Em uma carta, o PT fala que a montagem de núcleos evangélicos nos estados tem como objetivo ajudar esse segmento a “ler e interpretar” a Bíblia Sagrada e facilitar o convencimento dos fiéis na tentativa de voltar ao poder.
O movimento chamado “lulopetismo”, cunhado para se referir aos seguidores do ex-presidente Lula e seu partido, começa a assumir contornos do comunismo contemporâneo que governa a China atualmente.
A carta diz que esses núcleos têm por objetivo “contribuir na construção de modos de leitura e de interpretação da Bíblia, a Palavra de Deus, que nos capacitem para atuarmos, conforme a sabedoria do Espírito e os ensinamentos de Cristo, desenvolvendo práticas libertárias, inclusivas e plurais em nossas comunidades de fé e no mundo”.
A iniciativa do PT em busca de reconquistar os votos dos evangélicos – nas eleições presidenciais 2018, estima-se que Jair Bolsonaro tenha recebido 69% dos votos dos fiéis – se assemelha com a imposta pelo regime chinês presidido por Xi Jinping, que tem alterado características de personagens bíblicos para distorcer o cristianismo e se afeiçoar ao comunismo.
Embora o PT – ainda – não proponha a alteração do conteúdo das Escrituras, a postura pedante de militantes que não comungam da fé em se propor a dizer como um fiel a Jesus Cristo deve ler e interpretar o que diz a Palavra de Deus, tem o mesmo efeito: tornar as mentes dóceis à visão política do partido e sua ideologia.
Segundo informações do portal Gazeta do Povo, o partido já conta com núcleos evangélicos em 18 estados brasileiros, que deverão ser alvo de um esforço de ampliação para outras unidades da federação, a fim de ensinar o público evangélico a “ler e interpretar” seu livro sagrado.
Nas eleições 2018, o programa de governo apresentado pelo partido previa um movimento agressivo contra o que, na visão de seus militantes, caracterizava o “obscurantismo” presente na ala conservadora da sociedade, formada em sua maior parte, por cristãos das duas principais tradições, católicos e evangélicos.
Por vezes, evangélicos foram referidos nos discursos petistas – e de seus aliados, como o PSOL, por exemplo – como “fundamentalistas” que impediam a descriminalização do aborto e das drogas, temas que, conforme previsto no programa de governo, seriam tratados de forma objetiva numa eventual gestã0 de Fernando Haddad, adversário de Bolsonaro derrotado no segundo turno.
Progressismo
Ao longo dos treze anos em que se manteve à frente do Palácio do Planalto, o PT incentivou discussões com vistas à legalização do aborto e drogas, além da famosa cartilha elaborada pelo Ministério da Educação enquanto Haddad era ministro, chamada oficialmente “Escola Sem Homofobia” e tratada popularmente como “kit gay” – projeto agora renegado pelo partido.
Na última campanha presidencial, Haddad assinou seu compromisso com a “Plataforma LGBTI+ Eleições 2018”, que previa implementar uma Política LGBTI+, “em consonância com as deliberações das 1ª, 2ª e 3ª Conferências Estaduais e Nacional LGBT, com as devidas atualizações”.
“No ensino fundamental, serão realizados fortes ajustes na Base Nacional Comum Curricular, em diálogo com a sociedade, para retirar as imposições obscurantistas”, dizia o plano de governo apresentado para o pleito.
Após a derrota na eleição, a presidente do partido, a deputada federal Gleisi Hoffmann chama de “fake news” as notícias que tentam vincular o partido a esses temas e garante que não há conflito entre a pauta do PT e os costumes mais conservadores vivenciados pela população evangélica.
Para Gleisi, nem temas como aborto, legalização de drogas e união homoafetiva e ideologia de gênero colocam o PT em posição oposta aos valores evangélicos:
“A pauta de costumes nunca foi a pauta central do partido. Existimos para defender o povo brasileiro, os trabalhadores e as trabalhadoras. Dentro da defesa dos trabalhadores, defendemos os direitos das mulheres, a igualdade, lutamos contra a violência. Mas nunca tivemos, programaticamente, a defesa do aborto dentro do PT, por exemplo”, declarou.
“A questão racial é importante para nós, porque, entre os trabalhadores, são os negros que sofrem mais. E a questão homossexual é questão de respeito às pessoas. Nossas ações não são de incentivo, não há cotas, nossas ações são de respeito. Não admitimos que uma pessoa sofra violência ou preconceito por conta da orientação sexual. E isso os cristãos também têm que combater”, acrescentou, já indicando que o PT pretende dizer o que deve ser o foco do segmento evangélico.
“Os evangélicos criticam que há uma exacerbação deste lado, um incentivo. Nunca fizemos isso, apenas defendemos o direito das pessoas, a diversidade, isso é fundamental”, reiterou Gleisi Hoffmann, negando, por exemplo, a proposta feita pelo programa de governo do partido que previa uma ação chamada Transcidadania, que consistia em um incentivo estatal na forma de “bolsa de estudos a pessoas travestis e transexuais em situação de vulnerabilidade”.
Ao longo de seus mandatos, Dilma Rousseff (PT) abriu espaço e incentivou a discussão em torno da legalização do aborto, mas Gleisi nega: “Nunca tivemos programaticamente a defesa do aborto no PT. Não tem no nosso programa, não tem em decisão do nosso congresso partidário. Tem pessoas dentro do partido que defendem. Assim como tem outras que não defendem. Eu não defendo. Aborto é uma questão de saúde pública e tem que ser tratada nesse limite. O que quero dizer é que não há essa linha democrática. Isso não é fundante para nós, não é linha, mas respeitamos quem defende, como na sociedade brasileira”.
Comunismo
A aproximação do discurso petista com o teor comunista não se resume à intenção do partido em dizer como os evangélicos devem “ler e interpretar” a Bíblia.
Antes de o Supremo Tribunal Federal (STF) barrar a candidatura do condenado Lula – à época preso por corrupção e lavagem de dinheiro num processo julgado em segunda instância -, seu programa de governo adotava tom autoritário, com propostas claras de controle da mídia, reiterado apoio ao aborto e ideologia de gênero, legalização das drogas, nova constituição e intervenção externa na Justiça.
A imprensa livre, um dos maiores incômodos de Lula desde sua primeira passagem pelo Palácio do Planalto já que à época, fez propostas para a criação de um “controle social da mídia”, seria alvo, num eventual governo petista, de “um órgão regulador com composição plural e supervisão da sociedade”, conforme previsto no plano de governo que, posteriormente, foi adotado por Haddad.
A ideia de uma nova Constituição também trouxe o fantasma de uma relativização da liberdade de crença e culto em favor de ideais progressistas. Esse tipo de mudança na legislação realizada em governos de esquerda na Venezuela e Bolívia, por exemplo, serviu para impor a perpetuação da visão de esquerda no poder.
O texto do programa de governo de Lula e Haddad previa, ainda, o fim da divisão existente atualmente no Poder Legislativo: Câmara dos Deputados e Senado. No modelo atual, as duas casas são independentes e servem para que o texto aprovado em uma, seja revisado na outra. A ideia de um Legislativo “unicameral” foi implementada na Venezuela, que hoje vive a ditadura de esquerda iniciada por Hugo Chávez e mantida por Nicolás Maduro.
A desconfiança se justifica em uma afirmação do próprio partido no documento de 2018: “A refundação democrática liderada por Lula implicará mudanças estruturais do Estado e da sociedade para restabelecer o equilíbrio entre os Poderes da República”.
A radicalização da postura, com suavização do discurso caracterizada na atual proposta de “reaproximação dos evangélicos, foi sinalizada na campanha de 2018, ainda na ressaca do impeachment que cassou o mandato de Dilma, já que o PT falava em exercer uma espécie de tutela sobre o povo, com o plano de governo indicando que o partido promoveria a “qualificação da democracia” a partir de programas e ações sociais: “Lula promoverá de maneira inequívoca a universalidade, integralidade e intersetorialidade dos direitos humanos […] a democratização do poder político e qualificação da democracia”.
Na carta de janeiro de 2020, o PT diz que os núcleos evangélicos proporão formas de “ler e interpretar a Bíblia”, e Gleisi já ensaia essa tutela: “O evangelho é tratar os pobres, ter solidariedade, não ter preconceito. Cristo andava com as prostitutas, com os pecadores. ‘Repartir o pão’ – os pobres em primeiro lugar. Se pegar o evangelho, qualquer um vê que é muito mais próximo com o programa do PT do que com o que a direita prega. Cristo nunca estimulou o preconceito ou a violência”, concluiu.