A 1ª Vara de Justiça Criminal de São Paulo determinou o bloqueio de contas bancárias e bens dos fundadores da Igreja Apostólica Renascer em Cristo.
São eles o apóstolo Estevam Hernandes Filho, sua mulher, a Bispa Sônia Haddad Moraes Hernandes, e mais duas pessoas ligadas à denominação – o bispo primaz Antônio Carlos Ayres Abbud e seu irmão, o empresário Ricardo Abbud. Em um processo de nove volumes, o juiz titular da 1ª Vara, Paulo Antônio Rossi, acolheu denúncia feita pelo promotor Marcelo Mendroni, que acusa os quatro de praticar crimes de estelionato, falsidade ideológica e lavagem de dinheiro.
Em seu pedido, Mendroni referiu-se à segunda maior comunidade neopentecostal do País como uma “organização criminosa montada para lavar dinheiro proveniente de estelionato” – caracterizado pelas doações de fiéis feitas diante de promessas de algum tipo de salvação pela fé. Além de solicitar o bloqueio de bens, o Ministério Público (MP) pediu a prisão preventiva dos quatro denunciados. Rossi, no entanto, acolheu apenas o pedido do bloqueio – e marcou a primeira audiência para o 15 de setembro.
A decisão proíbe a movimentação de oito contas bancárias das empresas Colégio Gamaliel e Publicações Gamaliel. As contas foram abertas em nome do casal Hernandes. Sua movimentação registrada entre 2000 e 2003 foi monitorada com a ajuda de auditores fiscais e acusou um montante de R$ 46,4 milhões.
O juiz também bloqueou uma mansão de Estevam Hernandes em Boca Raton, na Flórida (EUA) – avaliada em U$ 465 mil -, e uma fazenda de 45 hectares em Mairinque, a 70 km de São Paulo, comprada pela igreja em 2001 por R$ 1,8 milhão.
Fundado pelo apóstolo Hernandes, o Colégio Gamaliel chegou a ter matriculadas 100 crianças a partir de 3 anos – a maioria filhos de fiéis -, mas foi fechado em 2002, sob alegação de que a inadimplência chegava a 50%. As publicações Gamaliel foram incorporadas pela Golpel Records, um dos braços do conglomerado mantido pela denominação. Ainda assim, o MP quer explicações sobre a origem do dinheiro movimentado em suas contas.
AÇÕES CÍVEIS
O bloqueio dos bens do casal Hernandes foi precedido de uma investigação que teve como base uma série de reportagens publicadas pela revista Época, em 2002. O MP passou um pente-fino em declarações de imposto de renda de 10 empresas ligadas à Renascer e levantou cerca de 100 ações civis por cobrança de dívidas contra integrantes da igreja. Ao final, o MP concluiu que a instituição se aproveita de suas prerrogativas como entidade filantrópica sem fins lucrativos para agir como organização criminosa, formando uma rede de empresas que se dedicam a movimentar o dinheiro angariado por meio de estelionato.
Os detalhes do processo vieram à tona por conta da batalha jurídica que já acontece em seus bastidores. Há duas semanas, a defesa dos fundadores da Renascer entrou no Tribunal de Justiça de São Paulo com um pedido de habeas-corpus para evitar o indiciamento. Alegou que seus clientes sofriam “constrangimento moral” porque o juiz Rossi acatou o pedido do MP com base no artigo 1º, inciso VII da Lei 9613/98, que versa sobre lavagem de dinheiro.
Foi com base nela que os quatro foram denunciados por montar organização criminosa para “ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de crime”. Mas o desembargador Ubiratan de Arruda, da 9ª Câmara, negou o habeas-corpus.
Procurado pelo Estado, o juiz Paulo Antônio Rossi disse que não poderia dar detalhes sobre o processo, “em respeito aos milhões de fiéis da Igreja”. “Mas posso confirmar que recebi a denúncia.” O promotor Marcelo Mendroni também não quis se pronunciar. O departamento jurídico da Igreja Renascer e os advogados contratados para defender os denunciados não retornaram as ligações feitas durante todo o dia de sexta pela reportagem do Estado.
Fonte: Último Segundo