No palco, diante de milhares de fiéis assolados por dívidas e dificuldades econômicas, Kenneth e Gloria Copeland, junto a outros pregadores da “teologia da prosperidade”, deleitavam a multidão com histórias das vidas luxuosas que alcançaram seguindo a palavra de Deus.
Jatinhos e lanchas. Uma moto enviada por um apoiador anônimo. Férias no Havaí e cruzeiros no Alasca. Bolsas de grife. Um anel de esmeraldas e diamantes. “Deus sabe onde o dinheiro está e Ele sabe como levar o dinheiro até você”, pregava Gloria, vestida como alta executiva.
Os pregadores da “teologia da prosperidade” atraem uma audiência considerável e adoradora. Sua mensagem —se você tiver fé suficiente em Deus e na Bíblia e doar com generosidade, Deus irá multiplicar suas oferendas por cem— é tranquilizadora para muita gente nestes tempos de crise.
Os pregadores mal admitiram que há uma recessão, embora dissessem que isso não serve de pretexto para restringir o dízimo. “O medo lhes deixará sovinas”, disse Copeland.
Mas as sacolinhas voltaram mais vazias do que em anos prévios, segundo antigos frequentadores.
A multidão de mais de 9.000 pessoas era multirracial, vinda de 48 Estados dos EUA e 27 países. O ministério do casal Copeland, cuja renda anual é de cerca de US$ 100 milhões, é transmitido para 134 países.
Muitos neste rebanho não confiam nos bancos, na imprensa ou em Washington, onde o Comitê de Finanças do Senado norte-americano está investigando se os Copelands e outros evangelistas da prosperidade usaram doações para enriquecer e abusaram da sua isenção fiscal. Mas confiam no casal Copeland, que parece encarnar a prosperidade com sua riqueza robusta e abundância e filhos e netos que os seguiram no seu ministério.
“Se Deus fez isso por eles, também fará por nós”, disse Edwige Ndoudi, que viajou neste mês com o marido e seus três filhos do Canadá para a Convenção de Crentes do Sudoeste dos EUA, onde os Copelands e outros se revezaram pregando por cinco dias, dez horas por dia, no Centro de Convenções de Fort Worth, no Texas.
“O pessoal que está vindo não é pobre”, disse Jonathan Walton, professor de religião da Universidade da Califórnia em Riverside, que já escreveu sobre o movimento e foi lá fazer pesquisas. “Eles residem naquela nebulosa categoria entre a classe operária e a classe média.”
Stephen Biellier, caminhoneiro de Mount Vernon, no Estado do Missouri, disse que ele e sua mulher, Millie, foram à convenção orando para que este seja “o ano da superação”. Eles têm dívidas que alcançam os US$ 102 mil, segundo Millie.
Marido e mulher afirmam que os Copelands os resgataram da falência há 23 anos, quando compraram seu primeiro caminhão com juros anuais de 22% e tiveram de reconstruir o motor duas vezes em um ano.
Naquela época, Millie viu o pastor Copeland na televisão e começou a lhe enviar 50 centavos de dólar por semana. “Teríamos falido se Copeland não estivesse orando por nós todos os dias”, afirmou.
Os Bielliers estão entre as 386 mil pessoas de todo o mundo a quem os Copelands chamam de “parceiros”. A maioria manda contribuições e merece preces especiais dos Copelands.
Mas o professor Walton qualificou os pregadores da prosperidade como “batedores de carteira espirituais”. “Minimizar e ignorar as duras realidades desta crise econômica está além de irresponsável, a ponto de ser repreensível”, disse.
O casal Copeland não quis dar entrevistas, mas uma de suas filhas, Kellie Copeland Swisher, e seu marido, Steve Swisher, falaram em seu nome. Kellie disse que o ministério doa “um mínimo de 10% do que entra” para outras obras beneficentes.
A comissão do Senado americano, em sua investigação tributária, solicitou documentos do ministério religioso. O ministério resistiu em entregá-los, disse Kellie, porque os Copelands não querem revelar publicamente os nomes dos “parceiros”.
Ela afirmou que, mesmo em meio à crise econômica, a renda do ministério durante os preparativos para a convenção subiu 3% em relação ao ano passado. Questionada sobre se os Copelands haviam ajustado a mensagem de acordo com o cenário econômico sombrio, Kellie respondeu: “A mensagem que eles pregam é a palavra de Deus. A palavra não muda”.
Na convenção, os pregadores salpicavam seus sermões com farpas ao governo dos Estados Unidos, à imprensa e a outras Igrejas, muitas das quais condenam a pregação da prosperidade. A maioria dos pregadores se empenhava em lembrar aos fiéis de que eles são escolhidos de Deus. “Enquanto todo o resto está passando fome”, disse o tele-evangelista texano Jerry Savelle, “Seu povo da aliança terá o melhor dos tempos”.
“A qualquer momento que um pensamento preocupado a respeito do dinheiro pipocar em sua mente”, prosseguiu Savelle, “a próxima coisa a fazer é semear”: despejar dinheiro, como sementes, no “solo bom”, como os ministérios dos pregadores. “Esse é o pacote de estímulo divino para vocês”, disse.
Ouvindo isso, centenas de pessoas tomaram os corredores em direção ao palco, deixando envelopes, notas e moedas nos degraus acarpetados.
Fonte: The New York Times / Gospel+
Via: Guia-me