A liberdade religiosa no Brasil está em jogo, e o principal adversário da consolidação desse direito constitucional é o Supremo Tribunal Federal (STF). Essa visão é do advogado e doutor em Direito pela PUC-SP, Marcelo Azevedo.
A atuação dos ministros do STF vem, aos poucos, minando a inviolabilidade do direito à crença, exacerbando o conceito de laicidade do Estado. “O papel iluminista da Suprema Corte, que alguns ministros defendem, é uma burla à democracia e, talvez, o maior perigoso à liberdade religiosa no Brasil”, alertou.
Azevedo afirma que uma compreensão equivocada sobre o Estado laico surgiu e vem ganhando força nos últimos anos com decisões da Justiça, em esferas menores, no sentido de banir as religiões da esfera pública, como por exemplo, a remoção de símbolos cristãos de espaços públicos.
“A Constituição reconhece, prestigia e protege a dimensão espiritual, porque entende que religião é indispensável para a formação integral da pessoa humana”, ponderou o doutor em Direito. “A Constituição federal consagra a visão de que existem duas ordens autônomas, independentes e soberanas, a ordem temporal e a ordem espiritual. Segundo esta ótica, o Estado não deve interferir na ordem espiritual”, acrescentou.
O princípio de liberdade religiosa, segundo Azevedo, deve alcançar todos os grupos, incluindo ateus e agnósticos, que são protegidos em seu direito de não crer, mas sem se sobrepor ao direito de quem tem fé. E o que tem acontecido é exatamente isso: a limitação do exercício da fé em nome da ausência dela.
Ameaça
O relatório “Últimas Tendências em Restrições e Hostilidades Religiosas”, produzido pelo Pew Research Center, com dados de 198 países, atualizados até 2014, mostra que o Brasil está na lista dos países onde há violência e intimidação como forma de limitar o exercício da fé.
Os critérios do instituto de pesquisa para chegar a essa conclusão são os registros de crimes, como danos à propriedade privada, violência entre diferentes grupos sociais, mudança forçada de endereço para escapar de ódio religioso, intimidação e assédio.
Outro documento, com dados de 2016, produzido pela Fundação Ajuda à Igreja Que Sofre, mostra que houve aumento no relato de violações de Direitos Humanos no Disque 100, serviço de denúncias anônimas, segundo informações do jornal A Gazeta do Povo.
Ao todo, foram registrados 543 casos, sendo que em 216 houve menção à religião da vítima; 35% dos casos foram contra praticantes do candomblé e umbanda; 27% contra evangélicos; 12% contra espíritas; 10% contra católicos; 4% contra ateus; 3% contra judeus; 2% contra muçulmanos; e 7% contra adeptos de outras religiões.
Azevedo ressalta que o perigo, em relação à postura do Estado no assunto, está na intromissão nas questões religiosas, como a tentativa de incluir princípios religiosos em leis que combatem a homofobia, de forma a limitar o exercício pleno da crença, e também na proposta de proibição da participação de líderes religiosos na política e demais discussões públicas, uma tentativa de impor que a experiência religiosa seja restrita ao ambiente privado.