A ex-ministra Marina Silva foi tema de um artigo do cantor Caetano Veloso, que saiu em sua defesa após analistas políticos criticarem a postura adotada pela pré-candidata à presidência da República em 2014.
Marina ganhou as manchetes da mídia na última semana ao dizer que o pastor Marco Feliciano deveria ser analisado por suas declarações e seu desempenho como político, e não por ser evangélico.
Na ocasião, Marina disse que não gostava “quando a questão fica religiosa”, e destacou que a polêmica em torno do pastor Feliciano era sobre uma “cultura de direitos humanos, coisa que o deputado não tem”.
Ainda assim, analistas políticos entenderam que Marina havia saído em defesa de Feliciano, e alguns chegaram a decretar um suicídio político da fundadora do movimento Rede Sustentabilidade, que coleta assinaturas para a fundação de um partido.
De acordo com o Tribuna Hoje, Veloso afirmou que as críticas feitas a Marina Silva atendem apenas ao interesse de quem quer ver a disputa eleitoral polarizada entre PSDB e PT, e que a postura da ex-ministra está correta.
“As palavras de Marina Silva sobre o caso Feliciano são sensatas e dizem o que deve ser dito. A imprensa deu um tom suspeito nas manchetes e os malucos das redes sociais (segundo me contam) entraram em surto. Meu amigo Rafael Rodriguez acha que querem desqualificar Marina para que se mantenha a disputa eleitoral ente PT e PSDB”, afirmou Veloso.
O cantor ainda observa que as manchetes jornalísticas criticando Marina Silva eram um tanto vagas por não levar em consideração o histórico dela como política: “Será que alguém crê que Marina Silva está assinando embaixo de declarações inaceitáveis feitas por Feliciano só porque ele é evangélico? Esses doidos não podem fingir que acreditam nisso”, pontuou.
Segundo Caetano Veloso há um movimento na imprensa que busca excluir Marina Silva e sua Rede Sustentabilidade dos assuntos mais tratados no Brasil: “Alegra-me poder repetir o nome de Marina Silva quando páginas de jornal e telas de computadores esperneiam para que o apaguemos”, disse, manifestando explícito apoio à ex-ministra do Meio Ambiente.
Leia a íntegra do artigo publicado por Caetano Veloso sobre Marina Silva:
As palavras de Marina Silva sobre o caso Feliciano são sensatas e dizem o que deve ser dito. A imprensa deu um tom suspeito nas manchetes e os malucos das redes sociais (segundo me contam) entraram em surto. Meu amigo Rafael Rodriguez acha que querem desqualificar Marina para que se mantenha a disputa eleitoral ente PT e PSDB. Isso parece com o que eu dizia quando o nome de Mangabeira Unger era limado de minhas entrevistas, algumas eleições atrás: os jornalistas são petistas e os donos dos jornais são tucanos, não há lugar para terceiros nomes. Mas Mangabeira é uma referência incontornável e Marina é um peso político-eleitoral difícil de destruir. Não estou nem aí.
Gostei muito foi do comentário de Elio Gaspari sobre cotistas. A reportagem que parecia comprovar que cotas só servem para destruir a meritocracia revela-se vazia de conteúdo diante da pesagem das estatísticas feita pelo grande jornalista. Aliás, o artigo dele sobre a substituição, pelo governo Dilma, do secretário executivo do Ministério da Fazenda é de leitura obrigatória (eu, que pouco sei sobre essas coisas, fiquei mais inteligente ao lê-lo).
Voltando: será que alguém crê que Marina Silva está assinando embaixo de declarações inaceitáveis feitas por Feliciano só porque ele é evangélico? Esses doidos não podem fingir que acreditam nisso. De repente é como se Marina apoiasse a interpretação do assassinato de John Lennon feita pelo pastor. Impossível. Ele disse que o crime era uma manifestação da Santíssima Trindade. Que queria estar lá quando acharam o corpo do cantor e dizer: “Este primeiro tiro é em nome do Pai, o segundo é em nome do Filho e o terceiro é em nome do Espírito Santo”. O “Não matarás” da Bíblia fica assim desvalorizado, submetido à ideia de um Deus ciumento e vingativo, tão pré-cristão e tão anticristão, como se os nossos valores morais se baseassem nas punições contra quem, na conquista da Terra Prometida, deixasse de matar, por piedade, mesmo “uma criança de peito”. O pecado ingênuo de um adolescente (dizer que seu grupo de rock estava mais popular do que Jesus Cristo) é tido, assim, como mais grave do que o assassinato a sangue frio. Como a compassiva Marina iria compactuar com essa interpretação dos ensinamentos bíblicos? O que ela diz é que Feliciano não representa o pensamento de todos os evangélicos. Nem mesmo da maioria. Marina defende o Estado laico. E o diz com todas as letras. Por que querer criar confusão onde há tanta clareza?
Outro dia li um jornalista reclamando que falo sobre tudo e mais alguma coisa. A piada da “Piauí”, em que apareço com uma capa de magistrado do STF (que, aliás, na montagem fotográfica me caiu muito bem), sob uma manchete que dava conta de que uma decisão momentosa ia ser arbitrada por mim, é engraçada. Me mostraram um vídeo no YouTube em que estou dizendo a alguém “Você é burro, cara”. Eu repetia que o cara era burro e dizia que ele formulara a pergunta de modo tão burro que eu não conseguia sequer memorizar. Meu amigo Eduardo Sá achou de onde tiraram esse clipe. Foi de um programa de TV chamado “Vox Populi”. É dos anos 1970. Eu tinha o cabelo muito longo, muito preto e muito cacheado (esses dois últimos atributos sendo os de que tenho mais saudade). E falava com uma mistura um tanto estranha de moleza e arrogância. O quadro do período explica minha atitude. Eu tinha começado o trabalho com A Outra Banda da Terra sob apedrejamento crítico. O disco “Muito” foi achincalhado como sendo a prova final de minha inépcia e falta de inspiração. “Sampa” e “Terra” estavam sendo lançadas nesse disco. Anteontem reli um artigo de Tárik de Souza em que ele avalia, com forte espírito de corpo jornalístico, minhas brigas com a imprensa da fase que se seguiu a esse lançamento. Quem eu tinha chamado de burro era Geraldo Mayrink, da “Veja”, que destacava frases de músicas de Ary Barroso, Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira, que eu citara em minhas letras, como exemplos de maus versos, crendo que eram meus (eram de músicas muito conhecidas por quem atentasse para a MPB). Sei que eu estava certo, mas não me senti bem vendo o vídeo. Valeu para eu poder mostrar a meu filho mais novo meu pai falando (ele aparece fazendo pergunta íntima). Mas meu desejo de desprezar as opiniões negativas sobre meu trabalho me irritou um pouco. Preferi ver um “Roda Viva” em que eu, mais velho (com o cabelo já liso mas ainda todo preto), falo “de tudo”, mas em tom mais modesto.
O que vale o que eu penso sobre Gaspari ou Marina? Creio que quase nada. Mas alegra-me poder repetir o nome de Marina Silva quando páginas de jornal e telas de computadores esperneiam para que o apaguemos.
Por Tiago Chagas, para o Gospel+