Uma chacota generalizada se instalou nas redes sociais e portais de internet sobre o relato da pastora Damares Alves, futura ministra das Mulheres, Família e Direitos Humanos, de uma experiência sobrenatural que a impediu de se suicidar na infância. No entanto, a reação do lado conservador da sociedade foi pontual e denunciou a hipocrisia dos movimentos esquerdistas.
Damares Alves é uma mulher nordestina, nascida no Sergipe, que sofreu abusos sexuais dos seis aos oito anos de idade, convivendo com a pressão psicológica até os dez para que não denunciasse o parente que havia estuprado-a repetidas vezes. Nessa aflição, ela se propôs a tirar a própria vida, mas no instante em que faria a ingestão de veneno num pé de goiaba, viu Jesus e nessa experiência sobrenatural foi encorajada a não desistir.
Esse é um resumo do que a própria pastora relata em suas pregações e palestras, e após sua indicação para o cargo de ministra dos Direitos Humanos, cada um dos vídeos com suas declarações têm sido revirados pela grande mídia para pinçar trechos e despertar polêmicas a partir de suas posições, como por exemplo, a defesa intransigente da vida.
O deboche na forma de memes com a experiência de uma mulher que sobreviveu a estupros – ao custo de ter seu útero danificado a ponto de torná-la estéril – e resistiu à angústia que quase a levou ao suicídio ganhou volume quando o perfil da revista/programa de TV Globo Rural fez piada com a história. “Subir na goiabeira para tentar ver Jesus pode ser perigoso! Prefira atividades mais calmas, como cultivar a fruta”.
O tweet viralizou e motivou reações de revolta por conta do desdém com a tragédia pessoal de Damares Alves e, de carona, o desrespeito com a fé cristã. Entretanto, o filósofo Leandro Karnal – que compartilha reflexões de cunho progressista – também usou as redes sociais para fazer troça com a situação. “Tema da redação de hoje: quem não tem pecado que atire a primeira goiaba!”.
O escárnio, entretanto, não ficou impune, com setores da imprensa reagindo à falta de sensibilidade, assim como formadores de opinião que usaram as mesmas redes sociais para denunciar a hipocrisia dos detratores, a maioria adeptos de ideologia de esquerda.
“Pouco importa se Damares Alves, futura ministra dos Direitos Humanos, realmente viu Jesus numa goiabeira. Santo Agostinho não teria se convertido sob uma figueira, em Milão? Não alegam que a conversão repentina de Paulo, na estrada para Damasco, não teria sido nada mais nada menos do que um surto? Lembrei de uma famosa. Relatam que o grande filósofo Heráclito morreu depois de se lambuçar no esterco, nada grandioso para um filósofo”, conceituou o escritor Francisco Razzo, um dos principais defensores do conservadorismo e militante pró-vida.
“Acho que se Damares fosse feminista, tivesse se entupido de maconha e visto um duende numa montanha de merda, estaria sendo louvada”, contrapôs Razzo, que continuou expressando sua indignação com as piadas de mau gosto: “Aos 10 anos de idade Damares tentou suicídio. Isso mesmo, uma menina de 10 anos — minha filha mais velha tem 9 — tentou se matar com veneno de rato. Relata que desistiu por ter visto Jesus no pé de goiaba. ‘Encontrou Jesus na goiabeira’ (Leandro Karnal tirou sarro; Noblat tirou sarro, Quebrando Tabu tirou sarro; até o Globo Rural tirou sarro, dá pra acreditar?). A pergunta mais séria é: por que uma criança de 10 anos deseja se matar? A resposta é perturbadora, e não é por causa de uma boneca. Damares dos 6 aos 8 anos foi sistematicamente estuprada”, concluiu.
Até o presidente eleito reagiu e lamentou o episódio: “É surreal e extremamente vergonhoso ver setores da grande mídia debocharem do relato da futura Ministra Damares Alves sobre a fé em Jesus Cristo, que a livrou de um suicídio desejado por conta de abusos sofridos na infância. Lamentável!”, publicou Jair Bolsonaro nas redes sociais.
O jornalista Felipe Moura Brasil, apresentador do programa Os Pingos Nos Is da rádio Jovem Pan, denunciou a “chacota seletiva” contra Damares Alves, pontuando que o caso da pastora se encaixa justamente em todas as bandeiras que são hasteadas pelos movimentos de esquerda, mas como envolve uma conservadora, vale a zombaria.
“Não posso deixar de registrar a hipocrisia, até de pessoas da imprensa mesmo, que condenam quando se faz piada em relação ao pessoal da esquerda, que protegem as mulheres quando fazem algum relato de um acontecimento trágico, principalmente quando se trata de estupro […] Agora vem uma pessoa que está ligada a um governo que se apresenta como sendo de direita, e conta uma história dessa, e é execrada. O deboche, o sarcasmo viraliza nas redes sociais e não tem nenhuma cerimônia quando é alguém do outro lado”, opinou.
Orgulho
Damares Alves concedeu uma entrevista na última quinta-feira, 13 de dezembro, ao programa Timeline, da Rádio Gaúcha, e disse não se importar com as piadas porque saiu transformada da experiência no pé de goiaba e que todo o escárnio resultará em atenção ao tema da pedofilia, que é um dos pontos aos quais ela pretende se dedicar durante sua gestão à frente do Ministério.
“Desci daquele pé de goiabeira diferente, me tornei pastora, advogada e agora ministra. Eu venci a pedofilia”, enfatizou a futura ministra, destacando que o vídeo que vem circulando nas redes sociais foi editado e retirado de contexto.
“[O abusador] me convenceu de que eu era a culpada, eu achava que Deus estava bravo comigo e, por ser uma menina cristã, era uma dor muito grande pela qual eu achava que não conseguiria passar. Eu queria morrer”, relembrou Damares, destacando que convivia com dores físicas e psicológicas. “De ontem para hoje, virei alvo de piadas porque tive coragem de contar que uma menina de 10 anos, machucada, tinha como amigo imaginário o ser superior da vida dela, que é Jesus. Eu o vi, e foi ele que me impediu de me matar”, resumiu.
Confira a íntegra da entrevista de Damares Alves à Rádio Gaúcha: