O arcebispo católico dom Jaime Vieira Rocha, responsável pela Arquidiocese de Natal (RN), enviou um pedido ao papa Francisco para que 30 brasileiros – 28 fiéis e dois padres – sejam canonizados de uma vez só.
Esses 30 católicos foram mortos durante um conflito religioso em 1645 nas cidades de Cunhaú e Uruaçu, no Rio Grande do Norte, por tropas a serviço dos holandeses, protestantes, que dominavam uma extensa área do estado de Pernambuco à época.
De acordo com dom Jaime, a canonização tem grandes chances de acontecer: “O papa manifestou interesse na canonização, que poderá ser feita por decreto, sem exigência de milagres, porque os mártires foram mortos por confessarem a fé católica”, disse, de acordo com informações do jornal O Estado de S. Paulo.
Esse grupo de 30 católicos já foram beatificados há quinze anos, pelo papa João Paulo II, durante uma cerimônia na Praça de São Pedro, no Vaticano.
Relatos históricos apontam para o fato de que o massacre foi executado por índios tapuias e potiguares, que atuavam com treinamento e comando das tropas holandesas. O comandante do grupamento era Jacob Rabbi, um alemão contratado pela Companhia das Índias Ocidentais Holandesas.
Como evento marcante da época, a história do caso virou alvo de pesquisa de dois museus diferentes: a Torre do Tombo, em Portugal, e o Museu de Ajax, na Holanda. “Segundo documentos sobre o episódio, os holandeses sob o comando de Jacob Rabbi ofereceram aos católicos a opção de salvar a vida, se eles se convertessem ao calvinismo [uma das vertentes do protestantismo], mas eles se recusaram”, afirmou o padre Júlio César Souza Cavalcante, da Arquidiocese de Natal.
Os dados existentes sobre o conflito são parciais, incompletos e contraditórios. O que historiadores admitem é que o massacre desencadeou uma revolta de brasileiros e portugueses contra os holandeses, o que ajudou na expulsão destes de Pernambuco.
Outro lado
De acordo com Danilo Fernandes, blogueiro editor do Genizah, o episódio é apresentado de forma parcial, ignorando relatos sobre os abusos que teriam sido cometidos pelos católicos.
“Há fontes discordantes sobre o episódio. Inclusive, centenas de índios convertidos à reforma terminaram martirizados com o fim do Brasil holandês. Índios potiguares ficaram ao lado dos holandeses porque ganharam liberdade e um status que não dispunham diante da Coroa Portuguesa. Receberam postos de liderança no Brasil holandês e conheceram o Evangelho. Passaram a servir em todos os campos, inclusive militar, e lutaram contra a resistência portuguesa, o que foi o caso presente. O Mackenzie tem boas obras sobre o Brasil holandês”, escreveu.
O conflito entre católicos e protestantes calvinistas não se resume ao massacre de Cunhaú e Uruaçu. Um missionário francês, chamado Jacques Le Balleur, que havia sido enviado ao Brasil por João Calvino em 1557, para difundir a fé protestante.
Balleur celebrou o primeiro culto evangélico do Brasil em 10 de Março de 1557, e a primeira Ceia Memorial no dia 21 do mesmo mês. O missionário enfrentou a resistência de padres jesuítas, o que terminou com sua prisão dois anos depois.
Já em 1567, após oito anos de torturas na prisão, o governador-geral do Brasil à época, Mem de Sá, condenou Le Balleur à morte por confessar o cristianismo protestante.
A execução do missionário aconteceu na presença do padre espanhol José de Anchieta, fundador da cidade de São Paulo e canonizado pela Igreja Católica em 2014.
Anchieta teria ficado incomodado com a falta de convicção do carrasco em tirar a vida do missionário, já que este não havia praticado crime algum, segundo o ex-padre Aníbal Pereira dos Reis escreveu no livro “O Santo que Anchieta Matou”.
Para pôr fim à situação, Anchieta teria tomado à frente do carrasco e decidido dar cabo da vida do missionário ele próprio: “E porque o carrasco, talvez condoído, sem coragem de apressar a morte da vítima inocente, ele mesmo, José de Anchieta, acaba de matá-lo, dizendo, ufano, ao carrasco acovardado: ‘Eis aí como se mata um homem!’“, afirmou André Heullard, católico, de acordo com informações do Holofote.net.