Os defensores do progressismo veem nos evangélicos uma grande barreira para aprovação de leis que representem de forma mais contundente os ideais de esquerda. A postura conservadora dos cristãos no Brasil é um incômodo, segundo o sociólogo Ricardo Mariano.
Mariano, que é vice-coordenador de pós-graduação em Sociologia na Universidade de São Paulo (USP), participou da 69ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), e afirmou que os embates ideológicos continuarão acontecendo entre “progressistas” e evangélicos.
De acordo com Mariano, a representatividade dos evangélicos no Congresso Nacional impede o avanço de pautas como a adoção de crianças por homossexuais, a ideologia de gênero nas escolas e a distribuição de materiais como o “kit gay“ para alunos a partir de seis anos de idade.
“Nos últimos 30 ou 40 anos, o ativismo religioso tornou-se um fenômeno global. E constatou-se que o processo de secularização foi, na verdade, resultado de lutas políticas e ideológicas intensas”, relembrou o sociólogo.
O Brasil, hoje, tem aproximadamente 60 milhões de evangélicos, sendo que sete entre cada dez é ligado às igrejas pentecostais, que sustentam uma visão conservadora. “Até os anos 80, os evangélicos eram claramente anticomunistas e apoiaram a ditadura militar, mas não se envolviam na política parlamentar. Na Constituinte que gerou a Carta de 1988, no entanto, já se formou uma bancada no Congresso Nacional, em defesa da família e em oposição ao aborto. Eles se aliaram ao Centrão e aos ruralistas”, reclamou.
Na atual legislatura, a representativade dos evangélicos é expressiva, com 90 deputados federais, tendo a bandeira de combate aos ideiais esquerdistas como seu principal símbolo. “Parlamentares como [pastor Marco] Feliciano e [Eduardo] Cunha são responsáveis por ações como o bloqueio à iniciativa do Ministério da Educação de fazer campanha contra a discriminação de teor sexual nas escolas. O material da campanha acabou ficando conhecido como ‘kit gay’”, comentou.
“Ficam demonstrados mal-estar e indignação contra o avanço do pluralismo cultural e a diversidade de modos de vida e de arranjos familiares”, queixou-se o sociólogo, sem mencionar que boa parte do ativismo é feito com um discurso de imposição de ideias e doutrinação.
Ricardo Mariano se valeu de termo pejorativo para se referir aos evangélicos em uma reflexão sobre o avanço da postura conservadora: “Por essas e outras razões, o ativismo político evangélico tem sido contestado pelos defensores dos direitos humanos, que o acusa de fundamentalista e de representar risco para a democracia e para a valorização da competência técnica e científica”.
“Os grupos políticos evangélicos tratam a política como um ministério religioso, uma forma de evangelizar e impedir a influência ‘demoníaca’ sobre as instituições e os comandantes da nação”, disse, valendo-se de um resumo simplista e preconceituoso sobre os evangélicos, dando a entender que não há capacidade intelectual em quem defende uma visão de mundo oposta à sua.