O destino do deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) poderá ser definido a partir das próximas semanas, com um acordo que envolva sua renúncia à presidência da Câmara dos Deputados, em troca da salvação, temporária, de seu mandato.
Cunha tornou-se figura admirada entre seus colegas por sua habilidade política, amplo conhecimento do regimento interno da Câmara e determinação em levar adiante, de forma rápida, o pedido de impeachment de Dilma Rousseff (PT).
Mesmo sendo réu no Supremo Tribunal Federal (STF) por conta das acusações da Operação Lava-Jato e estando sob risco de perder o mandato por conta do processo em curso contra ele no Conselho de Ética – que analisa se ele mentiu em depoimento prestado na CPI da Petrobras -, Cunha conserva cartas na manga.
Alguns de seus pares entendem que a perda do mandato por ter mentido em depoimento seja uma punição muito dura: “O juízo da casa é um juízo político, de conveniência e oportunidade”, afirmou o deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR), em entrevista ao El Pais.
Segundo Serraglio, o processo no Conselho “não vai dar em nada, uma vez que o Cunha tem maioria lá”, observou. Por outro lado, Serraglio admite que Cunha receba uma punição, como a suspensão do mandato, já que o STF decidiu, em outras ocasiões, que “mesmo sob juramento você pode mentir para não se prejudicar”. “Logo é duvidoso ele ser condenado por mentir sem estar sob juramento”, contextualizou Serraglio.
A maioria no Conselho de Ética, mencionada pelo deputado, foi conquistada recentemente, através da troca de um dos integrantes: o deputado Fausto Pinato (PP-SP), no início de abril, decidiu entregar a vaga depois que trocou de partido, e seu lugar foi ocupado pela deputada Tia Eron (PRB-BA), que integra a bancada evangélica e é aliada de Cunha.
“Entendo que deva haver [uma punição], mas não entendo que deva ser a cassação”, opinou Carlos Marum (PMDB-MS), reforçando a expectativa de que o deputado escape “ileso”.
Chico Alencar (PSOL-RJ), um dos autores da denúncia contra Cunha, disse que essa manobra já era prevista: “Está se confirmando o que nós já sabíamos, é uma grande farsa, eu não ficaria nem um pouco surpreso se ele fosse anistiado pelo Conselho de Ética”, desabafou.
Livre, mas…
Hoje, Cunha só é menos impopular que a presidente Dilma Rousseff. Ciente disso, o vice-presidente Michel Temer (PMDB) estaria tentando costurar um acordo para que, caso ele assuma a presidência, Cunha renuncie ao mandato de presidente da Câmara.
A ideia seria evitar o desgaste junto à opinião pública e facilitar a construção de uma coalizão, suprapartidária. Em troca, Cunha teria seu mandato preservado, e dessa forma, manteria seu processo no STF, longe do juiz Sérgio Moro.
De acordo com analistas políticos, o próprio Cunha estaria disposto a tentar essa alternativa, embora publicamente ele negue que vá renunciar à presidência da Câmara.
“Acho que ele devia renunciar. Já disse isso a ele. Vai chegar o momento em que o processo dele irá ao plenário da Câmara. Tem também o processo no Supremo”, argumenta o deputado Miro Teixeira (Rede-RJ).
Com a deposição da presidente Dilma, o presidente da Câmara se torna, na prática, o vice-presidente do país. Em viagens oficiais, ou em caso de licença-médica ou afastamento do presidente, o presidente da Câmara é quem assume a presidência, temporariamente.
Como há um processo em andamento no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) por suspeita de uso de propina na campanha que elegeu Dilma e Temer, o resultado poderia ser a cassação da chapa, o que levaria Temer a ter o mandato cassado. Nesse caso, o presidente da Câmara assumiria, interinamente, com obrigação de convocar novas eleições.
E é exatamente essa possibilidade que tanto Temer, quanto os demais parlamentares, querem evitar. Pelo acordo que vem sendo costurado, o deputado Rogério Rosso (PSD-DF), que é advogado, seria o favorito para ser eleito presidente da Câmara.
Rosso presidiu a Comissão Especial que analisou o impeachment de Dilma e foi muito elogiado pelos colegas. “Ele tem bom trânsito por todos os grupos da Câmara, característica que interessa muito a Temer, que terá que fazer um governo de coalizão, administrando muitos partidos e interesses conflitantes”, noticiou o jornal O Dia.
Agora, resta saber se Cunha não guarda nenhuma outra carta na manga para safar-se das acusações.