O rapper Emicida concedeu uma entrevista ao programa Roda Viva, da TV Cultura, e criticou a arrogância da militância progressista em relação ao segmento evangélico. O artista destacou que as igrejas possuem importante papel social nas periferias e que há uma desconexão problemática com esse público.
Emicida citou uma experiência vivida durante as eleições municipais de 2016, quando o então senador Marcelo Crivella (Republicanos), bispo licenciado da Igreja Universal do Reino de Deus, venceu a disputa para a Prefeitura carioca, derrotando o então deputado estadual Marcelo Freixo (PSOL).
“Na época, a gente estava tendo eleições para prefeito, e alguém me colocou em um grupo de WhatsApp […] para apoiar a campanha. Era do Rio de Janeiro, se não me engano, era o Freixo. Mas olha que coisa louca: quando entrei nesse grupo, eu estava vendo as mensagens. Tem um tom condescendente muito perigoso dessas pessoas que se nomeiam progressistas que é ‘ah, eu vou falar com a minha empregada’, ‘eu vou falar com o porteiro do meu prédio’, ‘ah, os evangélicos não conseguem raciocinar’”, introduziu.
Em seguida, o artista pontuou que as pessoas que militam pelos ideais progressistas não conhecem a realidade das periferias, não sabem a dimensão do papel social que a igreja exerce junto aos mais necessitados e o resultado positivo dessa presença para a sociedade.
“A distância que essas pessoas estavam do povo, da rua, é muito perigosa. E naquele ambiente, de discurso progressista, ninguém dava essa ‘desbicada’ que puxasse eles para o chão. Então, falei assim: ‘rapazeada, primeiro barato, a igreja é coisa que salva vida pra caramba em volta da vida das pessoas de quebrada, não dá para você entrar de sola desse jeito e ir achando que todo irmão que está com a Bíblia embaixo do braço, que conseguiu sair da droga, sair da cadeia, largar o crime, arrumar uma esposa, arrumar o dente, parar de bater na mulher, etc, todas essas coisas, não dá para colocar todas essas pessoas como se elas fossem o Edir Macedo ou o Silas Malafaia’”, disse Emicida.
O argumento que o rapper apresentou se aproxima bastante do alerta dado pelo líder do grupo Racionais MC’s em 2018, em um evento de campanha de Fernando Haddad (PT), pontuando que o movimento de esquerda havia se distanciado da realidade social brasileira.
Derrotado nas urnas, Haddad afirmou – após a posse de Jair Bolsonaro – que a eleição tinha sido perdida porque o Partido dos Trabalhadores não tinha compreendido a maneira correta de falar com o eleitorado evangélico, sem, no entanto, admitir que as bandeiras defendidas pela ideologia de esquerda, no geral, se contrapõem aos valores conservadores abraçados pela ampla maioria dos cristãos.
“Quando você é governo durante quatro mandatos existe um processo de distanciamento das bases em função do fato de que a maioria dos quadros são assimilados pela máquina estatal. Isso é um processo muito desagradável, infeliz, mas acontece. O sucesso eleitoral do PT enfraqueceu o próprio partido em sua conexão com as bases. O outro fenômeno é a crise política, ética, e econômica que aconteceu”, declarou o ex-ministro da Educação.
Em 100 segundos, @emicida desenha no #RodaViva a crise contemporânea da esquerda nacional a partir da incompreensão do papel social da religião no Brasil de hoje #EmicidaNoRodaViva pic.twitter.com/pwwW3e3IBT
— Jeff Nascimento (em 🏠) (@jnascim) July 28, 2020