O Brasil vive um momento delicado com inseguranças jurídicas geradas pela Corte que deveria ser o farol que preserva todo o ordenamento do Poder Judiciário. A manobra realizada na última quarta-feira, 19 de dezembro, para soltar os presos condenados em segunda instância – incluindo o ex-presidente Lula (PT) – foi derrubada pelo presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), mas ainda assim causou danos, na visão de especialistas.
O ministro Marco Aurélio Mello aceitou o pedido de liminar feito pelo Partido Comunista do Brasil (PCdoB) e determinou a soltura dos presos após condenação em segunda instância, por conta da possibilidade de novos recursos. A decisão de Marco Aurélio poderia levar à soltura de dezenas de milhares de presos, e foi tomada no último dia de expediente no STF.
Diante da novidade, a defesa do ex-presidente Lula protocolou seu pedido de soltura instantes depois que a decisão havia sido divulgada. No entanto, diante do problema que a medida poderia causar à sociedade, o presidente da Corte, ministro José Dias Toffoli, optou por derrubar a liminar após recurso apresentado pela procuradora-geral da República, Raquel Dodge.
Para o cientista político Sérgio Abranches, a decisão do ministro Marco Aurélio de soltar presos condenados em segunda instância (como Lula) “enfraquece a legitimidade do Supremo”, pois foi a própria Corte, anos atrás, que decidiu por essa jurisprudência, e agora, estaria voltando atrás.
“Sou favorável ao princípio do trânsito em julgado após sentença de 2ª instância. Ele nos aproxima das democracias maduras do mundo. Permite o cumprimento mais célere da pena, atende à insatisfação com a impunidade, sem ferir qualquer direito fundamental”, declarou Abranches, de acordo com informações do jornalista Ancelmo Gois, do jornal O Globo.
“A decisão monocrática do ministro Marco Aurélio (suspensa em seguida), na véspera do recesso, foi um artifício arguto que não se alinha com a prerrogativa da Suprema Corte de ser o recurso de última instância. Enfraquece a legitimidade do Supremo em hora delicada de nossa vida política. A decisão poderia criar atritos institucionais, entre os Poderes e dentro do Judiciário, que, dependendo de sua intensidade, tendem a agravar a crise política que vivemos”, acrescentou o cientista político.
Retrocesso
O juiz cristão Marcelo Brêtas, responsável pelo julgamento de ações da Operação Lava-Jato no Rio de Janeiro, usou o Twitter para expressar indignação com o caso. Logo após a decisão liminar de Marco Aurélio Mello, ele publicou um lamento sobre a situação.
“O Brasil está mudando, rapidamente e para melhor. Lamentavelmente essa mudança não é instantânea. Assim, ainda por algum tempo, haveremos de conviver com forças retrógradas, comprometidas com o modelo superado”, observou. “Para evitar conclusões equivocadas, esclareço que se trata de comentário genérico sobre a situação que vivemos em nosso país. Não me refiro a pessoas ou casos determinados”, ponderou, a fim de evitar rusgas com os ministros do STF.
O Brasil está mudando, rapidamente e para melhor. Lamentavelmente essa mudança não é instantânea. Assim, ainda por algum tempo, haveremos de conviver com forças retrógradas, comprometidas com o modelo superado.
— Marcelo Bretas (@mcbretas) 19 de dezembro de 2018