O antropólogo evangélico Ricardo Lopes Dias, nomeado para a Coordenadoria Geral de Índios Isolados e Recém Contatados (CGIIRC) da Funai, está na mira da Procuradoria da República no Distrito Federal (PRDF). Os procuradores acreditam que ele não fará distinção do trabalho técnico e a prática do evangelismo.
Os procuradores moveram uma ação civil pública pedindo sua suspensão na última quarta-feira, 12 de fevereiro, por entenderem que a nomeação de Dias criou um “conflito de interesse”.
O antropólogo evangélico foi nomeado pelo presidente da Funai, Marcelo Xavier, após uma alteração das regras que estabelecem os critérios necessários para a função. Antes, somente funcionários de carreira da fundação poderiam ocupar o cargo, que é considerado altamente técnico e sensível, por ser dedicado à proteção dos índios isolados ou com contato recente.
Dias atuou por quase dez anos na Missão Novas Tribos do Brasil (MNTB), entidade conhecida pelo trabalho de evangelização de populações indígenas. Segundo informações do jornal O Globo, os procuradores responsáveis pela ação veem risco de violação de Direitos Humanos.
“A nomeação de pessoa que não seja servidor público efetivo e que, ademais, possua vinculação com organização missionária cuja missão é evangelizar povos indígenas, reveste-se de evidente conflito de interesses com a política indigenista do Estado brasileiro, cujas premissas encontram-se na Constituição de 1988 e nos tratados internacionais de Direitos Humanos. A referida nomeação aponta para o esvaziamento da proteção constitucional aos direitos dos povos indígenas”, alardeia a ação.
Outro temor é que informações confidenciais sobre as tribos possam ser repassadas a outras missões evangelísticas pelo antropólogo evangélico: “Considerando que o Brasil é o país onde se registra o maior número de povos indígenas isolados na América do Sul – o Estado brasileiro reconhece a existência de 114 registros, sendo 28 desses com presença confirmada – os riscos de informações e dados sensíveis e confidenciais armazenados na CGIIRC serem acessados por missões de fé com propósitos declaradamente evangelizantes é patente”, acrescenta.
Missões
Em meio à polêmica, duas integrantes de uma organização missionária cristã receberam um convite do Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos para integrar a equipe que fará uma viagem ao território de um dos povos indígenas com menos laços com a civilização externa: os índios suruwahás, no estado do Amazonas.
O governo federal determinou a realização da viagem com o propósito de tratar uma “crise de saúde mental” que atingiu a tribo e causou cinco suicídios entre os indígenas ao longo de 2019. A etnia, também conhecida como zuruahã, soma pouco menos de 200 integrantes, de acordo com informações da BBC.
Comporão a equipe duas indígenas ligadas à Jocum (Jovens com uma Missão), entidade missionária que enfrentou uma investigação do Ministério Público Federal (MPF) “em função de atividades proselitistas e discriminatórias”. À época, os missionários envolvidos terminaram expulsos do território suruwahá.
No entanto, a Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), do Ministério da Saúde, informou que as duas indígenas convidadas, Muwaji e Inikiru Suruwahá, trabalhão exclusivamente como intérpretes dos técnicos do governo. As duas saíram da aldeia há 14 anos, na companhia de missionários da Jocum. Desde então, uma delas se tornou missionária evangélica, e a outra se engajou em campanhas promovidas pela organização.
A viagem, iniciada na última quarta-feira, 12 de fevereiro, se estende até 22 de fevereiro.