Uma nova série de acusações envolvendo abusos sexuais no meio evangélico surgiu na última semana. O acusado é o pastor Fadi Faraj, da Comunidade Cristã Ministério da Fé, em Taguatinga (DF).
Faraj, que é segundo suplente do senador José Antônio Machado Reguffe (PODE-DF), teria abusado sexualmente de quatro mulheres, entre 2005 e 2010. Uma das supostas vítimas afirmou que foi convencida a fazer sexo com o pastor semanalmente, por aproximadamente dois anos, sob a alegação de que esses encontros fariam parte de um processo de libertação de uma maldição profunda.
O assunto vem sendo investigado sob sigilo pelo Ministério Público do Distrito Federal (MPDF), após as acusações terem chegado ao Conselho de Pastores da região. Os portais O Livre e Metrópoles obtiveram acesso ao vídeo com o depoimento prestado em 2009 por essa vítima e seu relato dos encontros com o pastor Fadi Faraj.
A mulher teria tido o primeiro encontro com o pastor em seu gabinete, no templo da igreja, pois buscava orientação e ajuda para superar uma grave crise financeira. O ano era 2005 e ela frequentava a igreja Ministério da Fé há três. Ao pastor, ela disse ter contado que era mãe solteira e que vivia com sua mãe, viúva, seu filho e seus irmãos.
Sua mãe a acompanhou na primeira reunião, que foi feita separadamente com cada uma delas. As duas teriam saído com uma ficha para ser preenchida e, a partir das respostas, o pastor supostamente seria capaz de identificar a necessidade de um “ritual de quebra de maldição”.
Os autores da reportagem no portal O Livre enfatizam que quando essa mulher voltou à igreja com a ficha preenchida, ela teria aproveitado a oportunidade para contar ao pastor “que uma tia sua já havia passado por um procedimento para ‘expulsão de demônios’”, e que diante disso, Fadi Faraj teria dito que iria estudar o caso. Segundo a mulher, ele a informou, tempos depois, que o caso dela seria semelhante ao de sua tia.
Abusos
“Renata passou a ter que frequentar o gabinete de Fadi Faraj todas as semanas. Os encontros, segundo seu depoimento ao conselho de pastores, ocorriam às terças ou quintas-feiras, sempre depois do almoço. Nessas ocasiões, Faraj ‘orava’ pela moça. Mas não só isso. Segundo ela, aproveitava para tocar seus seios e outras partes do corpo, inclusive as mais íntimas. O argumento era sempre o mesmo: a maldição era ‘profunda’, precisava de um tratamento especial”, diz a matéria assinada pelos jornalistas Laura Nabuco e Orlando Morais Jr.
“Ele orou e começou a tocar meu corpo. Tocou meus seios. Depois, as partes mais íntimas. Disse que toda minha família ia ser libertada, que o problema estava em mim. Quando ocorreu a primeira relação dentro do gabinete, ele disse que o tratamento tinha que ser profundo, porque o demônio estava dentro de mim”, diz a moça no vídeo.
Esses supostos encontros, que teriam sido realizados sob o pretexto de exorcizar o mal entre 2005 e 2007, passaram a ocorrer em motéis. Os abusos, segundo a denúncia, aconteciam após o almoço, às terças e às quintas-feiras. De acordo com a mulher, Fadi a ajudava com o pagamento da escola para concluir os estudos e contribuía com quantias entre R$ 100 e R$ 200 quando eles se encontravam, entregues sob a alegação de que ajudariam a manter as contas da família em dia.
No vídeo, a mulher diz que na primeira vez que o encontro ocorreu num motel, o pastor teria dito que ela não deveria nutrir sentimentos por ele, já que era um homem casado e não tinha intenções de trocar sua esposa por ela. Diante disso, a mulher teria respondido que estava apenas buscando “ser liberta”. Aos pastores do Conselho que iniciou a investigação, ela disse que se submetia a essa situação por medo de ser possuída por demônios e ter sua família destruída.
Em uma ocasião, o pastor Faraj teria sugerido a presença de uma prostituta no motel, para que a sessão de quebra de maldição fosse mais eficaz, porém a mulher alega que recusou a proposta.
Os encontros foram se tornando gradualmente escassos, quando finalmente deixaram de ocorrer. A mãe da suposta vítima também prestou depoimento ao Conselho de Pastores e relatou que decidiu compartilhar com a filha sua experiência de “quebra de maldição”, feita por outro pastor da mesma igreja. Dessa forma, a vítima teria ficado intrigada e decidido confrontar Faraj sobre os motivos de ela ter sido “tratada” de forma diferente, e ele respondeu que seu caso era mais “profundo” e precisava de medidas mais drásticas.
“Santa”
Quando os rituais cessaram, a mulher ficou noiva de um rapaz que tinha cargo dentro da mesma congregação da Comunidade Cristã Ministério Fé. Ao saber disso, Fadi Faraj teria passado a “apressá-la” para que o casamento fosse marcado.
No vídeo, o então noivo da mulher conta que sabia que ela tinha reuniões frequentes com o pastor, mas a informação que circulava entre a liderança da igreja era que Faraj se dedicava a ajudá-la superar problemas emocionais, e como o teor das supostas conversas eram mantidos em segredo, ele respeitava isso.
Entretanto, a mulher passou a ter problemas psicológicos reais que refletiam em sintomas físicos, e diversas vezes ela precisou ser atendida em hospitais da região. A certa altura, ela decidiu contar ao noivo o que tinha ocorrido com ela ao longo de dois anos, e ele decidiu relatar ao presbitério da igreja toda a situação.
Na conversa, com outros dois pastores da igreja (um deles seria cunhado de Faraj), o noivo ouviu que a mulher tinha se comportado como prostituta, já que por ser mãe solteira, sabia que estava se tratava de sexo e por isso não era “santa” na história.
A partir desse ponto, o caso se tornou de amplo conhecimento, e a mulher, seu noivo e sua família foram expostos perante os demais fiéis, e por isso, eles deixaram de frequentar a igreja. Os amigos pessoais da vítima teriam incentivado que ela procurasse a Justiça, mas ela sempre respondia que preferia aguardar a “justiça divina”. Hoje, aos 34 anos, ela está casada e trabalha em uma loja.
O procedimento de investigação foi aberto no Ministério Público a partir de uma denúncia feita na Ouvidoria do órgão, e os depoimentos sobre o caso começaram a ser colhidos na última sexta-feira, 18 de outubro.
Outras vítimas
Histórias parecidas foram relatadas por outras três mulheres, que disseram que teriam sido abusadas pelo pastor dentro de seu gabinete, na igreja. Elas relatam que ao contarem a Fadi Faraj que estavam passando por problemas, ele as convidava para sua sala e, durante as orações, teriam sido “apalpadas”.
“Estava em um culto na igreja quando o pastor me chamou para uma sala reservada. Começou fazendo uma oração com as mãos na minha cabeça, depois pegou nos meus seios, dizendo suspeitar de uma doença. Após isso, desceu a mão para minhas partes íntimas. Saí transtornada. Nunca mais voltei à igreja”, disse uma das mulheres nas denúncias ao MPDFT.
Todas elas, segundo informações do Metrópoles, teriam recebido oferta de dinheiro, com valores viajando entre R$ 300 e R$ 500 para que mantivessem relações sexuais.
Passado
Fadi Faraj e sua irmã, a ex-deputada distrital Sandra Faraj, foram investigados em 2017 no âmbito da Operação Heméra (deusa grega da mentira), que apurava um esquema de uso irregular de verba indenizatória, além da suposta cobrança de parte dos salários de servidores comissionados nomeados pela parlamentar – ou por indicação dela e do irmão – na estrutura do Governo do Distrito Federal (GDF) e da Câmara Legislativa. Porém, o caso foi arquivado pela Justiça.
Procurado pelo portal de notícias Metrópoles, o pastor Fadi Faraj disse que as acusações “são um absurdo, uma mentira” e que estava surpreso: “Meu Deus, não sabia dessas acusações. Só Deus vai saber por que estão fazendo isso contra mim”, disse.
O Gospel+ também entrou em contato com o pastor, e está aguardando uma posição oficial para abrir espaço para sua versão dos fatos.