Os valores conservadores abraçados por evangélicos na América Latina têm sido cada vez mais respeitados por políticos que desejam conquistar o voto desse segmento social. E o crescimento do número de fiéis que seguem a tradição cristã evangélica é um fator decisivo no estabelecimento de programas eleitorais.
O jornal espanhol El País, de linha progressista, descreve os valores e princípios evangélicos como “ultraconservadores” na matéria que publicou sobre a influência desse segmento nas urnas. A reportagem, inclusive, reconhece que o crescimento dos fiéis à tradição protestante é “vertiginoso”.
Segundo o veículo, a “aproximação entre a política e a religião evangélica é uma constante que se estendeu por toda a América Latina”. Levando em conta os países de língua espanhola no continente, além do Brasil, o número de evangélicos somam 20%, quando há seis décadas mal chegavam a 3%, de acordo com dados do Pew Research Center.
A militância de esquerda adotada como linha editorial pela sucursal brasileira do El País descreve os valores conservadores como “retrógrados” e ameaçadores às “liberdades”, que embora não sejam explicitadas, estão associadas a questões sexuais, resumidamente.
“A ascensão [evangélica] fez com que estes grupos religiosos se transformassem em um ator político determinante, à custa de impor na agenda valores retrógrados e com o risco de fazer retroceder liberdades que, na maioria dos países, mal começavam a ser implementadas. O Brasil, a Colômbia e o México, as três grandes potências que nesse ano realizam eleições, serão o termômetro para avaliar o poder da doutrina além dos centros onde é praticada”, diz o texto.
Travestida de análise crítica, a postura preconceituosa do jornal diz que os evangélicos foram capazes de “atacar qualquer vislumbre de legalização do aborto e de casamentos igualitários” nos países citados. “E mais, esses grupos apelam à fé para erigir-se como ativos na luta contra a corrupção, a mácula que carcome a região de norte a sul”, desdenha o texto.
Sobre a oposição à agenda progressista, a matéria destaca ainda como os evangélicos brasileiros, mesmo votando em esquerdistas como Lula e Dilma Rousseff (PT), foram capazes de barrar o avanço da legalização do aborto, mesmo que a primeira mulher eleita à presidência da República fosse uma militante feminista com histórico comunista.
“A dependência do apoio evangélico no Congresso impediu que isso ocorresse”, constata o jornal, reconhecendo a relevância do público evangélico que, a cada ano, cada vez mais vota conforme suas convicções sedimentadas a partir dos valores de fé pregados pela Bíblia Sagrada.
Na Colômbia, a influência dos evangélicos – que são minoria no país – se aliou aos católicos e impediu que o acordo de paz com os guerrilheiros da FARC fosse referendado. A oposição dos cristãos a essa costura política se deu por causa da perseguição religiosa da parte dos criminosos e a impunidade aos crimes cometidos, algo ao qual a esquerda no país estava disposta a conceder.
Para o jornal, no entanto, a posição adotada seria uma demonstração de força: “Na noite de 2 de outubro de 2016, os colombianos recusaram em plebiscito, por uma pequena diferença, o acordo de paz negociado com à época guerrilha das FARC. Naquele dia, a comunidade evangélica, sobre a qual poucos haviam colocado os refletores, saiu para comemorar. Haviam conseguido com que dois milhões de fiéis, de acordo com cálculos das principais igrejas dessa doutrina, votassem não. Lembraram ao país que são capazes de fazer frente à cifra de 70% de pessoas que se dizem católicas e mudar uma eleição. As autoridades avaliam que existem seis milhões de evangélicos, mas os pastores sobem a aposta com cálculos de 8 a 12 em uma população de 48 milhões de habitantes. É o credo que mais cresce, não só em número, também em repercussão. Contam com um poderoso alto-falante: 145 emissoras e 15.000 centros religiosos, de acordo com dados do Conselho Evangélico”.
“Os principais pastores evangélicos da Colômbia sempre manifestaram, assim como os do Brasil, que não orientam seus fiéis a escolher algum candidato, mas a votar conscientemente para defender seu modelo de família. Ainda que ao mesmo tempo mandem uma mensagem clara ao país: ‘Estamos presentes nos setores políticos, culturais, econômicos e sociais’”, resumiu a reportagem.