O Tribunal Superior Eleitoral está em vias de votar uma proposta de tipificar o crime de abuso de poder religioso, numa proposta feita pelo ministro Luiz Edson Fachin. O posicionamento da maioria dos líderes evangélicos é contrário, pois se considera que haverá um cerceamento da liberdade de crença e de expressão. Mas há quem seja a favor.
Um dos favoráveis é o pastor Valdemar Figueiredo Filho, 51 anos, que dirige a Igreja Batista do Leme, no Rio de Janeiro. Mestre em ciência política pela Universidade Candido Mendes e doutor em teologia pela Pontifícia Universidade Católica (PUC) do Rio, o líder evangélico considera positiva a possibilidade.
“Sou a favor, porque de fato há abuso. Ele existe e não é algo recente. Não estou dizendo que qualquer representação é abusiva, mas que existem relações abusivas dentro de um quadro de representação que é normal e legal. Algumas já foram inclusive notificadas à Justiça Eleitoral, como o uso de templos como comitês. Há vários casos Brasil afora, que ocorrem sem punição e sem vigilância”, afirmou, em entrevista à revista Época.
Um dos contrários é o pastor Silas Malafaia, psicólogo e teólogo, líder da Igreja Assembleia de Deus Vitória em Cristo (ADVEC), que avalia que o que está em jogo é a influência do segmento evangélico, que recentemente decidiu uma eleição presidencial no país.
“Já existe a regra de que não pode fazer proselitismo. A igreja, como qualquer outro grupo, já está incluída na lei. Por que não colocar abuso do poder sindical ou do magistério? Essa ideia é preconceito. Vir com essa conversa fiada. Não quero privilégio. A lei é para todos, seja evangélico, católico, sindicalista. Isso é perseguição religiosa”, disparou à revista.
Embora tenham opiniões opostas, os dois pastores acreditam que a proposta de Luiz Edson Fachin não deverá ser acatada pela maioria do TSE: “Acho que não passa, embora eu seja favorável. Os interesses são muito fortes. A proposta em si já teve uma reação contrária muito forte. O discurso dos abusadores é que eles são perseguidos, como uma luta do bem contra o mal. Falo dos evangélicos mais articulados, nesse cenário mais malicioso. Os inimigos agora, dizem eles, são os esquerdistas, a ameaça comunista”, comentou Figueiredo Filho, ironizando o discurso adotado pela maioria dos líderes evangélicos.
Malafaia também acredita que a proposta será barrada: “Acredito no bom senso do TSE. Se quiser fazer uma lei diferente, quem tem de fazer é o Congresso Nacional. É uma usurpação de competência. O TSE não tem poder para fazer lei, quem tem é o Congresso. No TSE, por enquanto, está 1 a 1. O ministro Alexandre de Moraes foi contra”, afirmou, mencionando o placar do julgamento antes de um pedido de vista.
Articulação
A bancada evangélica tem atuado nos bastidores para assegurar que a proposta não vá adiante. Um dos articuladores é o pastor Marco Feliciano (Republicanos-SP), que citou que o Poder Legislativo é quem tem a prerrogativa de tipificar crimes.
“A usurpação de competências gera a insegurança jurídica, a desarmonia entre os Poderes e o descrédito do povo nas instituições. O TSE é formado por homens cultos e prudentes. O bom senso irá prevalecer. O Judiciário, por exemplo, nunca criou o abuso do poder sindical, mesmo quando as centrais sindicais eram verdadeiras potências eleitorais por seu prestígio e poder econômico e apoiavam abertamente candidaturas. A Justiça Eleitoral compreendia a participação dos sindicatos como algo natural na vida democrática do país”, comentou, em entrevista ao Pleno News.
Outro pastor com mandato parlamentar que tem atuado contra a proposta é Sóstenes Cavalcante, que enxerga uma ação resultante de preconceito: “O que está acontecendo é uma clara perseguição do TSE por causa do crescimento dos políticos evangélicos. O TSE é um órgão de justiça e não de legislar, mas decidiu, de maneira preconceituosa, usurpar competência e não cumpre o seu papel que é fiscalizar”, comentou.
“Faremos uma mobilização nacional com aqueles que apoiam os candidatos religiosos para que possamos exercer nossos mandatos e fazer nosso trabalho. Os políticos tradicionais estão assustados porque muitos estão perdendo vagas para candidatos religiosos e conservadores. Eles estão vendo que nosso crescimento a cada eleição é muito relevante e também usam de um um viés ideológico de perseguição aos conservadores”, concluiu Sóstenes.