O pastor Silas Malafaia acredita que o presidente Jair Bolsonaro deixa a desejar na forma como se comunica com a população, mas está correto em suas medidas tomadas na crise do coronavírus.
“A fala dele deve ser muito melhorada. Ele tem que se manifestar de maneira mais incisiva mostrando as posições do governo para proteger idosos, doentes, etc. Não acho que uma fala pejorativa ajuda. Agora, acho que ele está certo”, afirmou Malafaia em entrevista recente.
Ele também declarou que daqui a alguns meses, os governadores que hoje pressionam Bolsonaro é que serão pressionados pela população pelo saldo deixado pelas medidas de isolamento social, popularmente chamada de quarentena.
João Doria (PSDB), que em março de 2017 era visto pelo próprio Malafaia como alguém que poderia ser “um ótimo presidente”, agora é tratado como um “demagogo”, por conta da postura contra Bolsonaro durante essa crise.
O líder da Assembleia de Deus Vitória em Cristo (ADVEC) reiterou que irá manter as congregações abertas para atendimento individual dos fiéis, mas confirmou que os cultos estão suspensos, seguindo orientação do Ministério da Saúde.
Confira a íntegra da entrevista concedida ao jornal O Estado de S. Paulo:
Qual a sua avaliação sobre o decreto do presidente Bolsonaro?
O decreto do presidente não está mandando abrir Igreja. Ele reconhece a atividade religiosa como essencial. Simples assim. A religião, em um país onde 98% das pessoas são religiosas, é terapêutica. Para você ter uma ideia, a Igreja em que sou pastor ampliou o atendimento de 9h a 21h. Você não tem ideia da quantidade de gente que chega apavorada, com medo, angustiada, pensando em suicídio porque o dinheiro vai acabar daqui três dias e não tem dinheiro para comprar comida.
E qual é o impacto do decreto presidencial nessa situação?
O que estava acontecendo era uma festa de prefeito decretando fechar totalmente a Igreja. O presidente não está abrindo Igreja. Tanto é que ele diz lá “conforme determinação do Ministério da Saúde”. O ministério está pedindo que não tenha aglomerações. Culto aglomera. Se o serviço social é atividade essencial, o serviço religioso também é.
A sua Igreja vai voltar fazer cultos?
Não. A minha Igreja está aberta. Não está tendo culto, mas está de portas abertas para dar atendimento às pessoas. Estamos diante de uma escolha de Sofia. O que mata mais? Coronavírus ou caos social? Acho para mim que em um país onde o povo não tem reserva de dinheiro, onde 80% da população ganha até quatro salários mínimos e tem 12 milhões desempregados, se demorar um pouco esse negócio não vai ficar bom. Tem que proteger qualquer pessoa que tenha deficiência orgânica e idosos. Fica em casa.
Sua posição não contraria a orientação de autoridades em saúde como a OMS, por exemplo?
Que orientação de OMS? Para fechar tudo?
Isso. De isolamento.
Rapaz, e daí? No que eles estão acertando? É uma controvérsia. Israel isolou o país, protegeu os idosos e deixou tudo aberto. Morreu uma pessoa.
Israel proibiu as pessoas de se afastarem 100 metros de suas casas…
Mas deixou as coisas abertas. Deixou as escolas. Sabe o que eu acho engraçado? Em 2009, morreram mais de duas mil pessoas e mais de 58 mil no Brasil foram contagiadas pelo H1N1 e o presidente Lula disse que era uma gripe que ia passar.
Bolsonaro deve repetir esse erro?
Vai falar isso para as nações ricas onde o presidente dos EUA mandou cheques para milhões de americanos, onde tem grana. Escute o que estou te dizendo, anote aí, no dia 5 [de abril] não vai ter dinheiro para pagar ninguém. A fome e a sede são os instintos mais veementes do ser humano. Quero ver quem é que vai segurar isso. Vai matar gente de coronavírus? Vai. Mas o caos social mata mais. Escolha de Sofia. Qual mata menos?
Tem como fazer este cálculo de quantas pessoas vão morrer se houver caos social?
Estou vendo na minha Igreja. Começou a chegar gente dizendo que a comida vai acabar daqui três dias.
No Brasil, além da falta de dinheiro, as condições sanitária são piores. Isso não exige mais cuidados para controlar o vírus?
O coronavírus está matando pessoas de idade que tenham deficiências. A pessoa tem pressão alta, é diabético, tem problema do coração, do pulmão? Então não sai. O resto, põe para trabalhar.
Se as pessoas fora do grupo de risco saírem para trabalhar vão transmitir a doença para os outros.
Isola os caras. Não tenham contato. Vou te mostrar a demagogia do [governador paulista João] Doria e [do governador fluminense Wilson] Witzel. Quatro milhões de pessoas usam transporte [público] em São Paulo. Dois milhões no Rio. Quando é que Doria e Witzel colocaram no ponto final de cada ônibus ou linha de Metrô uma força tarefa para limpar os veículos? Nunca. Hipócritas. Demagogos.
O debate sobre a doença está contaminado pela eleição de 2022?
Irmão, que está contaminado eu não tenho nenhuma dúvida. Os governadores do Rio e de São Paulo todo dia, em conta-gotas, convocam uma coletiva. Por que não dão logo as informações em um dia só? Vai ver se eu estou na esquina! Eu apoio 100% o presidente.
O presidente também não está fazendo cálculo político?
No final disso espero que eu e você estejamos vivos e vamos voltar a conversar daqui dois meses. Vamos ver quem é que foi prejudicado politicamente? Quem é que se ferrou, presidente ou governadores?
E quem o sr. acha que vai se dar mal, presidente ou governadores?
Os governadores. Anote aí. O momento é de pânico e medo instalados na sociedade. O cara quer se proteger ficando em casa e acha isso bom. A classe média brasileira tem comida estocada para 30 dias. E o pobre?
Mesmo depois das reações negativas ao pronunciamento do presidente?
Para ser honesto eu não acho que as falas do presidente sejam sempre corretas. Digo as falas, não as posições. Acho até que a fala dele deve ser muito melhorada. Ele tem que se manifestar de maneira mais incisiva mostrando as posições do governo para proteger idosos, doentes, etc. Não acho que uma fala pejorativa ajuda. Agora, acho que ele está certo. A imprensa está mostrando que o Bolsonaro é um inconsequente e os normais são os governadores, mas não mostra a hipocrisia destes caras. Mandar fechar loja e shopping é mole. Quer dizer que tem que proteger a classe média e o pobre é que se lixe? Nem Doria nem Witzel aguentam uma pressãozinha que vier da sociedade.
Bolsonaro aguenta?
Ele está mostrando isso. Está indo contra a maré da imprensa e da mídia. Ele está botando a cara a tapa quando diz que tem que abrir [comércio, escolas]. Eu tenho uma pequena empresa que é uma editora com cento e poucos funcionários. Eu não tenho dinheiro para pagá-los no dia 5. Não vou pagar. E aí? Vou fazer o quê? Dar um tiro na cabeça?
O senhor acha que a percepção vai mudar já a partir do início do mês que vem se não caírem os salários?
Irmão, não tem jeito. Ou abre a cadeia produtiva ou vai ter desempregado a dar com pau. Isso é uma fagulha.
O objetivo do isolamento é achatar a curva de contaminação para não causar um colapso no sistema de saúde.
Amigo, vamos voltar para a Itália porque sou um cara antenado. Lá 80% do coronavírus está na Lombardia, 15% em outra região perto, 5% é dividido em toda a Itália. Em alguns lugares nem tem. E agora começa a descida. Só que na Itália o cara tem dinheiro para ficar em casa, não tem transporte coletivo, etc.
Na Lombardia ficam cidades como Bérgamo, que não adotaram o isolamento e por isso tem taxas tão altas.
A taxa na Itália é maior onde tem o maior número de idosos. A pergunta que eu deixo para você é a seguinte: o que é menos pior? Porque tanto o coronavírus quanto o caos social são ruins. Para mim, dos dois o menos pior é o coronavírus.
O que o senhor tem a dizer às pessoas que o acusam de defender a abertura das Igrejas para não perder o dízimo dos fiéis?
A pessoa quando é inescrupulosa ela reflete no outro aquilo que ela é. A minha Igreja tem um dos sistemas mais modernos de ofertas online e dízimo. Se o povo não tem recurso e não ganha o dinheiro do salário ele também não pode dar nada. Só pode dar se receber.