O temor de muitos líderes cristãos no Brasil é que a criminalização da homofobia se tornasse uma mordaça à liberdade religiosa. Meses após o Supremo Tribunal Federal ter equiparado manifestações preconceituosas contra homossexuais ao crime de racismo, um padre se tornou alvo de uma investigação do Ministério Público.
No dia 30 de junho, ao final de uma missa dominical na capela São João Batista, em Recife (PE), o padre Rodrigo Alves de Oliveira Arruda incentivou os fiéis a assinarem uma petição que pressiona o Senado a aprovar um projeto de lei limitando a decisão do STF.
A repercussão desse episódio teve um capítulo na última terça-feira, 15 de outubro, quando o 7º Promotor de Justiça de Defesa da Cidadania da Capital, Maxwell Anderson de Lucena Vignoli, do Ministério Público de Pernambuco, abriu um inquérito civil com o objetivo de “apurar os fatos e circunstâncias reveladores de possíveis violações dos direitos da população LGBT”, segundo publicado no Diário Oficial.
O promotor deu andamento a uma representação do Movimento LGBT Leões do Norte: “A fala do padre está equivocada. Ele agiu com LGBTfobia porque usou do exercício do sacerdócio para incitar a violência”, diz o sociólogo e ativista Rildo Veras, presidente do grupo. “Representamos uma denúncia porque queremos discutir o assunto em audiência. No mínimo esperamos que o padre faça uma retratação pública no mesmo púlpito onde ele cometeu essa violação”, acrescentou.
O jornalista Tiago Cordeiro publicou reportagem especial no portal Gazeta do Povo questionando se “discordar publicamente do STF” havia se tornado crime: “Um religioso pode se valer de sua liberdade de expressão para, a partir do púlpito, argumentar contra uma decisão judicial? Ou o padre teria cometido crime de homofobia, mesmo considerando que o acórdão da decisão do STF ainda não foi divulgado?”, pontua a matéria.
O padre Arruda reagiu à informação classificando a investigação como censura velada: “Isso é uma mordaça. Você não pode ter expressão religiosa, científica, contrária ao que essas pessoas pensam. Não podemos ficar passivos”, desabafou.
A petição pública que Arruda sugeriu que os fiéis presentes na missa assinassem dizia: “Nós, abaixo assinados e qualificados, somos contra toda tentativa de criminalização do bom senso”. O texto pedia que os senadores aprovassem o Projeto de Decreto Legislativo de autoria do senador Marcos Rogério (DEM-RO), que teria como efeito prático a sobreposição à decisão do STF.
Para os signatários, as “recentes e absurdas decisões inconstitucionais do Supremo Tribunal Federal” pretendem “impor ilegitimamente à população brasileira uma criminalização injusta e indevida, equiparando ao crime de racismo, do existente fenômeno social mal chamado de ‘homofobia’”.
Luigi Braga, advogado especialista em liberdade religiosa e integrante da Associação Nacional de Juristas Evangélicos (Anajure), comentou que as críticas do padre não transgridem a lei: “A decisão do Supremo é uma tentativa judicial de encaixar algo que não foi decidido pelo poder Legislativo. A lei em que foi enquadrada a LGBTfobia é a mesma que proíbe a discriminação por motivos religiosos. Ou seja, o padre pode se defender da acusação utilizando a mesma lei pela qual ele é acusado”.
A assessoria de imprensa do Ministério Público de Pernambuco informou que o promotor Maxwell Anderson de Lucena Vignoli não vai se manifestar publicamente sobre o pedido de investigação enquanto ela estiver em andamento.