O livro Aparelho Sexual e Cia apresentado à maioria do público brasileiro por Jair Bolsonaro (PSL) durante sua entrevista ao Jornal Nacional, da TV Globo, vem causando uma enorme discussão na sociedade. O pastor e escritor David Riker aproveitou a comoção em torno do tema e publicou um vídeo com uma análise do conteúdo do livro que é visto como um material de erotização infantil.
Riker, que é pastor da Igreja Missionária da Amazônia (IBMA) e líder do Ministério Ser, contextualiza o material apresentado no livro que estimula a descoberta sexual precoce e, de quebra, com alto grau de sutileza, derruba a autoridade familiar sobre questões ligadas à sexualidade.
“O livro diz assim: ‘É um guia inusitado para crianças descoladas’. Aí já tem um problema, irmão. Como é que o livro, que é para criança, só que ‘descolada’… O que é uma criança ‘descolada’? Uma criança que está na agenda, rumando à revolução da agenda de desconstrução da família tradicional”, introduziu o pastor.
“A primeira contradição do livro é a seguinte […] O índice diz que é para adolescentes […] na capa diz que é para crianças”, apontou Riker, que questionou: “O que será que há de inusitado? E, inusitado para que tipo de criança?”.
“Eu queria fazer algumas considerações, apontar algumas questões no livro… Antes de falar nisso, veja, há quem diga que esse livro nunca foi cogitado para estar na escola pública. Veja, se o MEC admitir a existência do tal do ‘kit gay’ – que na verdade, vale-se dizer, é apenas um apelido que foi dado a um conjunto de materiais que havia sido indicado como bibliografia para as escolas do Brasil – era melhor fechar a bodega”, comentou, fazendo referência à polêmica suscitada após a entrevista do candidato à presidência pelo PSL.
“O MEC bolivariano das antigas certamente tinha uma agenda ideológica que em muitos aspectos confronta a ética e os princípios morais do povo brasileiro, que para desespero de muitos intelectuais de esquerda, é, em sua maioria, conservador e cristão”, pontuou o pastor, aludindo ao período em que o Ministério da Educação esteve sob a administração do Partido dos Trabalhadores.
No livro, segundo David Riker, há estímulo para que as crianças aceitem o que se define como “mulher objeto”, assim como à compreensão de que não haveria barreiras de idade para a prática sexual.
“Esse livro, em primeiro lugar, logo no início fala que o menino tem que ser um menino que vá atrás das mulheres, que conquiste as mulheres, [traz] dicas de paqueras, e coloca o estereótipo do menino meio safadinho, menino meio ‘pra frente’, sabe? Um menino que vai objetificando o corpo feminino”, lamentou Riker. “Sempre você tem [ilustrações de meninos] olhando para a bunda das mulheres, pelo na genitália da mulher… Então é sempre esse menino atrevidinho”.
“A educação brasileira é ‘paulo-freiriana’. Ele [Paulo Freire], pensa a educação de cidadãos engajados politicamente, e aí, quando fala em sexualidade, você precisa sempre ’empoderar’ as minorias, e ‘desconstruir a heteronormatividade’, a norma, porque ‘a norma não existe porque é natural, ela existe porque como [o filósofo Michel] Foucault nos ensinou, é tudo um complô dos conservadores judaico-cristãos que querem controlar os nossos corpos e querem nos oprimir dizendo que a humanidade é hétero dependente'”, criticou, com dose concentrada de sarcasmo.
Distorções
Um desvio de realidade apontado na análise do pastor está na abordagem sobre o que é a descoberta da sexualidade: “Quando [o livro] fala de puberdade […] [coloca a] sexualidade como a grande questão da puberdade. Então, é um livro que acaba confundindo sexualidade – que é uma dimensão ampla de afeto, de desejo e prazer, de relacionamentos – com o ato sexual em si”.
A abordagem da homossexualidade também é feita de forma a levar à compreensão de que a atividade sexual entre pessoas do mesmo sexo não é algo diferente da relação entre pessoas de sexos opostos.
“Ele começa a ensinar, então, que menino gostar de outro menino… e ele pergunta: ‘O que é normal? Todo mundo se faz essa pergunta e vai encontrar a resposta sabe onde? Ouvindo o seu coração’. O livro não tem nenhuma menção à ética familiar. O adolescente e as crianças ‘descoladas’ [termina por sugerir que] ela [criança] não está sob a tutela dos pais, não deve conversar com seus pais a partir das suas crenças, da sua história, das suas tradições, porque essas coisas são demonizadas [no livro]”, constatou o pastor.
“Qual é a resposta? O que é puro na revolução? ‘É o coração, é você olhar para o seu coração e se autodeterminar, porque não há propósito que anteceda sua existência’. Veja, isso tudo é um viés filosófico com o qual a maioria da população brasileira certamente não concorda”, enfatizou.
Ao longo do vídeo, Riker refuta os argumentos que apontam o Estado laico como uma barreira para a objeção a partir de princípios e valores oriundos da religião: “A laicidade significa, teoricamente, que eu não posso impor a você o que eu creio, mas também você não pode desconstruir sistematicamente aquilo que a maioria da população crê. A laicidade coloca um limite para ambos”, frisou.
Beijo e sexo
No livro, há uma espécie de tutorial para crianças sobre como proceder em seu primeiro “beijo de língua”. O pastor leu as orientações e comentou que até as coisas mais simples são alvo de uma obsessão do livro em guiar os pequenos leitores: “São coisas que se aprende naturalmente, irmão, mas a galera tá querendo padronizar cartesianamente o beijo de língua para ‘crianças descoladas'”, alertou.
O estímulo ao sexo surge de forma clara e objetiva a certa altura do polêmico livro: “‘Como a gente sabe que está à fim de transar? O corpo é que decide’. ‘No dia que você estiver pronto para transar, você sente isso no corpo todo’. Quer dizer, é um cio, né? Uma cadela e um cachorro. Olha que ‘legal’, né? […] Aí aparece uma primeira imagem, do pessoal olhando enquanto um casal transa”, disse o pastor, externando indignação.
Mais à frente, o livro “mostra um rapaz maior […] parece um pedófilo […] querendo mostrar uma sacanagem para a ‘criança descolada’, que realmente está desprotegida”, e o pastor encerra a análise com uma constatação: “Em resumo: o livro é ruim. Independente se foi ou não para a escola”, finalizou. Assista: