Uma congregação expulsa da Convenção Batista Brasileira (CBB) foi palco da celebração de uma união entre pessoas do mesmo sexo. A celebrante foi a ‘pastora’ e teóloga Odja Barros.
A Igreja Batista do Pinheiro, em Maceió (AL) tem um longo histórico de polêmicas causadas pela atuação política militante. Em 2016, por exemplo, a congregação aprovou o batismo de homossexuais, decisão que custou sua expulsão da CBB.
Odja Barros atua como sacerdotisa há 28 anos na mesma congregação, e no dia 04 de dezembro celebrou o chamado “casamento gay” de duas mulheres que membros da igreja: Tuane Alves e Erika Ribeiro, ambas de 29 anos.
Segundo Odja, a cerimônia – realizada em um salão de festas na capital alagoana – a fez sentir “frio na barriga”, já que a união homossexual não é aceita entre os batistas conservadores da doutrina bíblica, assim como na ampla maioria das igrejas evangélicas.
“Senti frio na barriga de emoção, de saber que estava vivendo algo que é fruto de muita luta. Como pastora feminista, queria muito que minha primeira celebração de casamento igualitário fosse com duas mulheres”, disse Odja ao portal Universa.
“Eu sei que, até na luta LGBTQI+, as conquistas das mulheres vêm com mais dificuldade. Por isso me senti tão honrada e privilegiada de ser celebrante de um momento novo e histórico dentro da tradição de igrejas batistas no Brasil”, acrescentou a ‘pastora’.
Embora exerça o cargo de pastora na Igreja Batista do Pinheiro, e existam algumas congregações batistas que aceitem a ordenação feminina, o ministério pastoral de mulheres está longe de ser uma unanimidade dentro da denominação.
Explicitando sua admitida veia ativista, Odja Barros contou que tinha, há anos, a expectativa de celebrar a união entre pessoas do mesmo sexo: “Eu já estava disposta e aberta a ser celebrante de uniões homoafetivas, mas faltava ainda receber um convite. E isso ocorreu no ano passado, quando fui procurada pelas noivas”.
Essa ansiedade surgiu de uma leitura progressista da doutrina bíblica: “Essa visão majoritária entende homossexualidade como pecado. E resolvi isso a partir de uma leitura séria teológica, da Bíblia, das Escrituras […] Nós não vemos mais nenhuma dificuldade em reconhecer essa legitimidade espiritual, do amor entre duas pessoas que decidem livremente celebrar a união como um direito”, declarou.
“A celebração cristã do casamento de duas mulheres significa um avanço a mais no processo de despatriarcalização [sic] do Cristianismo e do conceito de ‘família cristã’. Escrevo sobre isso no livro que lancei em 2020: ‘Flores que rompem raízes: leitura popular e feminista da Bíblia’”, disse.
Parte disso é atribuído pela própria “pastora” a uma espécie de legalismo: “São processos civis-burocráticos, não meus pessoais. O primeiro ocorreu há 10 anos, com a decisão do STF [Supremo Tribunal Federal] de declarar legal a união civil entre pessoas do mesmo sexo”, pontuou, demonstrando crer que uma decisão judicial tem peso de influência na sua percepção doutrinária.
Essa leitura fica evidente quando Odja comenta a resolução do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) de 2013, que permitiu os cartórios registrarem uniões civis entre pessoas do mesmo sexo: ”Essa foi uma decisão também importante porque nós não costumamos, lá na nossa Igreja Batista, celebrar cerimônias somente religiosas sem nenhum efeito legal”, diz.
A decisão tomada pela Igreja Batista do Pinheiro, em 2016, que rendeu a expulsão da CBB foi, na visão de Odja, o ponto de partida para que ela, em 2021, celebrasse uma união homossexual: “Eu não realizo casamento em meu próprio nome, sou representante religiosa ligada a uma comunidade de fé. E a decisão [há cinco anos] foi histórica: a comunidade decidiu reconhecer o que a gente chama de cidadania plena eclesial através do batismo às pessoas homoafetivas”.
“Todos os casamentos que fazemos seguem o mesmo ritual cristão. Não existe, na batista, um ritual específico. Cada celebrante tem autonomia para construir o cerimonial a partir da sua tradição religiosa […] O diferencial era a afirmação importante da diversidade sexual e da legitimidade de uma cerimônia entre duas pessoas do mesmo sexo. Ela foi muito pontuada como um valor e um direito. Nós tivemos ali também um momento educativo para as pessoas que estavam participando do casamento. Era muito importante afirmar o direito LGBTQI+ da união civil”, finalizou.