Não é por falta de igreja que os bauruenses não vão ter fé. Dados da Prefeitura de Bauru indicam que, de janeiro a julho deste ano, foram concedidos alvarás de funcionamento para sete novos templos religiosos – um por mês em média. De acordo com a Receita Federal, há 535 igrejas cadastradas no órgão.
O pastor Edson Valentim, do Conselho de Pastores de Bauru, estima que existam por volta de 500 templos evangélicos na cidade. Católicas, há 25 paróquias e diversas capelas, informa o bispo dom Luiz Antonio Guedes. Assim, a soma dos dois segmentos dá 525 – o que significa que faltariam apenas dez para 535, muito pouco para abarcar umbandistas, orientais, entre outros, indicando que o número oficial pode não refletir a realidade.
Expansão
A Comunidade Cristã – O Brasil para Cristo é um exemplo de crescimento acelerado. Em 1999, o pastor José Alberto da Silva, presidente da igreja em Bauru, inaugurou o primeiro templo no município. Hoje, após oito anos, são seis. O último foi aberto no último dia 19, na quadra 24 da avenida Castelo Branco.
“A decisão de ter mais um é reflexo da ampliação do número de fiéis. É natural erguer mais templos”, afirma.
Fabiano José Mortari, empresário, participa da O Brasil para Cristo há cerca de um mês e meio. Ele freqüentava outra igreja evangélica bauruense, mas não se sentia satisfeito lá. Apesar disso, num domingo como outros, encaminhava-se ao culto. Por acaso, passou em frente da O Brasil para Cristo. “Senti-me ungido, como um chamado. Entrei e fui muito bem recebido. A pregação do pastor serviu para mim. Ele foi usado por Deus”, diz.
Fabiano revela que, naquela semana, estava bastante preocupado. “Tinha coisas de trabalho muito importantes para resolver”, explica. “E tudo foi solucionado três ou quatro dias depois. Aquela noite foi uma bênção”, completa o empresário.
Pastores buscam locais com fluxo de fiéis
O pastor Robson Alberto da Silva é filho do presidente bauruense da Comunidade Cristã – O Brasil para Cristo. Ele comanda o novo templo da avenida Castelo Branco, ponto de maior fluxo de pessoas. No entanto, antes, teve experiência não muito bem-sucedida na quadra 12 da Virgílio Malta.
“Há poucos moradores no Centro, a região é mais comercial. Na Castelo Branco, com certeza, o número de fiéis será maior”, comenta. Hoje, sua igreja conta com aproximadamente cem adeptos.
“Se tivéssemos 500, teríamos suportado as despesas, que passavam de R$ 3 mil, entre aluguel e contas de água e luz”, diz.
Segundo o pastor, na Castelo, o valor da locação cairá de R$ 2,7 mil para R$ 600, o que viabilizará a iniciativa.
Planejamento é essencial
“Nós temos muito interesse em desenvolver trabalhos em comunidades onde ainda não há igrejas”, explica o pastor Edson Valentim. Ele revela até que, no meio evangélico, existe um planejamento estratégico feito para isso.
Para o pastor, as condições sócio-econômicas não são determinantes para o avanço da quantidade de templos.
“Poucos se aproximam das igrejas evangélicas por dificuldades financeiras, por exemplo. Ao contrário: muitos dos que chegam estão bem de vida”, relata.
Em sua visão, as pessoas foram transformadas em números pela sociedade. Com isso, as relações interpessoais ficaram estremecidas. Portanto, como os evangélicos desenvolvem relacionamentos pessoais nas comunidades, a igreja cresce.
“Nós promovemos encontros para orar, conversar, estudar a Bíblia”, conclui.
“Religião acompanha modo de produção”, diz professora
“A religião sempre acompanha o modo de produção. Se hoje a produção é fragmentada, a própria religião se fragmenta.” Assim, Dalva Aleixo Dias, professora e pesquisadora da Unesp (Universidade Estadual Paulista) de Bauru, explica o crescimento do número de igrejas – “um fenômeno mundial”, afirma.
“Se, hoje, há uma grande rotatividade de mão-de-obra, por que não mudar de igreja?”, pergunta.
Jornalista e relações públicas, Dalva teve como tema de mestrado a comunicação nas religiões populares. Ela argumenta que o mundo atravessa momento de transição política, econômica e social. Com isso, as grandes certezas caíram.
“Antes, as famílias eram patriarcais, as empresas, locais e os empregos, estáveis. Hoje, existe a flexibilização do trabalho, o atendimento à saúde está cada vez mais difícil… Enfim, tudo gera muitas incertezas.”
A professora avalia que, em todas as fases históricas de crise, as pessoas começam a buscar sentido. “Como as religiões oferecem modelos de comportamento, isso representa alguma estabilidade, uma verdade na qual se possa acreditar.”
Para Dalva, no mundo capitalista atual, cada igreja tenta oferecer um serviço diferenciado. “É um ‘mercado religioso’. Nele, as pessoas buscam o que mais lhes agrada. As igrejas funcionam como qualquer organização capitalista, tentando demonstrar eficiência”, explica.
Resgatando o sociólogo alemão Max Weber, autor de “A ética protestante e o espírito do capitalismo”, a jornalista e releações-públicas entende que o protestantismo (leia-se igrejas evangélicas) avança porque seu fracionamento serve às configurações atuais do capitalismo – assim como a rotatividade.
Desacordo e bateria
Um exemplo dessa “rotatividade religiosa” é a história do vendedor Paulo Vítor Batista da Cunha freqüenta a igreja Batista Detel, na Pousada da Esperança.
Até 10 meses atrás, o jovem participava de outra igreja – que ele prefere não mencionar.
“Lá, tive alguns problemas pessoais, foi um desacordo”, narra.
A gota d’água da discórdia foi, acredite, musical. Paulo tocava bateria em vários cultos por mês. Porém, uma nova liderança decidiu promover mudanças. Assim, ele passou a tocar a cada 15 dias, o que o deixou bastante insatisfeito.
Atualmente (e mais feliz), Paulo exerce seus dotes de baterista em todos os cultos da Batista Detel, reaizados às quartas-feiras e também aos domingos.
Questionado se não quer ser músico, responde: “Sim, claro. Sonho em ser músico profissional.”
Por enquanto, as baquetas estão a serviço de Deus na Pousada da Esperança.
Problemas do país lotam novos templos
Para o bispo de Bauru, dom Luiz Antonio Guedes, a igreja católica, as evangélicas tradicionais, as metodistas e as luteranas têm regras mais rígidas para autorizar o funcionamento de um novo templo. “Os processos são semelhantes”, explica.
Já com as correntes evangélicas mais novas, há maior liberdade. Basta fazer um estatuto, registrar e criar uma nova comunidade.
Dom Luiz acredita que o desalento provocado pela situação sócio-econômica do país pode ser também considerado um dos fatores que causam maior procura por igrejas – e isso favorece o surgimento de novos templos.
O bispo bauruense comenta que os católicos não buscam novos fiéis: apenas querem atrair os que foram batizados pelo catolicismo e, hoje, não freqüentam a igreja.
“Hoje, os templos estão lotados, sejam os evangélicos, católicos ou de umbanda. O povo está buscando bens materiais. E Deus não dá isso.” Dessa forma, Evandro de Ogum, da Federação Espírita de Umbanda e Candomblé do Estado de São Paulo, justifica a expansão do número de igrejas.
O dirigente entende que a situação sócio-econômica é determinante no avanço.
“A fome e
o desemprego são realidades no mundo, não só no Brasil. Com isso, as pessoas ficam mais vulneráveis a tudo o que se relaciona a lucro.”
Fonte: Bom Dia Bauru