A imunidade tributária de igrejas e demais templos religiosos voltou a ser tema de discussões na sociedade com o veto do presidente Jair Bolsonaro a uma anistia que foi aprovada pelo Congresso Nacional a cobranças e multas impostas pela Receita Federal. Diante disso, surgiu o questionamento sobre qual a amplitude da imunidade garantida pela Constituição Federal.
O artigo 150 da Constituição Federal de 1988 garante a “templos de qualquer culto” a imunidade tributária. Porém, como o texto não especifica até onde vai a vedação ao Estado de tributação às religiões, ocorrem muitas divergências sobre o que está imune e o que não está protegido de cobranças.
Advogados tributaristas divergem na interpretação sobre o tema, o que torna os questionamentos dos órgãos de controle, como a Receita Federal, pertinentes. A conclusão é que uma legislação específica sobre o tema, delimitando de maneira clara a imunidade garantida na Constituição, se faz necessária.
Um dos pontos questionados refere-se às empresas que pertencem a denominações evangélicas, por exemplo. Emissoras de rádio, TV e até gravadoras são controladas por igrejas. O advogado e mestre em Direito Econômico Leandro Schuch entende que a Constituição “não é clara em relação à imunidade tributária” das entidades religiosas.
“Está escrito é que é vedado instituir impostos sobre templos de qualquer culto. A redação é muito genérica e aberta. Sabemos que esses templos têm atividades que são muito mais do que a atividade-fim [o culto em si e ações relacionadas]”, avaliou, em entrevista concedida ao portal Uol.
Schuch aprovou a postura do presidente Jair Bolsonaro em vetar a anistia aprovada pelo Congresso Nacional sobre as cobranças feitas pela Receita Federal, que estariam em torno de R$ 1 bilhão. Segundo ele, os parlamentares deveriam, após analisarem se derrubam ou mantém o veto, debater uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que criasse regras específicas para tornar a legislação mais clara.
“No fim dos anos 1980, não se imaginava que as igrejas, por exemplo, se tornariam verdadeiros conglomerados econômicos”, exemplificou Leandro Schuch.
Eduardo Maneira, presidente do Comissão de Direito Tributário do Conselho Federal da OAB, pontuou que há casos de entidades religiosas que são multadas pela Receita por não cumprirem algumas exigências: “Normalmente, igrejas não pagam impostos com base no artigo que veda a cobrança a templos de qualquer culto e [em outro trecho que também veda a cobrança] às instituições de educação e assistência social sem fins lucrativos. Isso é o que respalda a imunidade”, disse Maneira.
“Para ser enquadrado como tal, há exigências legais, certificados que precisam ser apresentados. Muitas vezes, a Receita autua porque as entidades não cumprem exigências. Mas também pode ter casos de fraude mesmo”, ponderou.
Divergindo da opinião dos colegas, o advogado especialista em Direito Tributário João Paulo Echeverria acredita que a legislação atual é suficiente, e que o que tem ocorrido no país é uma confusão jurídica em relação às regras que dizem respeito aos rendimentos obtidos pelas instituições religiosas.
Em tese, os recursos obtidos devem ser utilizados na manutenção das atividades e da prática de culto, o que impede que sejam classificados como “lucro”, e dessa forma, não podem ser alvo de cobranças da Contribuição Social sobre Lucro Líquido (CSLL): “Eu não acredito que exista uma lacuna [constitucional] porque a imunidade [de impostos] segue a renda. Se o recurso é destinado à atividade religiosa, não há incidência de imposto”, simplificou.
Echeverria acrescentou ainda que esse mesmo entendimento tem sido referendado por decisões dos tribunais superiores há pelo menos uma década.