Um dos bispos rebeldes da Igreja Universal do Reino de Deus em Angola afirmou que os casos de racismo envolvendo parte da liderança brasileira da instituição se tornaram insustentáveis. O bispo Felner Batalha acusou, diretamente, o bispo Edir Macedo de comparar os traços físicos de negros a gorilas e macacos.
Batalha é assessor para os assuntos eclesiásticos e institucionais do bispo Valente Luís Bezerra, o líder do movimento rebelde que assumiu o controle de templos da Igreja Universal em 15 das 18 províncias de Angola. Ele concedeu entrevista dizendo que o movimento de tomada de controle foi um basta ao que a comunidade considerou intolerável.
“A reforma é a expressão da vontade dos membros, obreiros, pastores e bispos da igreja em Angola, que querem mudanças profundas no seio da instituição”, disse Batalha em entrevista à Agência Pública.
Em janeiro de 2018, quando enviou uma carta ao bispo Edir Macedo relatando problemas da instituição em Angola e questionando as medidas necessárias para reverter o cenário, Batalha recebeu como resposta seu afastamento do corpo de bispos. “É triste porque os problemas que hoje a igreja vive cá em Angola e um pouco por todo o mundo são de conhecimento do bispo Macedo, e, no nosso entender, ele poderia resolver isso de forma pacífica, corrigir as coisas que estão mal na igreja”, avaliou.
O movimento rebelde acusa parte dos brasileiros que compõem a diretoria de cometerem “crimes contra direitos humanos, crimes financeiros e, mais especificamente, evasão de divisas e branqueamento de capitais [lavagem de dinheiro]”, enfatiza Felner Batalha.
“Nós, como instituição religiosa, não podemos compactuar com esse tipo de atos de violação de direitos humanos e crimes financeiros. Queremos que a igreja, aqui em Angola, fique livre desse tipo de práticas”, acrescentou o representante do movimento rebelde.
Racismo
“A maior parte dos atos, seja de racismo ou outros crimes denunciados, não foi cometida pelos brasileiros em geral, e sim por um grupo específico, ligado à liderança brasileira, que fique bem claro”, frisou Batalha.
O relato feito pelo bispo envolve a comparação de negros com animais: “Um exemplo concreto da discriminação racial que presenciamos ocorreu na pessoa do próprio bispo Macedo, em uma das conferências que fez com Angola, direcionada só para Angola. Ele defendeu uma teoria de que os negros tinham lábios grossos e nariz avantajados porque nossas antepassadas que viviam nas florestas e bosques, as mães, quando estavam no estado de gestação, olhavam para gorilas e macacos na selva e, por conta disso, seus filhos nasciam com as características desses animais”, alegou.
“Eu e todo os pastores presentes nesta videoconferência somos testemunhas. Eu fui um dos interlocutores que questionei o bispo a respeito dessa teoria. Isso ocorreu em janeiro de 2018”, garantiu Batalha.
“Há outros casos, como de falarem que ‘os africanos cheiram mal’. Há uma frase que foi dita por um dos pastores ligados à cúpula da igreja em Angola, o Luís Gonçalves, sobrinho do bispo Honorilton Gonçalves. Ele disse: ‘Não se deve dar pérolas aos porcos’, referindo-se a um condomínio pastoral onde moram pastores. Ele defendia que esse condomínio não deveria continuar com a igreja porque, em outras palavras, tinha muito conforto para porcos. São claras declarações de racismo”, reiterou o bispo.
Felner Batalha diz que Honorilton Gonçalves reagiu aos questionamentos iniciados em 2019 com racismo: Quando já tinha se iniciado o movimento de reforma, numa reunião em que só havia cidadãos brasileiros, disse: ‘Eu prefiro morrer do que perder essa causa para um negro’. Ele se referia ao bispo Valente Luís Bezerra”.
Por fim, os rebeldes consideram que a situação da Igreja Universal em Angola está decidida: “A reforma é irreversível porque está oficializada com a publicação da ata que destituiu a anterior direção, inclusive o bispo Honorilton Gonçalves. E que também elegeu o bispo Valente como coordenador da comissão de reforma. Isso está publicado no Diário Oficial, certificado pelo Ministério da Justiça de Angola. Os passos que dão cunho jurídico legal foram tomados e a reforma é irreversível”.