A deputada cristã que está sendo processada na Finlândia por defender a posição bíblica em relação à sexualidade compareceu ao Tribunal na última segunda-feira, 24 de janeiro, para a primeira audiência de seu julgamento.
Päivi Räsänen, que é também ex-ministra da Finlândia, se declarou inocente das acusações feitas contra ela pela Procuradoria-Geral do país de “agitação étnica”, um dos “crimes de guerra e crimes contra a humanidade” previstos no código penal do país.
Além da deputada, um bispo da diocese da Missão Evangélica Luterana da Finlândia, que enfrenta uma acusação criminal, por ter publicado – em 2004 – um livreto de autoria de Päivi Räsänen sobre sexualidade, chamado Homem e Mulher Os Criou, em que a política explicita sua visão bíblica contra a homossexualidade.
A Procuradoria-Geral entende que, tanto o livreto de Räsänen, quanto uma entrevista na televisão e suas publicações nas redes sociais, que incluíram versículos de Romanos 1:24-27, “provavelmente causariam intolerância, desprezo e ódio aos homossexuais”.
Na chegada ao Tribunal, tanto a deputada quanto o bispo Juhana Pohjola foram recebidos por apoiadores com faixas. Os dois têm recebido suporte do grupo cristão Alliance Defending Freedom (ADF), que se dedica a prestar assistência jurídica a pessoas perseguidas por sua fé.
A defesa argumentou que o Tribunal não deveria impor sua própria interpretação teológica das Escrituras aos 5,5 milhões de cidadãos da Finlândia, criminalizando as visões cristãs tradicionais sobre casamento e sexualidade, já que uma condenação contra a deputada e a bispa equivaleria à criminalização de fato de versículos bíblicos.
Entenda o caso
Todo o imbróglio começou em 17 de junho de 2019, quando ela fez críticas à direção de sua igreja por patrocinar uma edição da Parada Gay no país. Na ocasião, Räsänen perguntou como o apoio poderia ser compatível com a Bíblia.
No Instagram e Facebook, a deputada postou uma foto de uma página de Bíblia com o texto de Romanos 1:24-27: “Por isso, Deus os entregou aos desejos dos seus corações, à imundície, de modo que desonraram entre si os próprios corpos. Trocaram a verdade de Deus pela mentira, e adoraram e serviram à criatura em vez do Criador, que é bendito pelos séculos. Amém! Por isso, Deus os entregou a paixões vergonhosas: as suas mulheres mudaram as relações naturais em relações contra a natureza. Do mesmo modo também os homens, deixando o uso natural da mulher, arderam em desejos uns para com os outros, cometendo homens com homens a torpeza, e recebendo em seus corpos a paga devida ao seu desvario”.
Durante seu depoimento ao Tribunal, a deputada argumentou que as publicações eram dirigidas aos líderes da Igreja e dizia respeito a um tópico importante dentro da crença cristã.
Sobre o livreto, a deputada afirmou que seus escritos descrevendo a homossexualidade como “um distúrbio do desenvolvimento psicossexual”, foram motivados por um pedido feito por sua igreja, para que os fiéis tivessem acesso ao ensino luterano sobre sexualidade, com seu ponto de vista como política, médica e cristã.
Ela ponderou que o conteúdo estava desatualizado em relação ao que pesquisas científicas dizem a respeito do tema, assim como às mudanças legislativas desde então, mas argumentou que o livreto deve existir como um documento que registra as discussões que ocorriam naquele momento da história.
Liberdade religiosa
De acordo com informações do ACI Digital, cerca de dois terços da população do país pertencem à Igreja Evangélica Luterana da Finlândia, uma das duas igrejas nacionais do país, ao lado da Igreja Ortodoxa Finlandesa.
A deputada de 62 anos possui longa carreira política, já foi presidente do partido Democrata-Cristão de 2004 a 2015, ministra do Interior entre 2011 e 2015, e é membro da Igreja Luterana Finlandesa. O Conselho Luterano Internacional descreveu a decisão de processar Räsänen e Pohjola como “escandalosa”.
A entidade pontuou que “a grande maioria dos cristãos em todas as nações, incluindo católicos e ortodoxos orientais, compartilham essas convicções”, e questionou: “O Procurador-Geral finlandês condenaria a todos nós? Além disso, o Estado finlandês deve arriscar sanções governamentais de outros Estados com base no abuso dos direitos humanos fundamentais?”.
Paul Coleman, diretor executivo da ADF International, avaliou que uma condenação contra a deputada e a bispa “estabeleceria um novo padrão europeu para os padrões de liberdade de expressão”, mais restritivo e dissonante do resto da sociedade ocidental.
Casos semelhantes “realmente poderiam acontecer em qualquer outro lugar” por causa das leis de discurso de ódio em todo o continente, disse ele.
As alegações finais do processo contra a deputada Räsänen e o bispo Pohjola estão marcadas para uma audiência agendada para o dia 14 de fevereiro.