O mundo cristão mal se recuperou da triste notícia sobre o suicídio de um jovem pastor e um novo caso volta a atrair atenção dos evangélicos do Brasil: o pastor Djalma da Silva Maranhão, 62 anos, foi encontrado morto na madrugada da última terça-feira, 04 de setembro.
O anúncio da morte foi feito pela Convenção Batista do Planalto Central (CBPC) em sua página no Facebook. Sem revelar a causa da morte, a entidade relatou que o pastor foi funcionário subgerente da extinta Junta de Educação Religiosa e Publicações (JUERP) da entidade, pastoreou a Primeira Igreja Batista de Planaltina (DF) e a Terceira Igreja Batista de Planaltina (DF).
No texto, a CBPC lamenta a partida do pastor, mas não cita o suicídio: “A Convenção Batista do Planalto Central (CBPC) lamenta com profundo pesar o falecimento do companheiro Pr. Djalma da Silva Maranhão, na madrugada desta terça-feira (09/09). […] Oremos pela família”.
Nos comentários da nota de falecimento, os fiéis lamentaram o ocorrido com o veterano pastor: “Com muito pesar que informamos o falecimento do pastor Djalma da Silva Maranhão. Ele foi encontrado morto pela esposa na manhã de ontem depois de ter cometido suicídio. Pr Djalma estava com 62 anos, deixou esposa, filhos (adultos), foi funcionário da extinta JUERP (loja de Brasília ) e foi funcionário da convenção do DF. É triste saber que questões como essa nos alcançaram”, escreveu um usuário do Facebook.
“Mais um pastor cometeu suicídio… triste demais o que tem acometido nossos pastores…”, afirmou outro, ciente de que há uma espécie de “epidemia” atingindo as lideranças evangélicas no Brasil e no mundo.
Um colega de ministério do pastor Maranhão, Lauro Brito, emitiu um comunicado lamentando o ocorrido: “A Ordem dos Pastores Batistas do Brasil, Seção Paraense, se une em oração com todas as demais Seções do Brasil pedindo ao Deus Pai todo Poderoso que console e conforte os corações enlutados de todos os familiares do Pastor Djalma da Silva Maranhão falecido na madrugada do dia 04. Deus nos fortaleça diante de tão dura realidade que a cada dia tem nos surpreendido com muitas dores e preocupações”.
Prevenção
Após anunciar a morte do pastor Djalma da Silva Maranhão, a CBPC compartilhou um alerta sobre a prevenção ao suicídio: “No mês de setembro acontece a campanha Setembro Amarelo, movimento mundial para conscientizar a população sobre a realidade do suicídio. De acordo com o Centro de Valorização da Vida (CVV), o suicídio é considerado um problema de saúde pública e mata 1 brasileiro a cada 45 minutos e 1 pessoa a cada 45 segundos em todo o mundo”, contextualizou a nota.
“Pelos números oficiais, são 32 brasileiros mortos por dia, taxa superior às vítimas da AIDS e da maioria dos tipos de câncer. Conforme o CVV, pelo menos o triplo de pessoas tentaram tirar a própria vida e outras chegaram a pensar em suicídio. Vamos Conversar? Disque 188”, acrescentou o texto.
Fardo
Pesquisas de institutos internacionais apontam a dura realidade do ministério pastoral, e indicam essa ocupação como uma das mais tensas entre todos os tipos de trabalho.
Em 2013, o Clergy Health Initiative (CHI), divulgou o relatório de uma pesquisa que constatou que os pastores com depressão chegaram a 8,7% do total de entrevistados, e os casos de ansiedade a 11,1%. A média das demais ocupações para ambos os casos nos Estados Unidos é de 5,5%, por exemplo.
“Pastores podem ter criado uma vida para si que é tão fortemente entrelaçada com o seu ministério, que sua saúde emocional depende do estado do seu ministério”, declarou Jean Proeschold-Bell, diretor de pesquisa da CHI. “Então, é possível que quando os pastores sentem que seu ministério está indo bem, eles experimentam emoções positivas potentes o suficiente para protegê-los de sofrimento mental. Naturalmente, o inverso também é verdadeiro”, complementou.
Outra pesquisa recente apontou que um pastor costuma se preocupar mais com o bem-estar dos membros de suas igrejas do que com si mesmos, e o resultado disso é que mais da metade já enfrentou crises de saúde mental e emocional ao longo do ministério.
O estudo, realizado em novembro de 2017 com cerca de 1.700 pastores, constatou que 54% deles já sofreu com algum tipo de exaustão, seja mental ou emocional. Além disso, 45% dos entrevistados afirmaram que em algumas circunstâncias sentem-se inadequados.
Um triste caso que abalou o mundo recentemente foi a morte do pastor Andrew Stoecklein, de apenas 30 anos, que sucumbiu às angústias da depressão e ansiedade crônica contra as quais lutava. Seu estado de saúde era de conhecimento público, e sua igreja – Inland Hills, em Chino, Califórnia (EUA) – e esposa o apoiavam sobre a questão, mas não foi suficiente para impedir a tragédia.
Desabafo
Em dezembro de 2017 o pastor Wesley Carvalho produziu um artigo falando sobre o que significa o sacerdócio por trás das cortinas, e em sua reflexão, revelou que embora a rotina de um sacerdote seja cercada de situações comuns a qualquer ser humano, com as alegrias e angústias que cercam a todas as famílias, há sempre a expectativa que sua conduta seja inabalável e impecável, que os fiéis não tomem conhecimento dessas dores e que o líder tenha forças para guiar o rebanho.
Esse “peso”, segundo Carvalho, é um fator desconsiderado por muitos, mas que atua de forma decisiva na rotina. “Os que estão de fora do nosso universo pensam que vida de pastor é regalia, luxo, ou coisas do tipo. Não, não é”, enfatizou.
“Pastor é ser humano, mas um ser humano travestido de ‘Chapolim Colorado’, ou seja, salva a todos sem ter ninguém que o defenda. Gente, pastor chora, peca, erra, precisa de carinho, precisa de visita, depende de oração, necessita de ajuda. Mas a igreja, a sociedade, nunca espera que esse pastor exista, ela quer um pastor como um herói das ‘estórias’ de quadrinho, ESSE PASTOR NÃO EXISTE”, pontuou o pastor.
Lúcido, Carvalho define os pastores como “heróis” por sacrificarem “a família, o tempo, a vida, em prol de vidas” e amarem “sem esperar serem amados”.
“Pastor não tem amigos, se ele se abre com alguém, amanhã esse alguém abre a sua vida o expondo, e a reação da igreja é essa: ‘nossa nunca pensei que o pastor fosse essa pessoa!’. Ou seja, nós não podemos ter defeitos, fraquezas ou coisas do tipo. Pastor não pode envolver a família com os problemas da igreja… E diga- se de passagem, a maioria das esposas de pastor são depressivas ou tem problemas com insônia, síndrome do pânico ou coisas afins”, desabafou.
Por fim, Carvalho destacou a decisão que tomou para si: “Se sorrir é moleque, se não, é carrancudo. Se acorda cedo, não fez vigília, se acorda tarde, é preguiçoso. Se tem pulso é carrasco, se é manso é relapso. Os filhos de todo mundo pecam, mas se os do pastor pecarem… […] Sou pastor, pai de família, tenho uma esposa linda, duas filhas maravilhosas, mas decidi me humanizar. Não serei mais um. Choro na frente delas, desabafo com minha companheira, ouço elas. Pastores do Brasil, vocês são gente, seres humanos. Viagem com a família, a igreja não fechará as portas porque você saiu. Procurem ajuda de psicólogos se for preciso. Tirem férias. Tenham mentores espirituais. Sejam humanos”.