Uma guerra de comunicação vem sendo travada desde que começaram as investigações do intrincado esquema de corrupção na Petrobras. E nos dois últimos dias, desde a apresentação feita pelos procuradores responsáveis pela Operação Lava-Jato, denunciando o ex-presidente Lula (PT) por crime de corrupção e lavagem de dinheiro, uma frase forjada atribuída aos membros do Ministério Público foi popularizada nas redes sociais.
“Não temos provas, temos convicção” é uma frase que jamais foi dita por nenhum dos procuradores que apresentaram o caso contra Lula na última quarta-feira, 14 de setembro. A origem da falsa frase – que juntou pontos distintos de falas dos procuradores – foi usada como título de uma publicação do site Conexão Jornalismo, às 17h39 da própria quarta.
Viral
Desse momento em diante, a frase se tornou viral, com muitos outros veículos reproduzindo-as já com aspas – jargão jornalístico usado para se referir a declarações atribuídas a terceiros – e conferindo a suposta frase ao procurador Roberson Henrique Pozzobom e ao líder da força-tarefa, Deltan Dallagnol.
“Petistas são especialistas em distorcer a realidade. É a sua primeira natureza. Ou eles não seriam eles. Conseguiram, por exemplo, viralizar uma frase que não foi dita por ninguém na entrevista-show dos procuradores: ‘Não temos provas [contra Lula], mas temos a convicção’”, comentou o jornalista Reinaldo Azevedo, em seu blog no site da revista Veja. “Assim, que fique claro: ninguém disse ‘não temos provas, mas temos convicções’”, acrescentou.
As duas palavras foram usadas pelos procuradores mencionados em contextos mais complexos, e não foram mencionadas como complemento direto uma da outra. “Provas são pedaços da realidade, que geram convicção sobre um determinado fato ou hipótese. Todas essas informações e todas essas provas, analisadas como num quebra-cabeça, permitem formar seguramente, formar seguramente!, a figura de Lula no comando do esquema criminoso identificado na Lava Jato”, disse Dallagnol a certa altura de sua explicação.
Em outro trecho, Dallagnol afirmou que o que foi reunido contra Lula permite acusá-lo: “Dentro das evidências que nós coletamos, a nossa convicção com base em tudo que nós expusemos, é que Lula continuou tendo proeminência nesse esquema, continuou sendo líder nesse esquema mesmo depois dele ter saído do governo”.
Já Pozzobom versou a respeito do tríplex do Guarujá, em que Lula teria recebido vantagens equivalentes a mais de R$ 3 milhões, e afirmou que haviam indicadores suficientes para responsabilizar o ex-presidente.
“Precisamos dizer, desde já que, em se tratando da lavagem de dinheiro, ou seja, em se tratando de uma tentativa de manter as aparências de licitude, não teremos aqui provas cabais de que Lula é o efetivo proprietário no papel do apartamento, pois justamente o fato de ele não figurar como proprietário do tríplex, da cobertura em Guarujá, é uma forma de ocultação, dissimulação da verdadeira propriedade”, pontuou.
Provas
A ausência de prova cabal – ou seja, uma prova completa, irrefutável – não significa que não existam provas, ou indícios, que permitam a condenação por um crime. No artigo 239 do Código de Processo Penal há uma demonstração disso: “Considera-se indício a circunstância conhecida e provada, que, tendo relação com o fato, autorize, por indução, concluir-se a existência de outra ou outras circunstâncias”.
Azevedo explicou em seu artigo de forma ilustrativa, com um caso conhecido, o que os procuradores afirmaram na acusação contra Lula: “As provas indiciárias figuram no direito brasileiro desde 1941. Nada têm a ver com a tal ‘teoria do domínio do fato’. Menos ainda com a detestável ‘responsabilização objetiva’ na esfera penal. Um exemplo popular: um conjunto de elementos fáticos permitiu à Justiça chegar à conclusão de que a modelo Eliza Samudio foi assassinada e de que o goleiro Bruno participou da arquitetura criminosa que resultou na sua morte. O corpo nem sequer foi encontrado. […] Não há nada de errado nas respectivas declarações [dos procuradores]”, concluiu o jornalista.