Um grupo de jovens se juntou há quatro anos em Umuarama-PR por dois motivos: eram fiéis mas não eram aceitos em suas igrejas devido a orientação sexual. Atualmente eles formam a Igreja da Comunidade Metropolitana (ICM) Águas da Vida.
O intuito da igreja é acolher, principalmente, a comunidade de Gays, Lésbicas, Bissexuais e Transexuais (GLBT), mas também simpatizantes, sempre com base bíblica. Além dos cultos, a ICM tem um forte trabalho pastoral e está disposta a crescer cada vez mais em Umuarama.
O pastor, Célio Camargo dos Santos, conta que freqüentava outras igrejas. Nasceu no berço católico e depois entrou para a igreja evangélica. Mas por conta da sua homossexualidade assumida desde muito pequeno, ele e outros amigos e amigas não escaparam do preconceito de algumas instituições religiosas.
Eles se juntavam semanalmente em suas casas para ler a bíblia, orar e louvar a Deus, sob o pensamento de que “Deus não faz acepção de pessoas” (Ato dos Apóstolos 10:34).
Neste grupo, com base em textos da bíblia, os integrantes descobriam e discutiam que o homossexual não é condenado por Deus como muitas religiões fazem e que Jesus veio para salvar ao ser humano sem que sua sexualidade influenciasse nessa salvação.
Logo em seguida, Célio descobriu a ICM e como já possuía curso de teologia numa igreja neopentecostal, foi mais fácil trazê-la para Umuarama. A igreja na cidade é uma comunidade totalmente ecumênica e não há sincretismo. “Embora eu sempre fui evangélico, mas com o coração mariano”, conta.
A ICM é aberta a todas as religiões e pessoas, o que justifica, inclusive, que pouco mais da metade dos participantes são heterossexuais, além de haver a presença de católicos, evangélicos, espíritas, que são recebidos sem nenhum problema na igreja. “Todos se reúnem para juntos adorarem a deus, num espaço sem preconceito e que luta contra a homofobia”.
Cada igreja ICM tem uma característica própria, criada de acordo com a realidade local, sempre tendo como base, a bíblia. Embora haja um ritual eucarístico, também há louvores da religião evangélica e todos podem tomar a ceia, desde crianças até visitantes.
No início, outras denominações religiosas faziam várias perseguições indiretas, alertando os fieis sobre a vinda dessa igreja para Umuarama. Mas atualmente há uma neutralidade quanto a isso.
Por ser homossexual assumido, Célio teve problemas e não conseguiu o diploma da sua formação teológica. Agora ele está estudando outra vez para garantir o diploma e em seguida participar da unção de clérigo, finalizando a sua consagração como pastor.
AUTO PRECONCEITO
Célio conta que o trabalho da igreja que toma frente é, sobretudo, fazer uma purificação dos homossexuais onde eles próprios criaram uma ideia de que são condenados pela igreja e que não existe um local sagrado para eles. “Foi um desafio muito grande, mas estamos crescendo”.
A igreja possuía um salão espaçoso, mas acabou o perdendo por não ter condições de manter. Então os cultos voltaram a ocorrer nas residências. “Isso porque não cobramos dízimo e cada um ajuda quando e quanto pode”, explica. Mas agora a igreja conseguiu um novo salão no Ouro Branco, ao lado do Lago Tucuruvi, que deve acolher os fiéis nas próximas semanas.
Outro passo da igreja é construir um abrigo. Segundo a missionária que ajudou a fundar a ICM com Célio, Zulmira Francisca da Silva, além de pessoas carentes ou em situações vulneráveis diversas, há muitos casais gays e lésbicas expulsos de casa por conta da não aceitação dos pais.
A igreja também tem um trabalho com jovens em bairros e portarias de raves e festas gays, distribuindo folhetos, orientações e preservativos para conscientizar os jovens sobre as doenças sexualmente transmissíveis.
CASAMENTOS
A Igreja da Comunidade Metropolitana celebra a União, Casamento de casais heterossexuais ou homossexuais, através do Rito de Benção de União. O requisito para se receber a bênção é ser um casal que viva numa união estável. Não é necessário ser membro da igreja. “A ICM vê este rito como uma Benção e não um Sacramento, portanto qualquer casal que vive uma união estável e deseja celebrar a Benção é acolhido”, explica Célio. A Igreja possui um Livro de Registro de União, que é assinado pelo casal e pelos padrinhos (testemunhas), ao final da celebração. Também é entregue um Certificado ao casal após o rito. Por enquanto em Umuarama não houve união homossexual, apenas heterossexual.
Um dos casamentos heterossexuais foi de sua irmã, Antônia Margarida, 51, que é deficiente auditiva com outro homem também deficiente auditivo. “Nossa igreja foi criada para acolher a diversidade”, acrescenta.
A igreja está aberta para todos que queiram conhecê-la. Fica na Rua Diamante, 3112, no Jardim Ouro Branco. O telefone é (44)84543115 ou (44)98188242). Os cultos são quartas e domingos, às 20 horas e o atendimento da pastoral acontece todas as terças das 18h ás 21h.
A DIVERSIDADE SEXUAL E A BÍBLIA
Embora Célio conte que o texto mais usado contra os homossexuais é Levítico, onde o Código Sacerdotal ou Código da Santidade afirma: “Não te deitarás com um homem como se fosse mulher. É uma abominação” (Lv 18,22 e Lv 20,13), ele também lembra a história de Ruth e Noemi e de David e Jônatas (2SM, 1:26) “Angustiado estou por ti, meu irmão Jônatas; quão amabilíssimo me eras! Mais maravilhoso me era o teu amor do que o amor das mulheres”. E são muitas as outras passagens bíblicas em que a ICM se apóia para mostrar que Jesus Cristo não disse uma única palavra em relação à homossexualidade e que deus deseja que os homens sejam livres da opressão e da injustiça.
Hoje já se sabe que ser gay ou ser lésbica não é uma opção. Este, segundo o pastor, é mais um mito: as pessoas são gays por opção! Optar significa escolher em ser ou não ser gay. Assim como o heterossexual não escolhe em ser ou não ser heterossexual, o mesmo acontece com o homossexual. Existem vários fatores que determinam esta orientação, que é independe da vontade das pessoas, por isto não é uma opção. O que existe em termos de classificação é a orientação sexual, onde o desejo sexual e afetivo está direcionado para um objeto externo (no caso de homossexuais, mesmo sexo e no de heterossexuais, sexo oposto).
No entanto, Célio lembra que não é por ser algo que não se escolhe, que podem considerar a homossexualidade uma doença, erro que algumas igrejas cometem ao “acolher” homossexuais, mas querendo “curá-los”.
SEXUALIDADE ALÉM DO SEXO
Enquanto, no ramo jurídico, os homossexuais lutam pela união civil na PLC 222 e pela criminalização da homofobia; no âmbito espiritual, a luta de Célio é mostrar para a comunidade LGBT que não precisam se afastar de um ritual religioso por conta da orientação sexual. “Genitalizaram o sexo no pecado e esqueceram que numa relação entre duas pessoas do mesmo sexo também há uma condição social e religiosa”, expõe.
Fonte: O Galileo / Gospel+