Uma jornalista, fotógrafa e feminista evangélica publicou um artigo polêmico onde atribui à fé cristã a “reprodução do machismo” na sociedade e a ocultação da violência contra a mulher entre fiéis.
Thamyra Thâmara de Araújo, que também mantém um blog, afirmou que “as igrejas (a religião cristã em si) tem sido uma das principais ferramentas de controle do corpo, em especial o feminino, e de reprodução do machismo”, porque as doutrinas seriam feitas para naturalizar “todo tipo de violência contra a mulher: física, psicológica e simbólica”.
“Nesses meus 18 anos de igreja, já vivenciei muita violência contra a mulher”, enfatiza a jornalista, que se vale de uma postura controversa para validar seus argumentos: “Mulher na igreja é bem valorizada, mas só aquelas dentro do padrão ‘mulheres virtuosas’, meninas tipo cor gelo, de cabelo lambido, discretas, silenciosas, de boa família, vestidas de forma decente e submissas”, escreveu, no texto publicado pelo portal do jornal Folha de S. Paulo.
“Quem frequenta igreja desde pequeno com certeza em algum momento já viu, já ouviu: mulheres expulsas da igreja porque engravidaram antes do casamento; mulheres impedidas de participar do ritual da ceia porque não são casadas no papel; mulheres que aguentam há anos relacionamentos abusos (sic) de violência física e psicológica porque recebem orientação de que casamento é para sempre mesmo quando elas se sentem um lixo na relação; mulheres questionadas por usarem branco em segundo casamento; mulheres que casaram cedo para cumprir uma regra, mas não conhecem seus corpos, nunca gozaram e se sentem sexualmente infelizes; mulheres que desde novas são ensinadas a cozinhar para serem boas esposas; mulheres que são incentivadas biblicamente a cumprir o papel de mãe, esposa e do lar; pregações que comparam a virgindade feminina a ‘presentinho’ para o homem que quando se perde não tem mais valor; mulheres que não podem exercer o pastorado porque são mulheres; mulheres que foram ensinadas a cobrirem seus corpos, para não despertar nada nos homens, uma vez que eles são incontroláveis e qualquer deslize é culpa das mulheres”, afirmou.
Segundo Thamyra Thâmara, as situações mencionadas acima são coisas “produzidas pelo moralismo e pela doutrina das igrejas e que nada tem haver (sic) com a essência do cristianismo baseado na figura de Cristo”
“Se a gente for perceber, a maioria dos pastores e lideranças nas igrejas são homens e eles interpretam os textos bíblicos baseando-se no contexto cultural machista e nos seus olhares de homens. Silenciando as histórias das mulheres na bíblia ou simplesmente falando delas como meras coadjuvantes por trás de ‘grandes homens de Deus’. Por outro lado, as lideranças femininas também reproduzem esse julgo opressor ensinando desde cedo meninas mais jovens a serem as mulheres ‘virtuosas’ que aceitarão tudo pelo bem da família. E ter uma família deve ser o sonho de toda mulher”, criticou, pondo em cheque a bandeira da família tradicional, uma das mais empenhadas pelo meio evangélico.
Para a feminista evangélica, a liturgia em voga “produz mulheres que levam consigo uma espiritualidade carregada de vergonha e de culpa por não conseguirem viver regras morais estabelecidas pela religião”.
Nas igrejas, segundo Thâmara, os bancos estão cheios de “mulheres ensinadas a hostilizar outras mulheres, em especial aquelas que exercem a sexualidade livremente, pelo simples fato de temerem a si mesmas”, supôs.
“Se deixarmos de lado toda essa burocracia religiosa e olharmos o evangelho pelas lentes de Jesus de Nazaré vamos perceber uma figura bastante revolucionária no contexto judaico da época. Uma época em que mulheres não significavam nada. Não tinham voz. Na Bíblia existem inúmeras histórias de Jesus andando com mulheres, compartilhando segredo com elas, aprendendo com mulheres, indo a suas casas, ouvindo e dando a elas ferramentas para potencializar suas vozes”, contextualizou. “O episódio que mais me encanta é quando Jesus ressuscita e a primeira pessoa para quem ele resolve aparecer é a uma mulher. O que é bastante louco porque naquela época o testemunho de uma mulher não valia nada”, acresceu.
Por fim, a feminista evangélica adota postura semelhante ao movimento feminista extremista surgido nas redes sociais e apresenta seu viés político: “É preciso que a gente entenda que evangélico não tem uma cara só. Não é sinônimo de Bolsonaros e Felicianos. A identidade evangélica está em disputa e tem uma galera comprometida e engajada levantando a bandeira do acolhimento, do respeito à diversidade, do amor fraterno e da dignidade humana. Sou cristã e feminista sim!”, conclui, assinando como “afrofuturista”.