O movimento cristão evangélico, que tem sido chave na remodelagem do cenário político dos Estados Unidos desde os anos 80, mudou de formas potencialmente momentosas nos últimos anos, tanto ampliando sua agenda quanto expondo novas rachaduras.
A morte do reverendo Jerry Falwell na semana passada acentuou o fato de que muitos da feroz velha guarda do movimento, que ajudou a convencer os cristãos conservadores a adotarem o Partido Republicano, estão envelhecendo e lentamente saindo de cena. Em seu lugar, uma nova geração de líderes, cuja maioria evita o partidarismo aberto e a abordagem confrontadora de seus antecessores, se torna cada vez mais influente.
Representados por pastores de megaigrejas como o reverendo Rick Warren, da Igreja Saddleback, em Orange County, Califórnia, e o reverendo Bill Hybels, de Igreja Comunitária de Willow Creek, nos arredores de Chicago, a nova geração de líderes evangélicos -freqüentemente para desalento daqueles que os antecederam- preferem se manifestar sobre causas tradicionalmente associadas aos liberais, como Aids, Darfur, pobreza e aquecimento global, em vez de questões sociais como aborto e casamento gay.
Mas o legado conservador da direita religiosa persiste e o aborto continua sendo uma questão definidora, até mesmo um teste decisivo, para a maioria dos evangélicos, incluindo os mais jovens, segundo entrevistas e dados de pesquisas.
“A questão do aborto continuará sendo um fator unificador entre os evangélicos e católicos”, disse o reverendo Leith Anderson, presidente da Associação Nacional dos Evangélicos, que freqüentemente é citado como exemplo do novo modelo de líder cristão conservador. “Isto não desaparecerá.”
A persistência do aborto como preocupação central para os eleitores evangélicos, que continuam a representar uma grande base eleitoral republicana, poderá complicar os esforços de Rudolph W. Giuliani, que lidera as pesquisas nacionais entre os pré-candidatos republicanos, para afastar desta questão os eleitores das primárias e fazê-los aceitarem seu apoio aos direitos de aborto. O impacto mais amplo que uma mudança na liderança evangélica poderá ter na política parece estar apenas começando.
Mas o movimento evangélico está claramente mudando. Os membros da geração “baby boomer”, os nascidos entre 1946 e 1965, estão tomando as rédeas daqueles que amadureceram na era pós-Segunda Guerra Mundial, disse D.G. Hart, um historiador de religião. Os “boomers”, disse ele, são notadamente diferentes em estilo e temperamento em comparação aos seus predecessores e muito mais animados pela justiça social e o humanitarismo. Muitos deles são pastores, diferente dos chefes dos grupos de defesa, o que os torna mais relutantes em mergulharem na política para evitar a alienação de congregações com grande diversidade.
“Eu simplesmente não vejo na próxima geração dos chamados líderes evangélicos alguém com uma mentalidade de ativismo político” como Falwell, o reverendo Pat Robertson ou James C. Dobson, ele disse.
Warren, 53 anos, que escreveu o best seller espiritual “Uma Vida Com Propósitos” e é freqüentemente identificado como um dos líderes que poderiam assumir o manto do pastor Billy Graham, dedicou grande parte dos últimos anos mobilizando os evangélicos para a erradicação da Aids na África. Mesmo assim, ele permanece teológica e socialmente bastante conservador. Ele compensa o lado mais duro de suas crenças com um estilo californiano descontraído (seu traje habitual de domingo é uma camisa havaiana).
Apesar de não falar no púlpito sobre política, ele enviou uma carta antes das eleições presidenciais de 2004 para os pastores de uma vasta rede que busca seus conselhos, pedindo para que considerassem seriamente questões “inegociáveis” como aborto, pesquisa de células-tronco embrionárias e casamento de mesmo sexo pelo ponto de vista bíblico.
Warren, juntamente com Hybels, 55 anos, e várias dezenas de outros líderes evangélicos, assinaram no ano passado um pedido de ação contra a mudança climática. A iniciativa uniu líderes cristãos populares mais conservadores com proeminentes evangélicos liberais, como o reverendo Jim Wallis, da Sojourners, e o reverendo Ronald J. Sider, da Evangélicos pela Ação Social, que há muito defendem tais causas. Notadamente ausente da lista de signatários estavam vários velhos leões da direita cristã, alguns dos quais abertamente críticos do esforço: Falwell; Robertson, 77 anos, o radiodifusor religioso; e Dobson, 71 anos, fundador da Foco na Família.
Outro porta-estandarte evangélico que não assinou a declaração foi Charles W. Colson, 75 anos, fundador da Associação de Ministérios de Presídios, que disse em uma entrevista que havia muitos grupos ambientais por trás da declaração que eram hostis às causas evangélicas. Todavia, ele disse que aprecia a direção na qual os líderes evangélicos mais jovens estão conduzindo o movimento.
“O que está acontecendo hoje é que o movimento evangélico está crescendo”, ele disse. “A consciência política evangélica atualmente é muito mais sofisticada do que no início dos anos 80.”
Fonte: UOL