Circunstâncias como a que envolve a tragédia de Brumadinho (MG) sempre suscitam críticas ao conceito pregado a partir do Evangelho sobre a soberania de Deus e sua onipotência, onisciência e onipresença. Assim, o reverendo Augustus Nicodemus Lopes, um dos mais populares teólogos brasileiros, comentou o episódio sob essa perspectiva.
“Diante da catástrofe, muitas pessoas são levadas a meditar sobre a presença do mal, do sofrimento e da injustiça no mundo e como isso se harmoniza com a pregação cristã de que há um Deus onipotente e infinitamente bom. Qualquer tentativa de entender as tragédias, desastres, catástrofes e outros males que sobrevêm à humanidade, não pode deixar de levar em consideração três componentes da revelação bíblica, que são a realidade da queda moral e espiritual do homem, o caráter santo e justo de Deus e o sofrimento de Jesus Cristo por nós”, conceituou o pastor presbiteriano.
Recapitular a desobediência de Adão e Eva relatada em Gênesis é essencial para iniciar a compreensão do conceito de “queda moral” da humanidade, diz Lopes: “O texto relata como eles desobedeceram a Deus e decaíram assim do estado de inocência, retidão e pureza em que haviam sido criados. Essa “queda” afetou não somente a Adão e Eva, mas trouxe consequências terríveis a toda a sua descendência. A culpa deles foi imputada por Deus aos seus filhos, e a corrupção de sua natureza foi transmitida por geração ordinária a todos os seus descendentes. Ou seja, a humanidade inteira, sem exceção – visto que não há um único justo, um único que seja inocente e sem pecado – está sujeita ao justo castigo de Deus, o que inclui – atenção! – a morte, as misérias espirituais, temporais (onde se enquadram as tragédias, as calamidades, os desastres, as doenças, o sofrimento) e as misérias espirituais (que a Bíblia chama de morte eterna, inferno, lago de fogo, etc.)”.
Ainda nesse contexto, Lopes enfatiza que “a queda do homem impactou também toda a criação”, pois resultou em maldição: “Deus disse a Adão, ‘maldita é a terra por tua causa; em fadigas obterás dela o sustento durante os dias de tua vida. Ela produzirá também cardos e abrolhos, e tu comerás a erva do campo’ (Gn 3.17-19)”.
“As catástrofes, desastres, calamidades, tragédias, que sejam naturais ou fruto do erro humano, são o resultado de Deus ter amaldiçoado a terra por causa do pecado do homem. Deus permite estas misérias e castigos para despertar a raça humana, para provocar o arrependimento, para refrear o pecado do homem, para incutir-lhe temor de Deus, para desapegar o homem das coisas desta vida e levá-lo a refletir sobre as coisas vindouras”, pontuou o teólogo.
Desastres como esse servem, segundo o pastor, para “nos lembrar que eles ocorrem como parte das misérias e castigos temporais resultantes das nossas culpas, de nossos pecados, como raça pecadora que somos”.
“Poderia ser eu que estava na região quando a barragem se rompeu e levou a todos. Ou, alguém muito melhor e mais reto diante de Deus. Ainda assim, Deus não teria cometido qualquer injustiça, ainda que os que morreram soterrados fossem os melhores homens e mulheres que já pisaram a face da terra. Pois mesmo estes são pecadores. Não existem inocentes diante de Deus”, asseverou.
Em seguida, a reflexão de Lopes recapitula que Deus conhece o sofrimento humano por tê-lo experimentado na pessoa de Jesus: “O Deus justo é também o Deus que sofre conosco. Deus Filho se tornou um de nós pela encarnação no ventre de Maria, e viveu uma vida de sofrimento e dor que terminou com sua morte na cruz. O sofrimento que ele carregou e suportou não era decorrente do pecado, pois nele não havia pecado, nem original nem seu próprio”.
“Ele carregou nossa dor e experimentou nosso sofrimento para que pudéssemos ser justificados dos nossos pecados, perdoados, aceitos por Deus como seu filhos, para nos livrar do sofrimento eterno e recebermos a vida eterna. Deus sabe o que é sofrer. Por isto, podemos encontrar nele respostas e conforto na hora da dor”, aconselhou.
A compreensão de que tais tragédias, na ótica construída a partir do Evangelho, se explicam na maldição decorrente do pecado não significa permanecer alheio ao que ocorre à nossa volta, alertou o pastor: “Nada do que eu disse acima me impede de chorar com os que choram, e sofrer com os que sofrem. Somos membros da mesma raça, e quando um sofre, sofremos com ele. […] Nada do que foi dito acima me impede de pedir justiça e querer que os culpados pelo rompimento da barragem sejam responsabilizados”.
Confira a íntegra do artigo que o reverendo Augustus Nicodemus Lopes publicou em sua página no Facebook:
A TRAGÉDIA DE BRUMADINHO E DEUS
Nosso país ficou chocado com mais uma tragédia em Minas Gerais causada pelo rompimento de mais uma barragem, dessa feita em Brumadinho, a 65 kms de Belo Horizonte. O mar de lama causou a destruição de lares, a perda de centenas de vidas e representa mais um desastre ambiental em nosso país. Diante da catástrofe, muitas pessoas são levadas a meditar sobre a presença do mal, do sofrimento e da injustiça no mundo e como isso se harmoniza com a pregação cristã de que há um Deus onipotente e infinitamente bom. Qualquer tentativa de entender as tragédias, desastres, catástrofes e outros males que sobrevêm à humanidade, não pode deixar de levar em consideração três componentes da revelação bíblica, que são a realidade da queda moral e espiritual do homem, o caráter santo e justo de Deus e o sofrimento de Jesus Cristo por nós.
Lemos em Gênesis 1—3 que Deus criou o homem e a mulher e que os colocou no jardim do Éden, com o mandamento para que não comessem do fruto proibido. O texto relata como eles desobedeceram a Deus e decaíram assim do estado de inocência, retidão e pureza em que haviam sido criados. Essa “queda” afetou não somente a Adão e Eva, mas trouxe consequências terríveis a toda a sua descendência. A culpa deles foi imputada por Deus aos seus filhos, e a corrupção de sua natureza foi transmitida por geração ordinária a todos os seus descendentes. Ou seja, a humanidade inteira, sem exceção – visto que não há um único justo, um único que seja inocente e sem pecado – está sujeita ao justo castigo de Deus, o que inclui – atenção! – a morte, as misérias espirituais, temporais (onde se enquadram as tragédias, as calamidades, os desastres, as doenças, o sofrimento) e as misérias espirituais (que a Bíblia chama de morte eterna, inferno, lago de fogo, etc.).
A queda do homem impactou também toda a criação. Deus disse a Adão, “maldita é a terra por tua causa; em fadigas obterás dela o sustento durante os dias de tua vida. Ela produzirá também cardos e abrolhos, e tu comerás a erva do campo” (Gn 3.17-19). As catástrofes, desastres, calamidades, tragédias, que sejam naturais ou fruto do erro humano, são o resultado de Deus ter amaldiçoado a terra por causa do pecado do homem. Deus permite estas misérias e castigos para despertar a raça humana, para provocar o arrependimento, para refrear o pecado do homem, para incutir-lhe temor de Deus, para desapegar o homem das coisas desta vida e levá-lo a refletir sobre as coisas vindouras.
Diante de desastres como Brumadinho devemos nos lembrar que eles ocorrem como parte das misérias e castigos temporais resultantes das nossas culpas, de nossos pecados, como raça pecadora que somos. Poderia ser eu que estava na região quando a barragem se rompeu e levou a todos. Ou, alguém muito melhor e mais reto diante de Deus. Ainda assim, Deus não teria cometido qualquer injustiça, ainda que os que morreram soterrados fossem os melhores homens e mulheres que já pisaram a face da terra. Pois mesmo estes são pecadores. Não existem inocentes diante de Deus. Pensemos nisto, antes de ficar indignado contra Deus diante do sofrimento humano.
Não nos esqueçamos, entretanto, que o Deus justo é também o Deus que sofre conosco. Deus Filho se tornou um de nós pela encarnação no ventre de Maria, e viveu uma vida de sofrimento e dor que terminou com sua morte na cruz. O sofrimento que ele carregou e suportou não era decorrente do pecado, pois nele não havia pecado, nem original nem seu próprio. Ele carregou nossa dor e experimentou nosso sofrimento para que pudéssemos ser justificados dos nossos pecados, perdoados, aceitos por Deus como seu filhos, para nos livrar do sofrimento eterno e recebermos a vida eterna. Deus sabe o que é sofrer. Por isto, podemos encontrar nele respostas e conforto na hora da dor.
Por último, preciso deixar claro três coisas. Primeira, que nada do que eu disse acima me impede de chorar com os que choram, e sofrer com os que sofrem. Somos membros da mesma raça, e quando um sofre, sofremos com ele. Segunda, nada do que foi dito acima me impede de pedir justiça e querer que os culpados pelo rompimento da barragem sejam responsabilizados.
Terceira, é preciso reconhecer que a revelação bíblica é suficiente, mas não exaustiva. Não temos todas as respostas para todas as perguntas que se levantam quando um desastre destes acontece. Não sabemos os propósitos maiores e finais de Deus com aquela tragédia. Só a eternidade o revelará. Temos que conviver com a falta destas respostas neste lado da eternidade. Mas, é preferível isto a aceitar respostas que venham a negar o ensino claro da Bíblia sobre Deus, como por exemplo, especular que ele não existe, ou que, se existe, que ele não é soberano e nem onisciente e onipotente. Posso não saber os motivos específicos, mas consola-me saber que Deus é justo, bom e verdadeiro, e que todas as suas obras são perfeitas e retas, e que nele não há engano.