem evoluindo ao longo dos séculos. Tais direitos possuem magnitude que lhe permitem extravasar e transcender ordens jurídicas, sendo comuns em diversos países, ao menos naqueles regidos pela democracia”, destacou
Para o magistrado, a tendência internacional com relação à liberdade religiosa está diretamente ligada à categoria do direito fundamental, previsto na Constituição Federal brasileira. A seu ver, é na tentativa de se obter maior tolerância religiosa, a fim de se evitar ou ao menos amenizar conflitos de tal natureza, que se nota a clara evolução do pensamento, sobretudo nos Estados Democráticos de Direito, sobre a necessidade de se garantir a liberdade religiosa.
“Configura direito fundamental o fato de que toda pessoa não deve ser obrigada a agir contra a própria consciência e os princípios religiosos que adotou para si”, afirmou.
Na opinião do relator, o direito à liberdade religiosa não pode estar dissociado do exercício dos demais direitos inerentes ao ser humano, como a educação. “Diante dessa situação não fica difícil imaginar que os impetrantes chegarão ao ponto em que terão que optar entre os estudos ou sua crença religiosa, o que é inadmissível numa democracia.
A universidade, de acordo com ele, consagra a idéia da busca pelo conhecimento, de modo a propiciar a evolução de uma sociedade que só será alcançada com ampla discussão sobre as mais diversas matérias buscando sempre a a harmonização, compreensão das diferentes culturas e costumes e rompimentos com preconceitos e discriminações.
Fonte: Última Instância