O cantor Ricardo Nêggo Tom, apoiador de Lula, publicou um artigo em que reprova as tentativas do PT de se aproximar dos evangélicos brasileiros, afirmando que “não há diálogo” com quem se opõe à esquerda e que o esforço é “perda de tempo e saúde mental”.
Nêggo Tom, que escreve artigos para o portal Brasil 247, diz que os evangélicos têm “uma doutrina absolutista”, o que impede as tentativas de conversão à ideologia de esquerda: “Precisamos entender que onde há dogma não há propensão ao diálogo, nem ao raciocínio a respeito de ideologias ou visões de mundo que possam colocar tal dogma em questionamento”.
A doutrina bíblica, que guia os evangélicos, é um preceito visto pela própria esquerda como uma barreira intransponível: “Se opõe a toda e qualquer ideia de desconstrução de padrões sociais, contribuindo para perpetuação de estereótipos”, pontua Nêggo Tom.
A solução proposta pelo apoiador de Lula é a mesma que Gilberto Carvalho, antigo homem forte do PT, sugeriu há mais de uma década: “disputar a narrativa” sobre o papel da religião.
“A partir disto, o mais que podemos fazer com relação ao projeto de poder neopentecostal, que pretende estabelecer um Estado evangélico de direito no país, é disputar com eles a narrativa evangélica que Jesus Cristo deixou. Mas isso não é diálogo”, insiste.
Expressando sua repulsa às doutrinas bíblicas que reprovam a homossexualidade, o autor do artigo aproveita para deixar implícita ao segmento evangélico uma acusação de racismo ao afirmar que as igrejas agem para “‘converter’ à branquitude cristã” os negros do país.
Os evangélicos, diz Nêggo Tom, têm “dogmas que em suas manipuladas concepções colocam a esquerda como inimiga de Deus e dos cristãos”, reitera. “Se Lula e a esquerda pretendem convencer os evangélicos de que não é nada disso, vamos perder tempo e saúde mental”.
No passado, Lula já se comparou a Jesus Cristo, e essa insensatez inspira seus seguidores mais fanáticos até hoje, como Nêggo Tom evidencia: “Jesus Cristo é um grande exemplo dessa perda de tempo. Mesmo ele tendo ensinado o bem, o amor, a paz, a inclusão social, a partilha do pão, a tolerância e o respeito, foi morto com o voto daqueles que se beneficiaram de suas ‘políticas públicas’, sob a alegação de que era um perigoso subversivo que ameaçava a lei, os costumes e os dogmas. Lula está muito longe de ser Jesus, mas também já experimentou a ingratidão por parte daqueles a quem um dia ajudou com suas políticas públicas, entre os quais muitos evangélicos, que foram convencidos de que ele era um corrupto que ameaçava os bons costumes e apoiaram a sua prisão”.
A tentativa de equivalência entre o filho de Deus e o político de carreira que cumpriu pena de prisão continua: “Os principais inimigos de Lula hoje no país, são os mesmos inimigos de Jesus em sua época”.
Ao final de seu artigo, o autor demonstra sua intolerância com o segmento religioso que será maioria no país em poucos anos, dizendo que a liberdade religiosa no país resulta na “proliferação nada positiva de igrejas neopentecostais sob a benção da isenção tributária e a permissividade de se colocarem acima da laicidade do Estado”, indicando seu desejo de cobrar impostos sobre as ofertas voluntárias dos cristãos.
PCO
A intolerância do articulista foi notada pelo Partido da Causa Operária (PCO), um dos mais radicais grupos de defesa da ideologia de esquerda no pais. A legenda publicou uma nota em seu site repudiando as afirmações de Nêggo Tom:
“A esmagadora maior dos 70 milhões dos evangélicos não são ‘inimigos ideológicos’. São parte da classe trabalhadora, pessoas que, pela ausência de iniciativa da esquerda, acabam sendo cooptadas parcialmente pela extrema-direita. Isso não significa, no entanto, que estejam dispostas a pegar em armas contra o ‘comunismo petista’, nem que as condições materiais, como emprego, moradia e fome, estejam acima de qualquer dogma”, ponderou.