O ano que se encerra à meia-noite de hoje, 31 de dezembro, foi marcante para o público evangélico por conta de intensas discussões a respeito da liberdade de crença e expressão, embates com ativistas gays, polêmicas sobre racismo e homofobia que cercaram o pastor Marco Feliciano (PSC-SP), novela com personagem evangélica, entre outros.
Talvez o evento mais chocante do ano tenha sido a prisão do pastor Marcos Pereira, líder da igreja Assembleia de Deus dos Últimos Dias (ADUD), acusado de estuprar fiéis de sua denominação. Mesmo com pontos obscuros na investigação, como as denúncias de depoimentos forjados contra Pereira, o pastor foi condenado em primeira instância e está preso no complexo penitenciário de Bangu, no Rio de Janeiro.
Os holofotes sobre Marco Feliciano também foram intensos e acusatórios. O pastor da Assembleia de Deus Catedral do Avivamento e deputado federal virou o centro das atenções políticas quando foi eleito presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias (CDHM) da Câmara dos Deputados.
Feliciano já era velho adversário dos ativistas gays, que com sua exposição, passaram a atacá-lo de forma mais acentuada, repercutindo antigas declarações do pastor sobre homossexualidade, e acusando-o de racismo, por ter dito certa vez que, na teologia, há uma linha de pensamento que defende a teoria de que descendentes de Noé, amaldiçoados por seu patriarca, tinham ido habitar a África.
As declarações, inoportunas para o canal que Feliciano usou – o Twitter – foram propagadas fora de contexto e se tornaram combustível para a maior pressão política e social que se tem notícia de que um único deputado tenha sofrido. Firme, o pastor resistiu ao cargo e ainda desafiou, em troca de sua renúncia, o Partido dos Trabalhadores – legenda esta que foi sua maior adversária na CDHM – a retirar os parlamentares João Paulo Cunha e José Genoíno, condenados pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no processo do mensalão, da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara.
O mandato de Feliciano à frente da CDHM terminou com o pastor sendo portador de alto capital político, convidado por diversos partidos para sair candidato nas eleições de 2014. No entanto, Marco Feliciano optou por permanecer em sua legenda, o PSC, e tentar a reeleição na Câmara. Há quem acredite que as urnas reservam aproximadamente 1 milhão de votos para o pastor. A conferir.
As eleições 2014, quando a presidente Dilma Rousseff (PT) tenta a reeleição, também foi fator importante para a derrubada do polêmico PLC 122, projeto que tramita há mais de uma década no Congresso Nacional e que previa, segundo a maioria dos líderes evangélicos do país, “privilégios para ativistas gays” em detrimento de direitos constitucionais universais a todos os brasileiros.
Preocupada em manter o apoio de correntes dentro do meio evangélico, Dilma pediu aos senadores que votassem o PLC 122 apenas após as eleições. O pedido, acatado pela bancada governista, foi logo esquecido após a decisão dos senadores de apensar o projeto ao texto do novo Código Penal, que vem sendo costurado no Senado com a ajuda de renomados juristas.
Dessa forma, o PLC 122, proposto pela ex-deputada Iara Bernardi, foi enterrado politicamente. A derrota irritou um dos principais ativistas gays do Brasil, o deputado federal Jean Wyllys (PSOL-RJ). Há a possibilidade de que suas propostas retornem em forma de artigos no novo Código Penal, mas a discussão em torno do tema será extensa e demorada.
Um dos que mais comemoraram o fim do PLC 122 foi o pastor Silas Malafaia. Conhecido por seu empenho contra o projeto, o pastor organizou uma manifestação pacífica em Brasília no dia 05 de junho, reunindo inúmeros artistas gospel e milhares de fiéis em frente ao Congresso Nacional, para pedir a preservação da liberdade de expressão, religiosa, defesa da família e da vida.
Na política, o pastor deu o tom de sua postura ao expressar-se publicamente contra o PT na esfera federal, e zombar do partido após o anúncio de Marina Silva como integrante da candidatura de Eduardo Campos (PSB) ao Palácio do Planalto. À época, o pastor usou o Twitter para provocar a legenda: “Chora PT”.
No cenário cristão, Malafaia se viu estampado como um dos cinco líderes religiosos mais ricos do Brasil pela edição nacional da revista Forbes. O pastor da Assembleia de Deus Vitória em Cristo (ADVEC) foi apontado como proprietário de uma fortuna de US$ 150 milhões, logo atrás do apóstolo Valdemiro Santiago, que teria patrimônio equivalente a US$ 220 milhões e do bispo Edir Macedo, proprietário da TV Record e supostamente de valores que chegariam a US$ 950 milhões. Completavam a lista da Forbes o empresário e missionário R. R. Soares, líder da Igreja Internacional da Graça de Deus e “dono” de US$ 125 milhões; e o casal Hernandes, da Igreja Renascer em Cristo. Juntos, Estevam e Sonia, seriam donos de aproximadamente US$ 65 milhões.
A fortuna atribuída a Valdemiro Santiago teria chamado a atenção de outros integrantes da Igreja Mundial do Poder de Deus e virado protagonista de um escândalo interno na denominação. Desvios de dízimos e ofertas teriam aberto um rombo nas contas da igreja e resultado no afastamento do bispo Josival Batista, braço direito do apóstolo e responsável pelas contas da igreja. Batista foi transferido para Portugal, enquanto que outros 100 pastores, subordinados a ele, foram afastados de suas funções.
As dívidas da Mundial teriam chegado a R$ 21 milhões, e a maior parte do valor seria de aluguéis das programações de emissoras do Grupo Bandeirantes, como o Canal 21 e a própria Band. Com a falta de pagamento, a denominação neopentecostal perdeu os horários que ocupava para sua maior concorrente, a Igreja Universal do Reino de Deus, do bispo Edir Macedo.
Sem espaço nas principais emissoras em que veiculava seus cultos, Valdemiro apostou na exposição de sua imagem, e encontrou guarida no SBT, emissora que há tempos ele sonda para ocupar a grade de programação nas madrugadas. Embora suas tentativas venham sendo rechaçadas, Valdemiro ajudou o SBT a derrubar a TV Record – emissora de seu adversário, bispo Macedo – durante um domingo, quando participou do programa Domingo Legal. A boa performance rendeu outros dois convites: uma entrevista ao apresentador Ratinho, seu antigo desafeto, e uma participação no Programa Silvio Santos, ao lado do homem do baú, que ainda não foi levada ao ar.
O público evangélico viu, em 2013, a Globo mergulhar de cabeça na sua estratégia de buscar aproximação com o público evangélico. Os executivos da emissora da família Marinho não sabiam, no entanto, que a piscina era rasa. As empreitadas com o Festival e Troféu Promessas foram fracassadas. O primeiro, registrou a menor audiência desde que foi lançado, e o segundo, teve sua festa de premiação cancelada por causa dos custos.
A maior ambição das Organizações Globo era substituir a falida Expocristã com sua Feira Internacional Cristã (FIC), porém a iniciativa também não saiu como esperado, e provavelmente a FIC não tenha uma segunda edição. A estratégia mais bem sucedida até o momento é a criação de um núcleo evangélico na novela Amor à Vida, escrita por Walcyr Carrasco. O sucesso – se o critério de avaliação for a audiência – da personagem Gina, convertida ao Evangelho, resultou no retorno à trama do personagem Efigênio, como pastor de uma igreja apresentada pela novela sem caricaturas. As redes sociais, que antes eram palco de críticas à emissora por conta das personagens evangélicas caricatas, não registraram protestos contra o folhetim.
No âmbito internacional, temas como perseguição e intolerância religiosa tem sido manchete nos principais veículos de informação voltados ao público cristão. Um dos ícones cristãos do século XX, o evangelista Billy Graham (conhecido por superar barreiras de perseguição religiosa mundo afora e anunciar o Evangelho), pregou seu último sermão aos 95 anos em novembro, numa edição da Cruzada Minha Esperança que foi planejada durante meses por seus auxiliares. Com a saúde debilitada, Graham esteve internado duas vezes esse ano por conta de problemas respiratórios, e seu filho caçula, o pastor Franklin, pediu oração por seu pai.
A Igreja Católica assistiu a eventos inéditos em sua história recente, como a renúncia do papa Bento XVI e a eleição a pontífice do cardeal argentino Jorge Mario Bergoglio, que já havia sido cotado para o cargo em 2005, durante o conclave que definiu Joseph Ratzinger como sucessor de João Paulo II.
Carismático, Bergoglio escolheu ser chamado Francisco, em referência ao religioso que inspira os integrantes das organizações franciscanas dentro da Igreja Católica, e conquistou a simpatia do mundo com seu jeito simples e sua mensagem de humildade. A primeira viagem do novo papa foi ao Brasil, durante a Jornada Mundial da Juventude (JMJ), que reuniu milhões de católicos no Rio de Janeiro.
Para 2014, as eleições e a realização da Copa do Mundo no Brasil deverão atrair as atenções para o nosso país. Movimentos sociais, que entre junho e julho deste ano tomaram as ruas – com apoio de diversas lideranças cristãs – em protestos contra a corrupção e a favor de reforma política, prometem voltar à carga durante a realização dos jogos entre seleções organizados pela Federação Internacional de Futebol Associado (FIFA) e durante a campanha eleitoral.
Por Tiago Chagas, para o Gospel+