Adélio Bispo de Oliveira, o agressor de Jair Bolsonaro (PSL) preso em flagrante na quinta-feira, 06 de setembro, após a tentativa de assassinato do candidato à presidência, está cercado de mistérios: tem quatro advogados de escritórios de alto padrão, estava na cidade com hospedagem paga em dinheiro vivo, quatro celulares, um notebook e diversos outros detalhes não esclarecidos.
As principais perguntas a serem respondidas são, também, origem de muita desconfiança. Nas redes sociais, desde que surgiram as primeiras informações sobre o militante de esquerda, ex-filiado ao PSOL, questiona-se como seriam custeados os honorários dos advogados famosos, como o servente de pedreiro desempregado teria pago suas despesas de hospedagem e quais as ligações com denominações religiosas.
Advogados
Na sexta-feira, 07 de setembro, as informações – desencontradas – começaram a surgir. De acordo com o portal O Antagonista (a partir de publicações do Uol), “um dos quatro advogados de Adélio Bispo de Oliveira, o agressor de Jair Bolsonaro, disse que a equipe foi contratada depois de um contato de familiares e membros das Testemunhas de Jeová”.
“Fomos contatados por membros da igreja para que viéssemos aqui”, declarou Zanone Manuel de Oliveira Júnior, advogado que ficou famoso por atuar na defesa do ex-goleiro Bruno.
Essa versão, entretanto, mudou dois dias depois, quando Zanone disse que a defesa está sendo paga por um conhecido da igreja que Adélio frequenta: “É filantropia. Eu não sei por meio de qual igreja eles se conhecem. Adélio tem conhecidos que são Testemunhas de Jeová, mas não tenho certeza se a pessoa que me contratou é Testemunha de Jeová”, declarou.
Em outra entrevista, Zanone voltou a falar da contratação de seus serviços, dizendo que havia sido contratado por um homem da cidade de Montes Claros (MG), que seria frequentador da mesma igreja de Adélio, e que a equipe que atuava a seu lado tinha sido contratada apenas para os primeiros dias do processo, sem revelar a identidade do contratante, segundo o G1.
Fernando Costa Oliveira Magalhães, outro advogado de Adélio (também conhecido por atuar no caso Bruno), alegou que sua atuação não tem ligação com partidos políticos ou nomes públicos conhecidos, também recusou revelar a identidade de quem o contratou e quanto foi pago pelos serviços, embora tenha dado uma versão levemente diferente da apresentada por Zanone.
Segundo o jornal Estado de Minas, Magalhães afirmou que ele e os demais advogados haviam sido “contratados a partir de uma congregação de Montes Claros, que pediu sigilo”. Porém, essa versão foi modificada novamente no sábado, por Zanone: “Um processo desse não é barato. Tem uma história que vão fazer uma vaquinha. Espero mesmo que façam. Mas a gente não está sendo financiado por igreja alguma”, disse, de acordo com o jornal O Estado de S. Paulo.
Suspeitas
O deputado federal Fernando Francischini (PSL-PR), formado em Direito e membro da Assembleia de Deus, foi o representante de Jair Bolsonaro na audiência de custódia de Adélio, realizada na sexta-feira à tarde, 07 de setembro, e levantou suspeitas sobre a contratação da equipe de advogados.
“Nos chama muita atenção – e aqui eu faço o registro de que é um direito da defesa ter advogados -, mas alguém, em situação de pobreza como a gente viu, ter quatro advogados e não ter a defensoria pública acompanhando… Só aí eu deixo para vocês de que não há indícios de que não é um ‘lobo solitário’ sem estrutura financeira nenhuma”, declarou o deputado federal.
Na manhã seguinte à audiência, Adélio foi transferido de Juiz de Fora para um presídio federal no Mato Grosso do Sul, onde cumprirá prisão preventiva, enquanto o inquérito baseado na Lei de Segurança Nacional estiver em aberto.
Silêncio
Logo após as primeiras versões desencontradas sobre o custeio dos advogados, os familiares de Adélio – que vivem em casas humildes num bairro pobre de Montes Claros, foram orientados a não dar declarações à imprensa. “Só podemos dizer que não sabemos de nada. Não vou responder nenhuma pergunta. Vou sempre dizer não, não e não”, disse uma sobrinha do agressor.
O pedreiro Eraldo Fábio Rodrigues Oliveira, 47 anos, companheiro de uma sobrinha de Adélio, declarou que o agressor de Bolsonaro mantinha hábitos estranhos sempre que retornava à cidade natal para rever a família. Um deles era permanecer trancado dentro de um quarto com as janelas fechadas, mesmo em épocas de clima quente.
As visitas à família aconteciam porque Adélio havia deixado a localidade aos 17 anos, para trabalhar em Santa Catarina. Depois disso, atuou em diversos empregos, segundo uma sobrinha: “Teve uma época que ele ficou vários dias no navio (atracado) a poucos metros da entrada dos Estados Unidos. Ele contou que teve oportunidade de entrar lá, mas preferiu nao fazer isso”.
Igreja Quadrangular
Embora os advogados tenham relacionado Adélio às Testemunhas de Jeová, a sobrinha dele afirmou em entrevista ao Estado de Minas que há oito anos o agressor de Bolsonaro havia se tornado missionário da Igreja do Evangelho Quadrangular, e que por isso vivia em viagens: “Ele sempre ficava viajando entre Uberaba, Uberlândia e Santa Catarina”, disse ela.
O terceiro advogado da equipe de Adélio, Pedro Augusto Lima Possa, havia declarado ainda na quinta-feira, 06 de setembro, que seu cliente não tinha intenção de matar o candidato, e que havia agido por motivações “de cunho político” e “religiosas”, já que disse aos policiais que atacou Bolsonaro “a mando de Deus”.
O pastor Antônio Levi de Carvalho, que dirige a congregação da Quadrangular em Montes Claros, negou que a denominação esteja custeando os gastos com os advogados de Adélio, muito menos que o agressor tenha tido qualquer relação com a instituição. “A igreja não reconhece o senhor Adelio como membro desta igreja. A igreja informa que não pagou absolutamente nada de custas processuais dos advogados do senhor Adelio”, disse, jogando ainda mais dúvidas sobre a confusa narrativa dos advogados.
“Conhecemos a realidade da nossa cidade, que é difícil. Quem aqui teria dinheiro para contratar advogados de um calibre desse?”, questionou o pastor. “A nossa igreja recebe visitas de muita gente. Não dá para saber quem são todas as pessoas que visitam a igreja. Estou há 13 anos em Montes Claros e nunca tive notícia dele [Adélio] em alguma igreja nossa”, acrescentou, enfatizando que a denominação mantém uma lista de fiéis registrados.
Ao mesmo tempo, representantes das Testemunhas de Jeová de Montes Claros informaram que Adélio Bispo e sua família não são ligados à entidade, e que a organização não contratou ou possui “qualquer relação com a contratação de advogados para a defesa” de Adélio.
Insanidade
Mesmo com todas as perguntas não respondidas sobre a atuação no caso, Zanone Júnior revelou no sábado que ele e os demais integrantes da equipe de defesa de Adélio decidiram que pedirão o “incidente de insanidade”, pois o cliente faria usado de medicação controlada.
Um novo ponto incomum sobre o caso surge nesse ponto: três peritos teriam oferecido o serviço para atestar a insanidade de Adélio de forma gratuita. “Normalmente eles cobram de R$ 20 mil a R$ 30 mil por perícia”, disse Zanone.
A narrativa de insanidade foi corroborada por Magalhães: “Ele acredita que aquilo que fez foi para proteger as pessoas, a Nação de um facínora. Não vendemos fantasia. Vendemos serviço jurídico. Não tem condição de absolvê-lo”, afirmou o advogado.
Versões finais de cada um dos advogados
Se ninguém em nenhuma das duas denominações religiosas conhecia Adélio, como alguém ligado a alguma das igrejas citadas teria tomado iniciativa para contratar os advogados, prometendo uma coleta de doações para o custeio?
Fernando Magalhães
“Uma pessoa que se diz representando uma congregação [os procurou]. Não nos cabe percorrer o caminho de provar ser verdadeiro ou não o que declarou. Sabemos que o ataque não teve cunho religioso e sim político, por convicção do cliente e sem interferência de terceiros”, disse, contrariando declaração anterior do colega de equipe, Pedro Possa.
Pedro Augusto de Lima Felipe e Possa
“Adelio se disse testemunha de Jeová. Não tem cunho da igreja (o pagamento). Foi uma pessoa ligada à religião dele que nos contratou”, resumiu.
Marcelo Manoel da Costa
“O primeiro contato se deu por meio de um parente de Adélio, que fora aluno de Zanone e telefonou para ele. A questão do pagamento será combinada depois”, declarou, criando nova dúvida sobre o contato inicial para contratação dos serviços e o pagamento dos honorários.
Zanone Manuel de Oliveira Júnior
“A pessoa falou que tem conhecimento com a família e com o pessoal da igreja e que tinha gente lá conversando se iam ou não fazer uma vaquinha para financiar”, disse, em entrevista ao jornal O Globo, novamente adicionando imprecisão à narrativa.