O jurista Ives Gandra da Silva Martins concedeu uma entrevista sobre o conceito da imunidade tributária e a polêmica que se levantou em torno do projeto aprovado pelo Congresso Nacional anistiando igrejas evangélicas e demais religiões de cobranças feitas pela Receita Federal.
Ives Gandra, que é tido como um dos maiores juristas do país e tem ampla atuação no campo do Direito religioso, afirmou que as religiões gozam de imunidade em todo seu campo de atuação, e não apenas no templo físico.
“A expressão que está na Constituição [é] imunidade para os templos, e já vinha de muitos anos a Receita entendendo que era o templo prédio, exclusivo, e não as ações, porque a imunidade está dando, evidente, é o templo vivo, através do sacerdote, das ações sociais que isso representa”, disse o jurista à Band News.
Há jurisprudência corroborando esse posicionamento, garante Ives Gandra: “O primeiro caso que chegou ao Supremo Tribunal Federal foi eu que sustentei oralmente, na primeira turma […] e nós ganhamos por cinco a zero depois de virmos perdendo. Perdemos inclusive no Superior Tribunal de Justiça”, relembrou.
“O primeiro caso foi das igrejas Adventistas, e houve um reconhecimento, durante um determinado tempo, de que realmente essas imunidades garantiam a Igreja viva, a Igreja através daqueles elementos”, acrescentou.
Sobre o projeto aprovado pelo Congresso Nacional, o jurista entende que Bolsonaro deve sancionar como forma de tornar clarificado, mais uma vez, o que a Constituição Federal já garante e que o STF reconheceu: “Houve novas autuações e parece que chegou a valores, como estão os jornais dizendo, de até R$ 1 bilhão. Mas eu tenho impressão que a jurisprudência que foi formada no Supremo Tribunal Federal naquele caso […] já à luz da nova Constituição deve prevalecer. […] Não se pode dizer que é um perdão de um bilhão de reais. O que é imunidade em Direito? Isenção é renúncia fiscal. Imunidade é proibição do Fisco, da Receita Federal, de tributar”.
“Essa lei está explicitando um princípio constitucional da imunidade dos impostos e das contribuições sociais no que diz respeito à atuação social das igrejas. É matéria que eu sempre defendi, há inúmeros tributaristas que defendem a mesma posição, e tenho a sensação que o que veio foi uma lei explicitadora para acalmar novamente aquilo que no passado estava mais tranquilizado e que voltou a ser objeto de autuações. […] Eu entendo que o presidente, o que vai fazer, é reiterar aquilo que foi aprovado na Câmara”, explicou.
Preconceito
O pastor Silas Malafaia também comentou a situação em um vídeo abordando outro aspecto do debate sobre a anistia às cobranças feitas pela Receita Federal.
Ele também citou exemplos de países desenvolvidos onde a imunidade tributária de entidades religiosas tem um conceito ainda mais amplo que o adotado no Brasil.
“Mais uma vez o preconceito de grande parte da mídia, jornalistas, contra os evangélicos e Bolsonaro. […] O perdão de dívidas não é de igrejas evangélicas, é de todas as religiões. Sabe por quê? Se aproveitaram de brechas na legislação tributária e meteram um monte de multa nas entidades religiosas”, introduziu.
O pastor da Assembleia de Deus Vitória em Cristo (ADVEC) pontuou que esse preconceito fica evidente da forma como o assunto é tratado: “Quem é que tem imunidade tributária? Você pensa que são só as religiões? E que é só igreja evangélica? Eu vou sintetizar o artigo 150 da Constituição Brasileira […] Todas as religiões, não só igrejas evangélicas, partidos políticos e sindicatos [são protegidos pela imunidade]”
“Por quê no mundo civilizado, no primeiro mundo, tudo que é entidade religiosa tem imunidade tributária? Parte-se do pressuposto de duas coisas: quem está doando já foi tributado e doações não podem ser tributadas. Nos Estados Unidos, todas as entidades religiosas têm imunidade tributária. Além disso, quando a pessoa dá recursos, parte da doação é descontada no imposto de renda”, contextualizou.
“Na Alemanha […] quando você for pagar o imposto de renda, parte do imposto você pode destinar para a alguma entidade religiosa. Na Inglaterra […] a cada libra que uma pessoa coloca num envelope de oferta de uma entidade religiosa, colocando seus dados, a entidade religiosa apresenta ao governo e o governo devolve 25%, fora aquela libra, que a pessoa deu, porque eles entendem a obra social das entidades religiosas”, acrescentou Malafaia.
Por fim, o líder pentecostal disse que “o que a imprensa faz é [uma atitude] preconceituosa, só para tentar criar um vínculo de que Bolsonaro está quebrando galho de igrejas evangélicas”.