A pena de morte é uma medida que encontra apoio em boa parte da sociedade brasileira, mas é uma punição que a Constituição Federal de 1988 veda em cláusula pétrea, que não pode ser mudada. O assunto, no entanto, voltou à tona após o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSC-SP), reeleito com a maior votação da história da Câmara dos Deputados, propor uma “exceção à regra”.
A postura da sociedade brasileira sobre a pena de morte vem mudando ao longo dos anos, com uma considerável maioria se colocando a favor ultimamente. Em 2011, uma pesquisa realizada em todo o país apontou que apenas 46% dos cidadãos eram favoráveis a esse tipo de punição. Sete anos depois, outro levantamento, realizado pelo Datafolha, mostrou que 57% acreditava ser uma medida aceitável para crimes mais graves.
No levantamento divulgado em janeiro deste ano, o grupo religioso mais favorável à pena de morte eram os católicos (63%) e o grupo com maior rejeição eram os ateus (46%). Entre evangélicos, 50% foram favoráveis, contra 45% contrários (4% não souberam responder e 1% se disse indiferente). A pesquisa descobriu que a ideia tinha maioria entre homens (60%) e também entre mulheres (54%).
A Constituição Federal proíbe a instituição da pena de morte no Brasil em uma cláusula pétrea, que está na categoria dos tópicos que não podem ser alterados. No entanto, Eduardo Bolsonaro acredita que há margem na sociedade brasileira para que uma modificação seja feita para que a pena seja aplicada em casos de crimes hediondos e tráfico de drogas.
“Eu sei que é uma cláusula pétrea da Constituição, artigo 5º, etc. Porém, existem exceções. Uma é para o desertor em caso de guerra. Por que não colocar outra exceção para crimes hediondos?”, questionou o deputado, argumentando sobre o tema, em entrevista ao jornal O Globo.
Presidente descarta
Jair Bolsonaro (PSL) usou o Twitter no último domingo, 16 de dezembro, para manifestar sua posição sobre o assunto, uma vez que O Globo afirmou que as declarações de Eduardo marcariam “um retorno dos Bolsonaro a um assunto que eles haviam deixado para trás para tornar a candidatura do pai menos radicalizada”.
Em resposta, o presidente eleito afirmou que o assunto não está em pauta: “Em destaque no Jornal O Globo de hoje informou que, em meu governo, o assunto Pena de Morte será motivo de debate. Além de tratar-se de cláusula pétrea da Constituição, não fez parte de minha campanha. Assunto encerrado antes que tornem isso um dos escarcéus propositais diários”, frisou Jair Bolsonaro.
Cristãos e a pena de morte
O assunto é polêmico e motivo de diversas discordâncias doutrinárias no meio cristão, pois embora a grande maioria dos líderes se posicionem contra a ideia, há passagens bíblicas que permitem uma linha de interpretação favorável à drástica medida.
Em agosto deste ano, o pastor e teólogo Russel Moore, um dos mais influentes líderes evangélicos norte-americanos, publicou um artigo em que diz concordar parcialmente com a postura do papa Francisco contrária à pena de morte, e acrescentou que é preciso prudência sobre o assunto.
Moore, que preside a Comissão de Ética e Liberdade Religiosa – um braço de políticas públicas da Convenção Batista do Sul – afirmou que “em Romanos 13, logo após o apóstolo Paulo ter chamado os cristãos da vingança (12: 14-21), Paulo fala do Estado romano ‘portando a espada’ contra os ‘malfeitores’ pela própria autoridade de Deus (13: 1-5)”.
“Alguns argumentaram (de forma pouco convincente, em minha opinião) que esse ‘porte da espada’ é poder policial, não pena de morte. Mas o poder policial, se armado com armas letais, sempre carrega pelo menos a possibilidade da morte do malfeitor. Se isso é sempre e em todo lugar assassinato, então merece a sanção completa do julgamento moral de Deus”, escreveu o teólogo, pontuando que a pena de morte é cabível, embora não desejável.
“O ladrão na cruz, em seu arrependimento, reconhece que suas ações são de fato merecedoras do castigo que ele estava recebendo, que era a morte, enquanto a execução de Jesus não era merecida e, portanto, injusta (Lucas 23:41)”, acrescentou Moore.
Em suas ponderações, no entanto, Russel Moore afirma que o debate sobre o tema precisa ser mais aprofundado, para que o cristianismo não se torne uma ferramenta de defesa dessa medida e termine por compactuar com injustiças: “Existem, em muitos lugares, sérios problemas com a aplicação da pena de morte. Evidências de DNA descobriram lugares onde pessoas inocentes foram executadas; Isso é imoral e um ato de injustiça pública (Provérbios 17:15). Existem, em muitos lugares, disparidades raciais e econômicas na pena de morte. Tal é uma abominação para um Deus que é imparcial e exige imparcialidade na justiça. Estes são problemas não apenas com a pena de morte, mas com quase todos os aspectos da justiça criminal, incluindo a sentença de prisão”, ponderou.
“Os cristãos podem debater se um Estado deve declarar uma moratória à pena de morte enquanto reforma as práticas injustas de condenação. Os cristãos podem debater se a pena de morte é eficaz como dissuasor ou se a pena de morte é significativa em um mundo em que os sistemas jurídicos atrasam por anos a aplicação da pena. Estes são debates prudenciais sobre a melhor forma de ordenar nossos sistemas políticos, e não debates sobre se todo ato de assassinato estatal é assassinato e, portanto, imoral e injusto”, finalizou o teólogo.