Coordenado pelo pesquisador Aaron Franzen, novo estudo da Universidade norte-americana Baylor revela que a leitura frequente da Bíblia gera um apoio maior a questões que vão desde a compatibilidade entre ciência e religião até um tratamento mais humano dos criminosos.
O estudo, um dos primeiros a analisar as consequências sociais da leitura das Escrituras, revela que os efeitos desse hábito devocional parecem transcender as fronteiras comumente estabelecidas entre conservadores e liberais. Nessa pesquisa, menos de 25% dos entrevistados disseram ler a Escritura uma vez por semana ou mais.
Mesmo com o aumento da oposição ao casamento homossexual e à legalização do aborto justificados pela leitura constante da Bíblia, as pessoas entrevistadas dizem que é igualmente importante lutar por uma maior justiça social e econômica. Não foram apenas cristãos liberais que afirmaram ter uma mudança de atitude.
Em muitos casos, pessoas que acreditam que a Bíblia é literalmente verdadeira, mas raramente a leem, discordam da visão dos evangélicos que afirmam ler o texto sagrado todos os dias.
Para Franzen, seu estudo mostra que “os literalistas tendem a ler a Escritura com mais frequência, mas ao longo do tempo a leitura apenas reforça seu conservadorismo”.Desafiando estereótipos
Franzen especula por que poucas pesquisas são feitas sobre os efeitos da leitura das Escrituras: “as contantes referências à Bíblia reforçam a ideia de que todos sabemos o que ela diz e, consequentemente, a leitura se torna simplesmente um hábito que acaba, por vezes, sendo uma atividade sem reflexão”.
Outra pesquisa sobre religião da Baylor (que entrevistou cristãos evangélicos em 2007) reforça a opinião de Franzen. No estudo, a frequência de leitura da Bíblia foi apontada como uma das mais poderosas influências na formação de opinião sobre questões morais e políticas.
Outros dados relevantes
A probabilidade de os cristãos dizerem que é importante procurar ativamente a justiça social e econômica para ser uma boa pessoa aumentou 39% entre o que fazem a leitura da Bíblia ao menos uma vez por ano comparado aos que leem mais de uma vez por mês.
Entre os cristãos entrevistados, 27% estão mais propensos a dizer que é importante consumir ou usar menos produtos e ser uma pessoa boa ao se tornaram leitores mais frequentes da Bíblia.
Ler a Bíblia com maior frequência também está ligado a melhores atitudes em relação à ciência. Os entrevistados mostraram que, entre os que mais leem a Bíblia, têm 22% menos probabilidade de ver a religião e a ciência como incompatíveis.
As questões pareciam importar mais do que a divisão conservador-liberal. No caso de outro debate sobre a política pública e a união de pessoas do mesmo sexo, quase metade dos entrevistados que leem a Bíblia menos de uma vez por ano disse que homossexuais podem casar-se, enquanto que apenas 6% das pessoas que leem a Bíblia várias vezes por semana aprovam essas uniões.
Os leitores mais assíduos da Bíblia também mostraram-se mais propensos a se opor ao aborto legalizado, à pena de morte. Além disso, pedem punição mais severa para criminosos e o aumento da autoridade do governo para combater o terrorismo.
Sem surpresas
Os resultados podem ser surpreendentes para os que tendem a separar os cristãos apenas em blocos de direita e esquerda ou liberais e conservadores, que andam em sintonia com os políticas mais conservadoras. Mas os resultados são consistentes com pesquisas anteriores.
Em um artigo de 1998, publicado pelo Journal for the Scientific Study of Religion, os sociólogos Mark Regnerus, Christian Smith e David Sikkink descobriram que os dados da Pesquisa Sobre Identidade Religiosa e Influência (de 1996) sugeriram que, ao contrário da “sabedoria convencional”, os protestantes conservadores estavam entre os mais generosos nas doações para ajudar aos pobres.
James Bielo, professor de antropologia da Miami University, disse que os resultados da pesquisa de Franzen não são surpreendentes. Ele afirma: “Quando as pessoas leem a Bíblia, muitas vezes no contexto de outras influências, como uma igreja local, na companhia de seu cônjuge ou filhos, ou seguindo um guia de estudo, frequentemente percebem uma nova posição ou encontrar alguma nuança no que eles já acreditam”.
Em seu trabalho etnográfico com os evangélicos, Bielo descobriu que a maioria acredita que religião e ciência são compatíveis. “Em última análise, eles diriam que toda verdade é a verdade de Deus”, disse ele.
Possivelmente, a questão principal não é se os cristãos são influenciados pela leitura da Bíblia, mas quantos leem a Bíblia o suficiente para que ela faça alguma diferença. Como C. S. Lewis afirmou certa vez: “A questão principal não é o quanto a Bíblia é lida, mas como ela é entendida”.