O movimento que se propõe a buscar a legalização do aborto em casos de microcefalia na Justiça encontrou seu primeiro obstáculo: a opinião contrária de importantes juristas.
A iniciativa do instituto de bioética Anis, representado pela antropóloga Debora Diniz, conta com apoio do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), mas foi frontalmente rebatida por juristas de diversas áreas do Direito.
De acordo com informações do portal Consultor Jurídico, a maioria dos especialistas é contrária à iniciativa do instituto Anis. O tema veio à tona devido à epidemia causada pelo vírus zika.
Um dos pontos em que o Anis se apoia é justamente a liberação do aborto em casos de anencefalia, determinada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 2012. No entanto, os juristas acreditam que não há paralelos entre os casos.
A legislação em vigor no país autoriza o aborto em casos de estupro e anencefalia, mas não permite interpretações que levem a Justiça a abrir precedentes em casos de microcefalia.
O ministro aposentado do STF, Carlos Velloso, observa que a aprovação do aborto para casos de anencefalia não pode ser usada como exemplo para casos de microcefalia, e destaca que são condições diferentes: “Seria uma brutalidade sem nenhuma justificativa eliminar uma vida porque a criança vai nascer com problema cerebral. Então, se tiver também problema coronariano, pulmonar, vamos autorizar o morticínio?”, interrogou.
Seguindo a mesma linha de raciocínio, o professor de Direito Constitucional da Universidade de São Paulo, José Levi Mello do Amaral Júnior, lembra que a microcefalia não impede a vida, mesmo que existam limitações, e frisa que se o STF decidir autorizar os abortos para esses casos, poderá ficar caracterizado uma manobra das leis: “A microcefalia típica não implica impossibilidade de vida extrauterina e os exemplos concretos são numerosos, inclusive de pessoas nesta condição que superaram limitações e, até mesmo, colaram grau em curso superior. Por isso mesmo, admitir aborto no caso de microcefalia seria vulgarizar algo que é excepcional no Direito brasileiro”, opinou.
O exemplo citado pelo professor Amaral Júnior coincide com o da jornalista Ana Carolina Cáceres, 24 anos, nascida com microcefalia. Em entrevista ao programa Bem Estar, da TV Globo, ela foi contundente na posição contrária à proposta do instituto Anis: “No dia em que nasci, o médico falou que eu não teria nenhuma chance de sobreviver. Tenho microcefalia, meu crânio é menor que a média. O doutor falou: ‘Ela não vai andar, não vai falar e, com o tempo, entrará em um estado vegetativo até morrer’. Ele – como muita gente hoje – estava errado”, pontuou.