Recentemente, uma pesquisa mostrou que a maioria dos jogadores que atuam nos principais clubes do Brasil são evangélicos. Mas, até que ponto a fé em Deus influencia em seu desempenho dentro das quatro linhas?
Alguns times que alcançaram notório sucesso no futebol nos últimos anos ficaram marcados não por um futebol vistoso, mas pelo extenso número de atletas que se declaram cristãos.
Um exemplo disso é o até então desconhecido Penapolense que, cheio de jogadores evangélicos, derrubou gigantes do futebol paulista e só foi derrotado para o time que foi campeão, o Ituano, que tinha ainda mais jogadores que professavam a fé.
O São Caetano do começo dos anos 2000 é outro exemplo disso, um time da terceira divisão que se tornou vice-campeão brasileiro em 2000 e 2001 e o vice-campeonato da Taça Libertadores da América em 2002, além do título paulista de 2004. De onde times tidos como “fracos” e “sem técnica” conseguiram forças para vencer grandes times profissionais de futebol multicampeões nacionais?
Não só times “pequenos” tiveram sucesso com elencos de maioria evangélica, o super time do Santos de 2010, os “Meninos da Vila”, tinha em seu elenco uma extensa lista de crentes, hoje em dia nem todos seguiram a religião mas destaca-se entre os da equipe titular Neymar, pastor Roberto Brum – líder do time –, Léo, Fábio Costa, Marquinhos e André.
O Cruzeiro de 2012 não teve um ano bom, mas após a chegada de muitos jogadores foi campeão brasileiro de 2013 com um grande número de jogadores cristãos, como o goleiro Fábio, Dagoberto, Everton Ribeiro, Borges, Wilian e outros.
A Seleção Brasileira comandada por Dunga não ficou conhecida pelo futebol mais técnico e tático, mas mesmo assim conquistou a Copa América em 2007 e a Copa das Confederações 2009 com um grupo que, onde até o coordenador técnico era evangélico, tinha acompanhamento religioso de um pastor antes dos jogos e a liderança de jogadores de fé, como Lúcio, Felipe Melo, Luis Fabiano, Kaká, entre outros.
A fé influencia no futebol?
Para o gremista Everson Barbosa, pastor da Igreja do Evangelho Quadrangular, a vantagem que os jogadores evangélicos possuem está ligada ao comportamento: “Creio que eles são mais disciplinados, entendem a questão da honra e conquistar seu espaço com humildade”, afirmou.
Essa mesma linha de raciocínio foi seguida pelo cruzeirense Marden Jump: “O Cruzeiro tem muitos evangélicos e casados, aí tem menos problemas de extra-campo.”, destacou.
Para o curitibano Marlos Ferreira, torcedor do Paraná, os “jogadores evangélicos não são maioria, mas são os que mais fazem barulho”, com declarações sobre sua fé nas entrevistas, gestos simbólicos nas comemorações dos gols e agradecimentos a Deus nas conquistas.
O pesquisador Johnny Bernardo comentou que os jogadores evangélicos que ganham destaque por conta de seu desempenho e conquistas fazem parte de um “evento relativamente recente, desenvolvido a partir de 1978”, e que o sucesso alcançado por nomes como Muller, Marcelinho Carioca e Kaká serviu para trazer ainda mais holofotes para a questão: “Atualmente gestos de oração, levantar mãos aos céus ou ajoelhar-se são mais corriqueiros nos campos pelo Brasil afora”.
Bernardo destaca que, independentemente do tamanho das conquistas, o uso dessas oportunidades para a difusão do cristianismo vem sendo usada pelos evangélicos: “O técnico do Ituano, Doriva, que jogou pelo São Paulo e Atlético Mineiro – além de uma passagem pela Seleção Brasileira – também pode ser citado como um dos vários membros do movimento Atletas de Cristo.
Sua fala, ao fim do campeonato paulista, foi emblemática para a Igreja evangélica”, disse o pesquisador, fazendo referência à entrevista dada pelo treinador ao repórter Abel Braga, da TV Globo, logo após o final da disputa por pênaltis, quando disse que a “glória pertence a Deus”.
A psicóloga Marisa Lobo ressaltou que a motivação diferente da comum que os evangélicos recebem nos cultos pode também ajudar os jogadores pois “o ser humano é movido a estímulos e estímulos positivos reforçam comportamentos vencedores e não é diferente com a fé, que por si só tem poder motivacional”.
“A vida de Cristo, por exemplo, é um grande motivador para a humanidade […] É comum – e faz até parte de nossa doutrina e cultura cristã – a corrida para o sucesso espiritual, e materializá-lo em ações humanas de sucesso. Cada tribo tem a sua motivação. A nossa nos impulsiona a mostrar serviço para o meio em que vivemos , para o mundo secular e seguindo este sonho de vitória. Todas as pregações são voltadas a motivar o cristão a vencer barreiras rumo a vitória e no topo dessa corrida está o tão sonhado encontro com Jesus”, ilustrou.
A psicóloga diz ainda que “um cristão não pode passar pela vida sendo sempre um derrotado”, e por isso, “vive buscando a prosperidade em todos os aspectos (biológico, psicológico, social e espiritual)”.
No futebol, a natureza humana é impulsionada quando o jogador está exposto a uma doutrina de incentivo à busca da vitória pessoal: “É a materialização dessa corrida para o céu. Todos querem a coroa que significa a vitória. Um esportista evangélico tem muito mais motivos para sonhar com a vitória, o lado de realização pessoal/profissional e o orgulho santo de ser um homem de Deus e estar dando exemplo. Tudo isso é extremamente motivacional e pode sim levá-lo mais facilmente a vitória”.
Deus influencia no futebol?
O escritor e pastor batista Ed René Kivitz, líder da Igreja Batista da Água Branca, defende o conceito de que, com o livre-arbítrio, “Deus pouco interfere, mas interpela sempre” pela humanidade.
Nesse âmbito, o teólogo Yago Martins foi perguntado se “Deus pode interferir em um jogo de futebol motivado pela oração de torcedores e/ou jogadores, ou simplesmente por sua própria vontade”, e a opinião dele seguiu um sentido oposto à de Kivitz.
“Eu creio em um Deus que é soberano sobre cada detalhe do universo. Então, creio em um Deus que determina o resultado de cada jogo de futebol. Cada gol, cada falta, cada impedimento e cada frango estavam debaixo da atuação majestosa de Deus”, disse Martins.
No entanto, o teólogo pondera que “isso não significa, porém, que o time vencedor será necessariamente o time com mais cristãos, ou com mais intercessores”.
“Como um objeto de entretenimento, o futebol não deveria ser alvo de intensas orações ou de busca por atuação do divino, com exceção de orações de agradecimento por parte dos que se divertem com o espetáculo, de orações por segurança e cuidado por parte dos jogadores e, quem sabe, oração para que a subsistência das famílias que sobrevivem das rendas dos jogos (como jogadores, membros da equipe técnica, etc) possa continuar existindo. Deus não é vascaíno, flamenguista ou corintiano, mas Ele é o Deus soberano sobre todo esporte”, concluiu o teólogo.
Reportagem de Renato Cavallera e Tiago Chagas para o Gospel+