A Folha de S. Paulo foi apontada pelo presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL) como um veículo de imprensa que caiu em descrédito junto à parcela da população que o elegeu. As críticas são pelo viés ideológico de esquerda adotado em sua linha editorial, um fato admitido pelo editor do jornal, Sérgio Dávila, em editorial.
Diante desse contexto, a jornalista Anna Virginia Balloussier publicou uma matéria associando a vitória de Bolsonaro sobre Fernando Haddad (PT) a uma grande mobilização antipetista: “A máquina da Universal entrou com tudo na campanha contra Haddad”, escreveu, em matéria publicada no portal do jornal.
O título da matéria, “Universal usou sua máquina para exaltar Bolsonaro e atacar Haddad”, dá o tom da indignação com a postura crítica adotada pela denominação que foi atacada pelo candidato petista logo após se fundador, bispo Edir Macedo, decidir apoiar o capitão do Exército.
Balloussier, no entanto, não aborda em sua matéria a grande máquina de moer opositores ao progressismo que a Folha se tornou. No editorial de Sérgio Dávila, ele afirma que as redações dos veículos de imprensa em São Paulo, em especial a Folha, olhavam para Haddad durante os anos em que foi prefeito da capital, com simpatia, por compartilharem visões de mundo.
“Em seus quatro anos no comando da cidade, o petista governou para uma jovem elite intelectual progressista de esquerda. As Redações são formadas em sua maioria por uma elite intelectual de jovens progressistas de esquerda. Posso falar com mais embasamento desta Folha. Em 2014, no segundo ano de governo Haddad, censo interno realizado pelo Datafolha atestou que 55% dos jornalistas da casa se consideravam de esquerda, e 23%, de centro. Indagados sobre como situavam o próprio jornal, 50% o colocavam no centro, e 30%, na esquerda”, atestou Dávila, no editorial publicado em 12 de novembro de 2017.
Na ocasião, Dávila foi além, confirmando que a equipe do jornal é formada por progressistas: “A maioria adotava posição liberal em relação a aborto, direitos homossexuais e drogas, em números eloquentemente superiores aos da população brasileira como um todo: 82% a favor da descriminalização da maconha e 96% a favor da união civil entre homossexuais, ante 77% e 39% dos brasileiros, respectivamente. Naquela ocasião, outubro de 2014, foram ouvidos 321 profissionais, numa pesquisa com margem de erro de dois pontos percentuais”, detalhou.
A ‘máquina’
Em sua matéria, Anna Virginia Balloussier diz que a “assessoria de Haddad afirmou que ele está ‘convicto de que suas afirmações são verdadeiras e que os fatos e a história dos personagens envolvidos assim comprovam’”, em referência ao discurso do candidato derrotado que apontava a “fome de dinheiro” de Macedo como motivo para apoiar Bolsonaro.
“A Record, sem ligação oficial com a Universal mas parte do conglomerado de Macedo, ajuda e muito a amplificar a mensagem anti-PT”, analisou a jornalista. “No primeiro turno, um Bolsonaro ainda se recuperando atentando [sic] a faca alegou motivos médicos para faltar ao último debate. Enquanto presidenciáveis discutiam, a emissora o entrevistou por 26 minutos. Um papo dócil, acompanhado por Douglas Tavolaro, braço direito de Macedo e coautor de sua biografia”, acrescentou.
Como evidência de que a Record TV estaria com suas engrenagens a favor de Bolsonaro, Balloussier afirma que “jornalistas a serviço da emissora se diziam desconfortáveis com o tratamento acrítico ao candidato do PSL” e amplificou rumores sobre os bastidores da empresa: “A chefia vetou uma reportagem sobre um mestre de capoeira simpático ao PT e assassinado por um homem supostamente bolsonarista”.
Ao final, reproduziu uma fala do bispo Renato Cardoso, genro de Edir Macedo, como sinal de que a máquina está azeitada para trabalhar em alto ritmo a favor do presidente eleito: “A oposição já fala em resistência. O presidente nem começou a governar. Olha, está escrito [na Bíblia]: não devemos resistir à autoridade, pois quem resiste à autoridade resiste à ordenação de Deus”.
Com foco limitado na crítica à Record e Universal, Balloussier não se aprofundou sobre os avanços progressistas da Folha de S. Paulo – o maior jornal do país – contra a visão de mundo conservadora, adotada pela esmagadora maioria da população brasileira, formada essencialmente por cristãos católicos e evangélicos.