A leitura da Bíblia Sagrada nas escolas, antes do início das aulas, é o centro de um projeto de lei aprovado pela Câmara Municipal de Teresina (PI) e sancionado pelo prefeito José Pessoa Leal (MDB). Em resposta, ativistas ateus foram à Justiça para impedir que a medida seja colocada em prática.
Em resumo, a lei prevê que nas escolas da capital piauiense que aderirem ao projeto, os alunos serão obrigados a lerem trechos da Bíblia tão logo entrem na sala de aula. A vigência começou no dia 01 de março, junto com o ano letivo, mas é facultativa: caso diretores e/ou proprietários de escolas decidam não aderir, os alunos ficam desobrigados.
Entretanto, a Associação Brasileira de Ateus e Agnósticos do Brasil (ATEA) decidiu entrar com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) no Tribunal de Justiça do Piauí contra a medida, apelidada de “lei da Bíblia”. Os ativistas argumentam que a lei municipal ofende a laicidade do Estado.
O advogado da ATEA, Thales Bouchaton, considera que há privilégios à religião cristã, mesmo com a lei sendo facultativa: “O Estado deve ser neutro em matéria religiosa. A título de exemplificação, qual seria a reação dos cristãos, por exemplo, se uma lei facultasse a realização de leituras de livros satanistas, cultos umbandistas ou se algum professor alinhasse os alunos e pregasse contra a existência de Deus?”, questionou ele.
De acordo com informações do portal Uol, o advogado da ATEA entende que a “lei da Bíblia” torna o preconceito e a exclusão de minorias religiosas oficiais: “O Estado brasileiro, em todos os níveis, federal, estadual e municipal, conforme a Constituição, é laico. O poder municipal não pode privilegiar nenhuma crença. Isso fere a Carta Magna e os princípios de igualdade que norteiam uma sociedade democrática, inclusiva e que respeita a liberdade de crença”, pontuou.
A tramitação do projeto começou em 2020, através dos vereadores Fábio Dourado (SD) e Gustavo Carvalho (PSDB). Na justificativa do texto, argumentam que a leitura de versículos proporciona “o conhecimento cultural e os fatos históricos bíblicos”.
Tarciana Freire, 44 anos, umbandista e mãe de uma aluna de 13 anos, considera a “lei da Bíblia” uma forma de discriminação: “Já que faculta as escolas, a lei deve facultar também o direito de minha filha sair da sala de aula durante a leitura da Bíblia. Esse projeto é discriminatório e privilegia as religiões católicas e evangélica, gerando mais conflitos”, avaliou.
Marcelo Siqueira, presidente do Sindicato dos Estabelecimentos de Ensino do Estado do Piauí, rebateu as críticas dos ativistas ateus, lembrando que existe jurisprudência garantindo às escolas a liberdade para adotar o ensino religioso: “É importante que o pai leia o projeto pedagógico da escola que vai matricular o filho e esteja de acordo com as atividades que são desenvolvidas”.
Outras cidades
Vereadores têm tomado iniciativa semelhantes, o que deve resultar, em breve, numa batalha judicial. Na cidade de Ilhéus (BA), um projeto aprovado na Câmara obriga os estudantes a fazerem a oração do “Pai nosso”, por exemplo.
Uma lei que obrigava os alunos das escolas públicas de Xangrilá (RS) a lerem a Bíblia Sagrada foi suspensa pela juíza Adria Josiane Müller Gonçalves Atz, da 3ª Vara Cível da comarca de Capão da Canoa.