A crise sem precedentes na Venezuela levou milhares de cidadãos do país a fugirem para o Brasil, gerando uma situação de instabilidade às cidades que fazem fronteira com o país vizinho. Recentemente, após um crime envolvendo um venezuelano em Pacaraima (RR), houve revolta da parte de brasileiros, que expulsaram milhares de refugiados.
No meio de toda essa confusão, um pastor se ofereceu para abrigar um grupo com dezenas de venezuelanos em sua casa. 63 refugiados, sendo 47 adultos e 16 crianças, foram acolhidos por Gedeão Vasconcelos e sua esposa, Sandra, que agiram no meio do tumulto na cidade do norte de Roraima.
O casal evangélico notou que os moradores da cidade estavam expulsando os venezuelanos que se abrigavam no palco do Micaraima, uma espécie de centro de eventos municipal. “Me disseram que a manifestação não estava mais pacífica, que estavam expulsando venezuelanos, colocando gasolina, queimando tudo”, disse o pastor Gedeão, em entrevista ao portal G1.
“Me preocupei, porque lá tinham crianças, famílias, que nós ajudávamos, evangelizávamos e dávamos comida”, afirmou o pastor, que dirige uma igreja Batista na cidade. No ápice da revolta popular, o palco foi destruído por um trator e os pertences dos venezuelanos foram queimados.
No entanto, antes que tudo virasse cinzas, Gedeão conversou com o comandante da Força Nacional, que acompanhava a situação, e pediu permissão para pegar as crianças que estavam embaixo do palco. “Ele disse ‘pastor, você pode pegar, sim, e rápido que a gente não sabe até quando a gente pode segurar esse povo’. Aí eu peguei, comecei a colocá-las no meu carro”, contou o pastor.
“Na sequência eu liguei para a irmã, falei que estava tudo muito violento, e pedi ajuda”, relembrou Gedeão, que resgatou os refugiados em partes: “Ao longo do dia a gente foi escondido, entrando por trás, por dentro da Venezuela e resgatando crianças e adultos também. Foi uma correria”, contou, aliviado.
“Foram 63 pessoas que acolhemos ao todo. A compaixão venceu o medo. Teve uma hora em que não aguentei. Todos choravam. As crianças, a missionária que me ajudava e eu. Tive que ter forças, pedir a Deus. Tem horas em que a gente não aguenta, é ser humano”, testemunhou.
A casa do pastor fucou cheia, mas quando outros venezuelanos souberam do refúgio, pediram abrigo e foram atendidos. A superlotação virou notícia entre os missionários da região, que abriram suas portas para abrigar os refugiados e levantaram doações de roupas e alimentos.
Atualmente, ainda há 30 refugiados nas dependências da igreja. Os demais, seguiram viagem, para outras cidades do Brasil. “Tudo começou numa manifestação pacífica, boa, que tinha que acontecer, mas que acabou sendo muito violenta. Lá havia pessoas que tinham sido vítimas de venezuelanos. Assim como há brasileiros ruins, bandidos, também têm venezuelanos maus, bandidos, que fizeram coisas más em Pacaraima, mas não se pode generalizar”, pontuou o pastor.
A compaixão do pastor ganha ainda mais relevância pois ele próprio já teve um tanquinho e uma panela da igreja furtados por venezuelanos, numa época em que a congregação ajudava a alimentar 79 refugiados que se abrigavam no palco do Micaraima.
A missionária Natália Cardoso, uma das missionárias que ajudou o pastor no acolhimento, viajou a Pacaraima com doações. “Foi muito impactante chegar na igreja e encontrar as crianças e os familiares. Eles ainda estavam um pouco abalados, assustados, mas a gente pode ver que eles sentiam que já estavam em segurança. Encontrei amor e acolhimento lá”, disse.