Fernando Haddad (PT) concedeu uma entrevista em que falou sobre a dificuldade do PT em se relacionar com as igrejas evangélicas, indicando que isso foi um dos motivos que levou o partido à derrota nas eleições presidenciais de 2018, mas também dando sinais de que não há intenção de ceder aos valores conservadores tão caros aos eleitores que fazem parte desse grupo.
Durante o segundo turno da campanha, o rapper Mano Brown fez um discurso com duras críticas ao PT, afirmando que os políticos da legenda haviam se distanciado da base de eleitores, e por esse motivo, o candidato Jair Bolsonaro (PSL) ganharia a eleição.
Haddad, derrotado na disputa dias depois, afirmou agora ao jornal El País, de linha editorial progressista, que o distanciamento do partido em relação ao povo se deu porque a militância passou a integrar a máquina estatal, através de cargos comissionados, e também porque a corrupção generalizada desencadeou uma crise no país.
“Quando você é governo durante quatro mandatos existe um processo de distanciamento das bases em função do fato de que a maioria dos quadros são assimilados pela máquina estatal. Isso é um processo muito desagradável, infeliz, mas acontece. O sucesso eleitoral do PT enfraqueceu o próprio partido em sua conexão com as bases. O outro fenômeno é a crise política, ética, e econômica que aconteceu”, argumentou Haddad.
Sobre as igrejas evangélicas – que ao longo da primeira década do século atual cresceram mais de 60% – o ex-ministro da Educação nos governos petistas declarou que o PT não aprendeu a falar a língua desse público.
“Outra questão é que há novos atores no Brasil. Por exemplo, as igrejas evangélicas tinham um tamanho quando ganhamos em 2002, e têm outro tamanho agora. E nós não aprendemos a dialogar com a base dessa igreja, muito menos com os líderes, que são em geral bastante conservadores”, admitiu.
Essa completa falta de habilidade para dialogar com as igrejas evangélicas pôde ser vista no Plano de Governo que o PT apresentou durante a campanha, classificando o conservadorismo como obscurantista, por exemplo, além do tom firme em defesa de questões como a legalização do aborto.
Nesse sentido, Haddad expressa que o PT continua idêntico no discurso e na intenção, pois a autocrítica que o ex-ministro faz não expressa desejo de mudança de planos, mas sim pela busca de uma nova ferramenta de convencimento do povo a respeito de seus ideais, reiterando a petulante intenção de ser uma espécie de tutor do eleitorado.
“Eu acho que deveríamos ter trabalhado mais a questão da consciência política. O avanço objetivo tinha que ter sido acompanhado de um avanço subjetivo. O avanço material tem quer vir acompanhado de um avanço espiritual. Essas coisas tem que vir juntas para que o processo se consolide. Espiritual não no sentido religioso, mas no sentido ético, de valores. A ética tem que ser uma obsessão de um partido que transforma a vida material das pessoas. Se você dissocia isso as pessoas atribuem o próprio êxito a questões que… Claro que tudo depende do esforço individual também, mas isso tem que vir acompanhado de um processo de formação política”, disse Haddad.