A decisão do pastor Henrique Vieira de desfilar no carnaval do Rio de Janeiro pela escola de samba da Mangueira não passou despercebida por lideranças evangélicas do estado, que divulgaram um manifesto em repúdio à representação de Jesus na Sapucaí.
As lideranças evangélicas definem essa iniciativa de Viera – notório por sua militância política de esquerda – e da Mangueira como uma tentativa de “captura da fé” em função de sua ideologia. Ao todo, 23 pastores assinam o duro manifesto contra Vieira, que não é tratado pelas lideranças como um sacerdote cristão.
Declarações prévias de Henrique Vieira sobre temas diversos, como a defesa da descriminalização do aborto e a ideia de que “um Jesus negro faz mais sentido” em termos históricos, foram lembradas pelos líderes.
O grupo é formado, dentre outros, por líderes fluminenses como os bispos Abner Ferreira, da AD Madureira, e Daniel Malafaia, da AD em Campo Grande, os pastores Josué Valandro Jr., da Igreja Batista Atitude, e Josué Gonçalves da Silva, da Igreja Batista Céu Abençoado.
“Tornamos público que não reconhecemos o Sr. Henrique Vieira como pastor evangélico, mas tão somente como um militante de esquerda que visa à captação de votos dos evangélicos. […] Repudiamos a tentativa de captura da fé por ideologias e partidos, assim como a tentativa de promover ideias e posicionamentos confusos ao povo evangélico”, diz o documento.
O cenário político que o país atravessa, com a influência crescente do voto evangélico no resultado das eleições, foi mencionado pelo grupo de líderes, já que o documento menciona o interesse confesso dos partidos de esquerda de se aproximarem do segmento para voltarem a vencer eleições presidenciais.
O polêmico Henrique Vieira é filiado ao PSOL, já foi vereador em Niterói e é pastor da Igreja Batista do Caminho, na Gávea, zona sul do Rio de Janeiro. No desfile do carnaval, ele será uma das representações de Jesus que a Mangueira pretende apresentar.
O pastor Franklin Ferreira usou sua página no Facebook para comentar a manifestação dos líderes fluminenses e elogiou a iniciativa: “Ótimo documento assinado por 23 pastores evangélicos, entre eles das Assembleias de Deus e igrejas batistas, apontando o interesse de “partidos políticos de esquerda” em tentar apresentar como pastores pessoas que defendem valores opostos aos defendidos pela fé cristã”.
Confira a nota na íntegra:
É fato notório que partidos políticos de esquerda estão buscando aproximar-se dos evangélicos com fins eleitorais. O contingente da mídia que sempre discriminou os evangélicos parece ter alterado seu mecanismo de atuação após anos desqualificando os pastores. Agora, vemos a tentativa de apresentar ao grande público como “pastores” pessoas que, embora apresentem-se como tal, defendem ideias, valores e comportamentos diametralmente opostos aos que historicamente professamos.
Reiteramos nosso posicionamento em favor da absoluta liberdade religiosa, da liberdade de escolha e da livre manifestação de pensamento. No entanto, repudiamos a tentativa de captura da fé por ideologias e partidos, assim como a tentativa de promover ideias e posicionamentos confusos ao povo evangélico e seus interlocutores no que tange aos pressupostos e implicações da fé cristã.
Nesse sentido, tornamos público que não reconhecemos o Sr. Henrique Vieira como pastor evangélico, mas tão somente como um militante de esquerda que visa à captação de votos dos evangélicos. Por conseguinte, declarar-se “pastor” não é condição suficiente para sê-lo.
Os pastores evangélicos afirmam que:
a) Jesus é o Salvador do mundo, dos homens e mulheres de todos os tempos, lugares e culturas; b) o Deus Trino (Pai e Filho e Espírito Santo) é a fonte e o destinatário da nossa oração;
c) Maria concebeu Jesus por obra do Espírito Santo antes de habitar com José, com quem estava desposada;
d) a unidade do Corpo de Cristo implica a busca da comunhão entre os cristãos e o respeito às outras religiões para a promoção de uma sociedade mais pacífica, justa e fraterna;
e) a vida tem início na concepção, sendo que a prática do aborto se apresenta como assassinato de inocentes;
f) a drogadição, por experiência, destrói vidas e famílias, o que fica evidente pelas inúmeras comunidades terapêuticas destinadas ao tratamento e recuperação de adictos;
g) é legítima a utilização dos meios de comunicação social para o anúncio do Evangelho;
h) o diálogo e a justiça social são princípios bíblicos, fundamentais para o posicionamento social cristão;
i) as igrejas evangélicas acolhem toda sorte de pessoas, propondo vida nova e por essa razão têm crescido em número de fiéis;
j) as igrejas evangélicas realizam extenso trabalho social com pobres, órfãos, toxicômanos, moradores de rua, presidiários e a sociedade em geral, de forma regular e, em ocasiões de catástrofes, de forma especial.
O Sr. Henrique Vieira posiciona-se, em contrapartida, afirmando:
a) possíveis traços raciais de Jesus como mais relevantes que a salvação universal por Ele oferecida a todos;
b) sua participação no desfile carnavalesco da Escola de Samba Mangueira no qual irá cantar “Mangueira, teu samba é uma reza”;
c) Maria como “mãe solteira”;
d) que as igrejas evangélicas criam um ambiente “antidemocrático, hostil e excludente para mulheres, negros, fiéis de religiões de matriz africana e militantes dos direitos humanos”;
e) sua posição favorável à legalização do aborto;
f) sua posição favorável à legalização das drogas;
g) sua posição contrária aos programas televisivos promovidos pelas Igrejas Evangélicas;
h) o diálogo e a justiça social a partir de ideologia político-partidária.
Considerando a manifestação pública do Sr. Henrique Vieira – que se declara pastor evangélico – de que irá desfilar na Escola de Samba Mangueira durante o Carnaval, reafirmamos a primazia da consciência e dos direitos individuais, mas nos posicionamos contrariamente à incoerência evidente entre alguns valores, atitudes e comportamentos explicitados pelo Carnaval e a fé cristã e o pertencimento a uma Igreja ou Comunidade Evangélica.
Reconhecemos que o meio evangélico contempla uma variedade de visões e interpretações acerca das realidades humana, social e religiosa. Contudo, há elementos básicos que identificam nossa cosmovisão e suas implicações existenciais e sociais, sendo que, alguns deles, apresentamos acima.
Reafirmando o direito humano fundamental de escolha e consequente respeito às escolhas individuais, registramos nossa posição acerca das manifestações do Sr. Henrique Vieira, que não possui legitimidade para se posicionar como representante da grande maioria do povo evangélico da cidade do Rio de Janeiro e do Brasil.
Rio de Janeiro, 06 de fevereiro de 2020.
Também assinam os pastores Jonatas Prattis, Clóvis Barbosa Ramos, Wagner dos Santos, André Haroldo, Alex Romano, Wagner José dos Santos Oliveira, Silas Esteves, Paulo Cotta, Marcos Vinícius, Magner Ferreira, Samuel Gonçalves, Rinaldo Dias, José Carlos Lessa, Antônio Paulo Antunes, Orivaldo Aparecido Prattis, David Cabral, Roberto Ribeiro, Davidson Pereira de Freitas e Alberto Stassen.