O caso de estupro de uma adolescente no Rio de Janeiro despertou uma grita de que existe no Brasil uma “cultura de estupro”, e dentro dessa reação ativista, um filósofo publicou um artigo acusando a Bíblia Sagrada de não fazer oposição à violência sexual.
Hélio Schwartsman, colunista da Folha de S. Paulo, afirmou que “da Bíblia a Homero, passando por Shakespeare, episódios de estupro em massa são narrados, às vezes em detalhes e sem uma condenação clara”.
O texto, intitulado “Triunfo Feminista”, sugere ainda que as punições mencionadas na Bíblia seriam irrisórias perante a natureza hedionda do crime de estupro: “Pelo livro sagrado, um homem que violasse uma virgem deveria pagar 50 shekels ao pai e casar-se com a jovem, sem direito a divórcio (Dt 22.28-29) […] Só à partir do século 18 leis contra a violência sexual começam a tornar-se reconhecidas para os padrões modernos”, diz o colunista.
Schwartsman tem ascendência judaica, é bacharel em filosofia e além de colunista da Folha, é escritor. Sua bagagem intelectual, no entanto, foi usada de forma tendenciosa, de acordo com o pastor Leo Gonçalves, colunista do Púlpito Cristão.
“Hélio está convencido de que a Bíblia nada diz acerca da punição cabível aos estupradores. Para ele, a legislação mosaica deixaria as mulheres indefesas diante de tal violência, tratando-as como propriedade do pai e do esposo e privando-as assim da autonomia própria dos seres humanos”, escreveu Gonçalves no artigo “A Bíblia, o estupro e a falácia feminista”, publicado em resposta ao texto de Schwartsman.
“O texto da lei mosaica, em Deuteronômio 22:28-29 não trata de estupro. No máximo, pode-se admitir que o homem ‘pulou a cerca’, adiantando-se à prerrogativa do casamento, mas não há indicação de que a situação não tenha sido consensual”, disse Gonçalves, reproduzindo uma análise do presbítero Solano Portela a respeito do texto mencionado pelo colunista da Folha. “‘Muito mais do que proteger direitos de proprietários’, o texto busca proteger a mulher, para que não servisse tão somente de objeto, mas ficasse amparada pelo casamento, ao qual o homem estava obrigado a respeitar, a partir deste fato gerador”, acrescentou Gonçalves.
Destacando que o assunto estupro não é tratado em 22:28-29, “devemos entender que a Bíblia é omissa quanto ao assunto? ”, questiona Gonçalves, antes de reproduzir, novamente, uma análise de Solano sobre o tema: “Neste mesmo capítulo de Deuteronômio, nos versos 25 e 27, há referência, sim, a estupro com a aplicabilidade da pena de morte. O texto fala em ‘forçar a se deitar’ […] e caracteriza a violência indicando que a ‘moça gritou e não houve quem a livrasse’”.
Por fim, concluindo a resposta ao artigo de Hélio Schwartsman, Leo Gonçalves pontua que “criticar a Bíblia com base em achismos e tratar de refutá-la apropriando-se de jargões típicos de militância está se tornando praxe em nosso país”, que se vale de frases como “A bíblia apenas reflete uma cultura machista e patriarcal” e/ou “A bíblia considera as mulheres como inferiores”, o que evidencia desconhecimento sobre o texto bíblico. “O próprio Hélio afirma que ‘só à partir do século 18 é que as leis contra a violência sexual começam a tornar-se reconhecidas’, ignorando completamente o fato de que tal conduta não só era tida como crime pela lei mosaica (1500 A. C.), como punível com a maior severidade – no caso, a pena de morte”.