Os muçulmanos costumam exaltar que o livro sagrado do islamismo, Alcorão, nunca sofreu alterações ao longo dos séculos. A descoberta de um manuscrito do século VIII, no entanto, pode mudar essa perspectiva.
A descoberta foi o resultado de uma pesquisa conduzida pela acadêmica francesa Dr. Eléonore Cellard, através de imagens de uma “palimpsest”, um manuscrito sobre o qual a escrita posterior foi sobreposta à escrita anterior.
Depois de perceber as letras fracas, ela entrou em contato com a casa de leilões Christie’s – que era detentora do manuscrito – e, após uma análise mais aprofundada, identificou o texto copta como palavras do Livro do Deuteronômio, parte da Torá e do Antigo Testamento da Bíblia Sagrada.
Eléonore Cellard, que está ligada ao College de France, disse: “Esta é uma descoberta muito importante para a história do Alcorão e do início do Islã. Temos aqui uma testemunha de interações culturais entre diferentes comunidades religiosas”.
A descoberta mostra marcas do texto de Deuteronômio, que foi apagado e substituído pela inscrição islâmica. Essa prática de sobreposição de escritas é chamada de palimpsesto, e era comum na antiguidade.
Agora, os estudiosos acreditam que esse manuscrito tenha sido produzido no Egito, onde já havia uma forte comunidade cristã copta – que atualmente representa 10% da população do país. No entanto, um processo de datação da escrita cristã original no manuscrito é considerada praticamente impossível, pois o risco de dano ao artefato é alto.
Romain Pingannaud, especialista da casa de leilões, comentou sobre a descoberta: “É extraordinário. Uma vez que você sabe que está lá, você só pode vê-la, torna-se tão óbvio. É fascinante, especialmente porque é o único exemplo em que você tem um texto em árabe em cima de um texto não-árabe”, afirmou.
“O pergaminho é muito forte, não sofre muito – é sensível à umidade, mas muito sólido. Na época em que foi apagado, o pergaminho provavelmente era novo e só com séculos se passando, a tinta que afundou no pergaminho fornece essa imagem que revela o texto que vemos por baixo”, acrescentou o especialista, segundo informações do portal britânico Express.
“E o que é ainda mais fascinante é que está no topo das passagens do Antigo Testamento […] Isso mostra o contato entre as comunidades nos primeiros séculos do Islã; é muito relevante”, finalizou, evidenciando a importância histórica da descoberta.